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16 December 2022

 
 
 
Bobby Bare - "Detroit City"
 
(sequência daqui) Com 399 páginas, 66 textos em torno de outras tantas canções e uma generosa colecção de mais de 100 imagens e fotografias (relacionados directa ou indirectamente com os tópicos abordados), The Philosophy Of Modern Song é muito mais uma natural sequência de “Theme Time Radio Hour” – o fabuloso programa de rádio tematicamente estruturado que, entre 2006 e 2009, Dylan apresentou na XM Satellite Radio e, depois, na Sirius Satellite Radio, no qual músicas de todos os géneros (1894 por 1158 artistas) coexistiam com histórias e farrapos de informação avulsos, jingles, recitações de poesia, receitas de cocktails, ou elucubrações acerca deste mundo e do outro – do que o (impacientemente) aguardado segundo volume de Chronicles
 .
The Temptations - "Ball Of Confusion"
 
Se, sobre “Theme Time Radio Hour”, Tom Waits uivou “He’s better than Wolfman Jack!”, desta vez, somos convidados a visitar a jukebox privada de Dylan e a acompanhá-lo enquanto disserta sobre os mais improváveis assuntos e temas que, por vezes, mantèm apenas uma vaga relação com o disco ou o músico que tomaram como rampa de lançamento. O que, não se tratando, de todo, de um “best of” ou de um “greatest hits” da “canção moderna” – na verdade, das 66, apenas duas foram publicadas no presente século, a maioria data dos anos 50 e só 4 são interpretadas por cantoras – explica por que motivo, para só citar uns quantos, Joni Mitchell, Leonard Cohen, Chuck Berry, Tom Waits, Billie Holiday, Bessie Smith, Odetta, Edith Piaf, Patsy Cline, Lennon/McCartney, Muddy Waters, Howlin’ Wolf, Skip James ou John Lee Hooker estão ausentes mas uma considerável percentagem de ilustríssimos desconhecidos aqui se reune. Na realidade, este não é um tratado sobre a filosofia da canção moderna mas um pretexto para filosofar a partir da canção moderna. (segue para aqui)

24 April 2018

NA ALTURA CERTA 



Há menos de um ano, nos ecrãs de televisão de todo o mundo, Chrysta Bell habitava as assombrações de David Lynch em Twin Peaks: The Return, enquanto, ao mesmo tempo, numa existência paralela (também catalisada por Lynch), publicava o precioso álbum We Dissolve, produzido por John Parish. Agora, em 4 das 20 datas da tournée europeia de 2018, pudemos vê-la e ouvi-la onde mais improvável seria: Coimbra, Arcos de Valdevez, Ovar e Torres Novas. No Outono passado, Relatives In Descent, dos Protomartyr, situava-os num patamar equiparável ao dos National segundos antes de Alligator e ainda recomendavelmente longe de Sleep Well Beast“uma música devastadora, estridentemente política, mas menos interessada em ditar problemas e soluções do que em cartografar a topografia emocional de estar vivo e aterrorizado em 2017”, como sobre ele escreveu “The A.V. Club”. Escassa meia dúzia de meses depois, a banda de Joe Casey e Greg Ahee, numa noite de aguaceiros, subia ao palco na pombalina e granítica Musicbox. 



No Teatro Gil Vicente, em Coimbra, Chrysta Bell foi a aparição de uma Rita Hayworth de alabastro, algo como a sobreposição dos perfis de Siouxsie, Cleópatra e Batwoman, numa coreografia entre "lap dance" e dança do ventre, e armada de uma voz capaz de ir do sussurro ao registo de diva operática. De This Train ao recente EP homónimo, contra um pano de fundo de labaredas, cortinas vermelho-bordel de Twin Peaks e excertos de clips de Lynch, escoaram-se dezassete luxuosas canções por vezes, mais próximas de uma (per)versão do "wild mercury sound" de Dylan do que da "torch song" – a novíssima "Blue Rose", contudo, é melodia orgástica impurissimamente "torch" –, coisa tão ardentemente física quanto a milagrosa cintura pélvica da "femme fatale" que as interpretava. Menos cantor do que "diseur"/exorcista de demónios erguido sobre as ruínas proletárias de Detroit, Joe Casey transformou a sala do Cais de Sodré num cenário onde um rock Neolítico – queimando algumas etapas – sonha com um futuro Românico. A acústica do lugar pode converter todos os textos em pura poesia fonética (mas, se quiséssemos ir por aí, nunca ninguém teria colocado um pé dentro do CBGB), porém, naquela densa construção sonora de uns Pixies com menor profundidade de campo, é impossível não declarar rendição perante o napalm da guitarra e a quadratura estalinista de baixo e bateria. Aqui e ali, fora dos hipermercados estivais de música, ainda é possível ir estando atento às coisas certas, na altura certa.

31 October 2017

AVASSALADOR 


Primeiro, uma apresentação breve: “Call me ‘Heraclitus The Obscure’, constantly weeping because the river doesn't move, it doesn't flow, it's been leaded by snider men to make a profit from the poor”. Depois, a explicação do método: “Not by my own hand, automatic writing by phantom limb, not with my own voice, pleurisy made to stand on two legs”. A seguir, a imprecação: “In this age of blasting trumpets, paradise for fools, infinite wrath, in the lowest deep a lower depth, I don't want to hear those vile trumpets anymore”. Por fim, a parábola: “Elvis outside of Flagstaff, driving a camper van, looking for meaning in a cloud mass, sees the face of Joseph Stalin and is disheartened, then the wind changed the cloud into his smiling Lord and he was affected profoundly, but he could never describe the feeling, he passed away on the bathroom floor”. Cabe tudo nos 5’20” de "A Private Understanding", a faixa inicial de Relatives In Descent e exemplo supremo de que uma canção pode conter mais alimento para cérebros ávidos do que muitas páginas de papel impresso. Há outras 11 de idêntica estatura no quarto álbum dos Protomartyr, banda de Detroit que compõe e toca com a mão no pulso da cidade destroçada e a sente latejar como um sintoma do grande mal americano contemporãneo. 



Nas erupções da guitarra de Greg Ahee, em diversas tonalidades de negro, levanta-se uma imensa muralha sonora áspera e rude que a propulsão da bateria de Alex Leonard e do baixo de Scott Davidson ossificam enquanto moldura para as diatribes sombrias e desoladoras de Joe Casey, criatura pouco dada a adoçar as palavras: “Estava habituado a pensar que a verdade existia. Mas deixou de existir uma verdade partilhada. Se calhar, nunca existiu. Vivemos uma nova idade das trevas”. Em tradução musical, isso tanto pode gerar magníficos instantes de absurdo (“In Northern Michigan, there was an incident in winter, a horse was hit by lightning and began to speak in a foreign language, when he was finally understood it repeated, ‘Humans are no good’”) como confissões de desalento (“My children they are the future, good luck with the mess I left”) ou irados apelos à insurreição (“Defenestrate the king! The howling waves of people crashing through the first blockade (…) until they reached that golden door, knock it down! What a lovely view, horizon looks like fire, open up the window, let the light in, throw him out!”). Numa só palavra: avassalador.

18 July 2017

ASSALTO TOTAL 


A 23 de Julho de 1967, a “Motor City” explodiu. Quatro anos antes, os 125 000 manifestantes da Walk To Freedom March haviam desfilado pacificamente pela Woodward Avenue, na qual Martin Luther King ensaiaria o discurso “I Have a Dream” que, semanas depois, iria proferir em Washington D.C.. Mas, quando, às primeiras horas daquele domingo de Julho de há 50 anos, a polícia realizou um brutal raide a um clube na esquina da 12th Street – hoje, o Rosa Parks Boulevard – onde se celebrava o regresso do Vietname de dois GI negros, durante cinco dias, Detroit entrou em estado de guerra. Balanço final: 43 mortos, 1 189 feridos, 7 200 detenções, e mais de 2 000 edifícios destruídos. Vindo de Flint, John Sinclair tinha chegado a Detroit em 1964. Na universidade, lera os evangelhos segundo Ginsberg, Ferlinghetti, Corso e Kerouac, salmodiara ao som de Coltrane e descobrira o santíssimo sacramento da cannabis sativa.



Não tardou muito até que Sinclair (que, entretanto, escrevia para revistas de jazz, publicara três livros de poesia - This is Our Music, Fire Music: A Record e Meditations: A Suite for John Coltrane - e conhecera Ginsberg e Ed Sanders, dos Fugs), com vários outros "agents provocateurs" locais, tivesse criado a Artists’ Workshop dedicada à insubmissão perante a “square culture” dominante. Inalando profundamente o ar do tempo, a Workshop daria origem à comuna Trans-Love Energies que tanto acolheria os MC5 (brigada de agitadores sonoros "garage-proto-punk" mas amantes de Albert Ayler, Archie Shepp, Sun Ra e Coltrane) como, em 1968, serviria de incubadora para o White Panther Party. Fundado, segundo a lenda, por instigação do Black Panther, Huey P. Newton, o programa mínimo era esclarecedor: "a total assault on the culture by any means necessary, including rock and roll, dope, and fucking in the streets". Irmãos de armas (ainda mais) pedrados dos Yippies de Jerry Rubin, Abbie Hoffman e Phil Ochs, iria ser por aí mesmo que o FBI lançaria o ataque, prendendo Sinclair, apanhado na posse de dois cigarros “aromáticos”, pelo que, em 1969, seria condenado a dez anos de prisão. Libertado em 1971, após uma incansável campanha a que John Lennon se associaria, Sinclair, na sequência da desintegração dos White Panthers, gravaria quase três dezenas de álbuns de "spoken-word". Beatnik Youth Ambient (produzido por Martin Glover/Youth) é o último e belíssimo estojo para a voz de "grizzly" de John Sinclair, sobre fundo de jazz e electrónica mutantes, invocar a memória dos seus heróis literários e musicais.

Edit: Escutar o reverendo Jack Van Impe pregando contra o rock & roll e a contracultura, em 1969, referindo-se aos MC5, John Sinclair e ao White Panther Party (sugerido na caixa de comentários)

30 May 2012

A REGRA DE TRÊS SIMPLES 
(4ª parte da entrevista com Jack White publicada na "Blitz") 



Detroit, na história pessoal de Jack White e na própria biografia da cidade, chegaria ao fim. Já em decadência antes, e definitivamente devastada pela rebentada bolha assassina do “subprime”, em 2008, a “motortown”, capital mundial da indústria automóvel, transformou-se em quase cidade-fantasma, habitada por pouco mais do que espectros da história do século XX. Nos EUA, as maiores cidades morrem como minúsculas aldeias e – imagens, imagens, imagens sempre –, agora, é a vez de caber a The Ruins of Detroit – colecção de fotografias de Yves Marchand e Romain Meffre, contendo “todos os edifícios arquetípicos de uma grande cidade americana em estado de mumificação”) o papel de exibir os deslumbrantes e paralisantes testemunhos iconográficos de tão “esplêndidos monumentos em decadência, tal como as pirâmides do Egipto, o Coliseu de Roma, ou a Acrópole de Atenas, destroços não menos significativos da queda de um grande império”.



No entanto, já em 2006, White trocara Detroit por Nashville, em conflito com a cena musical local:

“Tinha-se tornado demasiado cínica e negativa. Sentia-me odiado, indesejado, desencorajado. É a cidade em que cresci e, até me ter tornado famoso, nunca me tinha acontecido tal coisa. Parecia que ninguém nos queria por lá. Era horrível, não podia ir a um bar, não podia ir a concertos, um autêntico desastre. Não conseguia de todo continuar a viver e a criar ali, era uma coisa incrível. Tive, por isso, de procurar outro lugar para viver. O que não é fácil quando isso significa abandonar a nossa própria cidade. Não porque o desejemos mas porque nos forçam a isso”.

Apesar de ser um indígena de Detroit que sempre confessou não ter especial afeição pela música da Tamla Motown, a cidade – mesmo que, agora, Nashville se esforce por mimá-lo, nomeando-o embaixador musical (“Foi uma decisão do mayor e, sem dúvida, um gesto de apoio muito simpático“) – há-de ter-lhe ficado agarrada à pele...

“Evidentemente que sim. Quando criamos alguma coisa e não desistimos nunca de o fazer, acabamos por ser vítimas do ambiente em que vivemos. E isso é igual quer vivamos em Inglaterra, no Japão ou na Lua. O sítio em que crescemos inspira-nos das mais variadas formas. Detroit influenciou-me de um modo que nunca poderia ter sido igual caso vivesse, por exemplo, na Califórnia”.


Mas parece-lhe que a cidade pode começar a reerguer-se?

“Não. As infraestruturas estão arrasadas e a atitude positiva de reconstrução pura e simplesmente não existe. Chamam-lhe uma cidade em renascimento mas não está a acontecer renascimento nenhum porque a atitude que prevalece é a pior possível”.

24 May 2012

A REGRA DE TRÊS SIMPLES 
(3ª parte da entrevista com Jack White publicada na "Blitz") 



Ao contrário do que, aqui chegados, possa haver motivos para começar a suspeitar – sim, não desesperem –, também falámos de música. Mas, uma e outra vez, por algum misterioso motivo, a associação com imagens ou a alusão a um filme achou forma de se intrometer. Reparem, então: The Third Man/O Terceiro Homem, obra-prima absoluta do “noir”, de 1949, assinado por Carol Reed, com Orson Welles, Joseph Cotten e Alida Valli e sob a permanente assombração da banda sonora, em cítara alpina, de Anton Karas. Como chamou Jack White ao seu primeiro ganha-pão, por volta dos dezoito anos, uma oficina de estofador, a meias com Brian Muldoon, personagem local que lhe deu a conhecer o punk? Third Man Upholstery, publicitada através do slogan “Your furniture’s not dead”. Onde foi gravado o único single, de 2000, de The Hupholsterers – o duo de guitarra e bateria de Muldoon e White – preciosidade de colecção, contendo "Apple of My Eye", de Jack White, "I Ain't Superstitious", de Willie Dixon, e "Pain (Gimme Sympathy)", de Jack Starr? Third Man Studios. Qual a imagem estampada no bombo da bateria que, em 2010, White tocou, na digressão dos Dead Weather? A de Harry Lime (a sinistra personagem de Orson Welles em O Terceiro Homem), em fuga pelos esgotos da Viena do pós-guerra.



Que nome deu à editora independente que fundou em 2001 e cujo lema é “Your turntable’s not dead”? Third Man Records. Espreitem, agora, a primeira frase de "Ball And Biscuit", em Elephant, dos White Stripes: “It's quite possible that I'm your third man, girl”. Longe de mim – para quem o filme de Carol Reed bastaria como justificação para o cinema ter sido inventado – colocar reticências a tal obsessão. Mas é, sem dúvida, uma obsessão, não é, Jack?

“Tem tudo a ver com o filme, evidentemente, que é fabuloso, mas, igualmente, com a minha atracção pelo número '3'. Começou exactamente pela minha oficina de estofos: acredite ou não, eu era o terceiro estofador no meu quarteirão, em Detroit. Era inacreditável que uma única rua pudesse ter produzido três estofadores, uma profissão em declínio! (risos) E como também era grande fã de Orson Welles, surgiu esse nome. Mas o número '3' é a base de toda a minha criatividade, o abrigo em que me acolho. Uso-o a toda a hora quando componho, no design, nas cores... Gosto de limitações, de inventar regras e constrangimentos para poder criar no interior deles. Nos White Stripes, por exemplo, a nossa imagem era tricolor: vermelho, branco e preto. Submeter-me a essa regra do '3' contribui para que eu seja mais criativo”

Aparentemente, contudo, existe uma falha em tão férrea lógica: a paixão por O Terceiro Homem obrigaria que, a uma das guitarras que White possui, ele tivesse atribuído o nome de Alida Valli – a actriz principal, namorada de Lime/Welles, no filme – e não se tivesse ficado por apenas Veronica Lake, Claudette Colbert e Rita Hayworth. Que se passou, afinal?...

“(risos) Pois é, tem razão… mas, lá está, é o '3' outra vez, são três guitarras! É uma espécie de orientação autoimposta que devo seguir em tudo: Veronica Lake, Claudette Colbert, Rita Hayworth, uma loira, uma morena e uma ruiva!”

13 May 2012

A REGRA DE TRÊS SIMPLES 
(1ª parte da entrevista com Jack White publicada na "Blitz")



Na “suite de la Reine”, do Pavillon de La Reine, na Place des Vosges, em Paris, Jack White – ex-White Stripes, Raconteurs e Dead Weather episódico, e actual “himself”, a solo, via o novíssimo Blunderbuss – está sentado no sofá ao meu lado. Mas, no exacto instante em que, num cotovelo da conversa, a memória recua até à sua infância, em Detroit, as imagens que me passam em frente dos olhos são as daquela sequência de O Sentido da Vida, dos Monty Python (mais exactamente, “O Milagre da Vida, Parte II, O Terceiro Mundo”), em que, no Yorkshire, o pai de uma família católica com uma numerosíssima descendência, chega a casa para comunicar à prole que preenche cada centímetro quadrado do modestíssimo lar, que a fábrica onde trabalhava acabou de o despedir, pelo que se vê obrigado a vende-los a todos para experiencias cientificas. E sem quaisquer remorsos por ter de o fazer, pois se o criador o abençoara com uma tão vasta descendência, isso se devia, mui justamente, ao facto de ele sempre ter cumprido a santissima lei que decreta que “every sperm is sacred”.



Não me atrevo a perguntar a White se, lá em casa, ele, a mãe, o pai e os nove irmãos mais velhos alguma vez se terão entretido a ensaiar a maravilhosa coreografia que encerra tão magnifica suma teológica (nada de impossível: quando O Sentido da Vida estreou, em 1983, Jack, aliás, John Anthony Gillis, tinha sete anos, uma óptima idade para desempenhar um papel de figurante nesse momento clássico do cinema) mas arrisco uma jogada de envolvimento lateral: a experiência de crescer numa enorme e tão fervorosamente família católica (a mãe, Teresa, era secretária do bispo de Detoit, e o pai, Gorman, responsável pela manutenção da arquidiocese) que o conduziu, de acólito, na missa, a quase ingressar no seminário – com passagem, aos quatro anos, pelo elenco de The Rosary Murders, filmado na sua paróquia do Santo Redentor, no Sudoeste de Detroit -, só pode ter sido coisa que deixa marcas, não e verdade? 

“Sim, sim, mas pode acreditar que foi muito interessante. E é verdade, aos catorze anos, queria ser padre e fui aceite num seminário, do Wisconsin,. Mas, na altura, desisti e optei por uma escola pública, a Cass Technical High, em Detroit. Senti que não ia conseguir, que já não iria ser capaz de viver sem o amplificador que tinham acabado de me oferecer. Foi das primeiras e das raras vezes na minha vida em que mudei de ideias. Habitualmente, deixo-me conduzir pelo instinto. Mas, muito provavelmente, acabei por tomar a decisão certa: um ano depois, o seminário fechou”. 

A sequência – até hoje – é bastante menos difícil de prever do que se possa imaginar: 

“Não, não me parece nada que possa dizer que continuo a ser católico. Não acredito na religião naquele sentido em que ela deva intrometer-se na relação entre nós e Deus. Não tem qualquer utilidade, pelo contrário, funciona como um obstáculo. É apenas uma criação humana que não conduz senão a terríveis becos sem saída onde temos de nos defrontar com outros homens e com as suas ideias. Poderemos, talvez, aprender algo com todas as religiões mas a palavra ‘religião’, em si mesma, é obscena”.

08 December 2011