MONTANHA RUSSA
“Não sou o género de compositora que goste de se entregar a grandes temas. Parecem-me opressivos. Prefiro descobrir ideias mais modestas, conduzi-las ao limite, empurrar-lhes as fronteiras”, confessou Anna Meredith ao “Guardian”, quando, no ano passado, por ocasião do centenário do fim da I Guerra Mundial, aceitou a missão de, para a abertura dos BBC Proms, compor Five Telegrams, uma poderosa peça coral-sinfónica inspirada nas diversas modalidades de correspondência entre os soldados na frente de batalha e as famílias, e acrescentava: “A combinação de música e política é uma questão que cabe a cada um resolver individualmente. Há quem seja capaz de abordar certos temas naturalmente – o racismo ou o feminismo, por exemplo –, mas, apesar de ser feminista, isso nunca poderia nortear aquilo que escrevo. Se me convidassem para escrever uma peça sobre o Serviço Nacional de Saúde, apoiaria a causa e os seus princípios mas não imagino como conseguiria trabalhar musicalmente essa ideia. Dito isto, pensava o mesmo acerca da I Guerra Mundial – a minha primeira reacção ao convite foi entrar em pânico – mas, estando sempre tão pronta para responder a um desafio como para engolir as minhas próprias palavras, acabei por escrever uma obra sobre ela...”
A puríssima verdade é que Meredith é mais do que capaz de escrever acerca de seja o que for. Há três anos, no momento em que a graduada pela York University e pelo Royal College of Music e ex-compositora residente da BBC Scottish Symphony Orchestra irrompeu no universo pop com o vertiginoso Varmints, ficámos a saber que tanto se deixava tentar pelas atmosferas sonoras das ressonâncias magnéticas como não era impossível convencê-la a escrever para estações de serviço de auto-estrada, bancos de jardim de Hong Kong, campanhas da Chloé ou da Prada e elevadores da M&S. Desde então, atirou-se à música para cinema e televisão, às Quatro Estações, de Vivaldi, a Five Telegrams, e, agora, a uma segunda investida pop, a solo, FIBS. A declaração de intenções é consideravelmente bernsteiniana (“Esta música não é sobre política, poesia, arte ou o mundo. É um veículo para si mesma, trabalhando para e ao serviço de si mesma”) e, neste glorioso “genre-free space”, coabitam e indistinguem-se electronica, clássica, techno, math-rock, e pop, numa trepidante montanha russa ferreamente (des)controlada de onde, em garrido Technicolour, vai sendo inncessantemente projectado um fogo de artifício de formas e cores improváveis.