29 June 2020

Masculinidade (verdadeiramente) tóxica

Avisem já a RTP que, por distracção, pode vir a incluí-lo na programação!

Por isso é que são pobrezinhos 
e devem ser apoiados
 




(via DT)

26 June 2020


Fulton Street, Brooklyn, New York (15/06/2020)
Nunca estivemos em "confinamento", caraças!... As palavras certas são "autocontenção", "isolamento coercivo" e "recolhimento"!


The Smiths - "Panic"
Lisa O'Neill & Radie Peat - "Factory Girl"

Porque falou sobre aborto, homossexualidade e feminismo e logo gerou protestos, uma série infantil animada da RTP2 cujo objetivo é dar a conhecer o exemplo de mulheres corajosas que mudaram o rumo da História foi imediatamente retirada pela directora de programação. Por outras palavras, na RTP, faltam mulheres corajosas - nem seria preciso serem muito corajosas - que mudem o rumo da História

Edit 1 (12:30) - "Será possível que as crianças e adolescentes portuguesas não possam ver referências a direitos LGBT ou de saúde reprodutiva que foram considerados apropriados para as crianças e adolescentes francesas da mesma geração? A sério, em 2020?"

Edit 2 (13:15) - (só agora, em atraso, detectado): tal como os profissionais de saúde tiveram o seu "prémiozinho", os professores não lhes ficaram atrás - generosamente, o serviço público de televisão permitiu-lhes estar presentes (e eles aceitaram!...) numa das mais fétidas latrinas do "entretenimento" paga pelo orçamento de Estado

24 June 2020

"A acrimónia encarniçada, dos parolos estrangeirados a soldo do niilismo, tentaram apoucar-nos"? * "A submissão ao império perdido"??... "Os saudosistas e os indigentes profetas"???... Que raio andam a deitar na bebida do soba?!!!...


* "A acrimónia... tentaram"?... ó prá concordância!... e essas vírgulas, pá...)

23 June 2020

MARCA ELECTRIC PRUNES


Os Electric Prunes nunca foram exactamente uma banda mas, mais propriamente, uma marca. Desde o início, quando o produtor Dave Hassinger entendeu que os, então, Jim And The Lords deveriam chamar-se The Electric Prunes e os convenceu a interpretar canções das "songwriters" Annette Tucker e Nancie Mantz (ainda que, caridosamente, os autorizasse a gravar um ou outro tema próprio), as regras ficaram estabelecidas: Hassinger punha e dispunha e o vai-e-vem contínuo de músicos (mais de duas dezenas) que iam constituindo o “grupo” obedecia. Se os dois primeiros álbuns – The Electric Prunes e Underground, ambos de 1967 – revelaram aquilo que o vocalista James Lowe designava por "free-form garage music" (guitarras carregadas de efeitos, distorção e tempestade "fuzz" em permanência) e proporcionaram os modestos êxitos de "I Had Too Much To Dream (Last Night)" e "Get Me To The World On Time", seria no terceiro que o longo braço do produtor não deixaria margem para qualquer manobra.


"Kol Nidre" (álbum integral aqui

Um ano antes de os britânicos Spooky Tooth, com o compositor francês de "musique concrète" e electrónica, Pierre Henry, conceberem a sua versão da liturgia de uma missa cristã, Ceremony (1969), os californianos Prunes deveriam ocupar-se de Mass In F Minor, obra de David Axelrod, criatura todo-o-terreno, do jazz, ao rock e à soul. Como as sessões de estúdio fossem dificultadas pela pouca destreza da banda a decifrar partituras, Hassinger despediu os pobres moços e substituiu-os por músicos de estúdio vários que gravariam a quase totalidade de um peculiar álbum de psicadelismo mock-gregoriano cuja coroa de glória seria ver "Kyrie Eleison" seleccionada para a banda sonora de Easy Rider (1969), de Dennis Hopper. O que restava dos Prunes extinguiu-se mas Hassinger & Axelrod voltariam a usar o nome da banda em Release Of An Oath (1968) – agora reeditado –, novo "opus" religioso, desta vez, de inspiração judaica, que, em modo rock-orquestral-sinfónico, é francamente mais valioso do que todos os Days Of Future Passed e pretensiosos mamarrachos afins.
A "geração mais bem preparada de sempre" dos "melhores do mundo em tudo" está a provocar grandes dúvidas ao "mais antigo aliado"

20 June 2020

"Eu gosto muito do meu país, mas não tenho muitas ilusões sobre ele. É um país atrasado, pouco desenvolvido, sem massa crítica, pouco culto, sem grande qualificação da mão-de-obra, muito dependente de vagas de superficialidade, onde a maioria das pessoas trabalha duramente para não receber sequer o mínimo vital, sem vida cívica autónoma do Estado, com uma economia débil, desindustrializado, com uma agricultura desigual, pouco cosmopolita, com muitos aproveitadores e alguns bandidos, mas aí como os outros. É um país que cada vez menos tem autonomia política, dependente da transferência dos centros de decisão para Bruxelas. Aquilo em que somos melhores não coloca o pão no prato ao fim do dia, como agora se diz. Temos uma língua e uma literatura de valor universal, a melhor obra dos portugueses, mas ninguém come literatura. E temos uma democracia que é um valor que só quem sabe o que é ditadura percebe qual é. É mau? Não é mau, há muito pior, mas é sofrível, e sofrível não permite andar por aí a bater em pandeiretas. (...)" (JPP)

19 June 2020

June Tabor - "Barbry Ellen"

Riot
Pussy Riot (feat. Parcas, Dillom, Muerejoven) - "1312" (ACAB - All Cops Are Bastards)

Lastesis x Pussy Riot - Manifesto Against Police Violence

+ "I Can't Breathe", cinco anos antes


(ver também aqui)

* ... nem que lhes chamem "heróis"...

16 June 2020

Radicais livres (LXXXII)
 

Angela Davis on Abolition, Calls to Defund Police, Toppled Racist
Statues & Voting in 2020 Election

(transcrição aqui)

TRABALHO DE LABORATÓRIO
 

Arquitectura e jazz. Gamelãs e a Guildhall School of Music & Drama. Modalismo gregoriano e improvisação livre. Palestina, Londres, Lisboa, Chennai, Sudoeste Asiático, Médio Oriente e a África Ocidental. Steve Reich, John Adams, música coral e um vasto e indefinível etc. É algures nos interstícios desta intrincada teia de coincidências e intersecções estéticas, culturais e geográficas que talvez seja possível situar a música que Filipe Sousa (piano), Tara Franks (violoncelo) e Preetha Narayanan (violino), aliás, o Quest Ensemble, criam. Como explica Filipe Sousa, “a nossa linguagem musical e processos de composição colaborativa que se assemelham mais aos de uma banda do que a um processo de composição 'clássica' formal foram-se transformando: usamos, por vezes, partitura mas só como processo para desenvolver uma composição. Por vezes, partimos de um conceito ou de uma colaboração, muitas vezes de improvisações ou até de ideias. É, talvez, como um trabalho em laboratório. Da herança da música clássica, temos connosco o brio pela técnica, execução e detalhe. É um processo lento e muito pessoal, por vezes, difícil, como em qualquer banda, mas também, por isso, mais recompensador”.



Identificavelmente na tradição – pode já chamar-se assim – dos Kronos Quartet, Regular Music, Danish String Quartet, Balanescu Quartet, yMusic, ou Brodsky Quartet, The Other Side (produzido por Fred Thomas), ao contrário do que acontecera na estreia, Footfall (2014), não foi registado ao vivo mas em "multi-track" o que permitiu uma mais intensa concentração no trabalho de esculpir a matéria sonora e de consolidar e ampliar as estuturas musicais do trio. Sedutoramente complexo como um mecanismo de relojoaria, aqui e ali, descolando, literalmente, da rigorosa geometria para um abstraccionismo atmosférico, The Other Side (na sequência do trabalho do Quest com instituições de comunidades sociais desfavorecidas) junta a óptima música às boas causas: 100% da edição digital e 30% das vendas físicas do primeiro fim de semana de Junho reverteram para o movimento “Black Lives Matter”.
Sim, sim, sim!

15 June 2020

2020 - Prémio "Frase Idiota do Ano"

"Não podemos apagar a História"

Claro que não podemos. Mas podemos deixar de exibir, homenagear e glorificar no espaço público figuras que - com mais "contexto" ou menos "contexto" - intoxicam a paisagem das nossas cidades. Pergunta (quase) retórica: a ponte 25 de Abril deveria ter continuado a chamar-se ponte Salazar?


O palerma de olhos esbugalhados (II) diz as parvoíces ("CDS-PP defende que pandemia se vence com patriotismo") que um palerma de olhos esbugalhados sempre dirá - exactamente as mesmas, aliás, que constituem o (chamemos-lhe assim) "pensamento" profundo de um ex-"sit-down comedian" promovido a papagaio-mor
VINTAGE (DXXIII)

The Electric Prunes - Mass In F Minor

(álbum integral)

Promo

"Kyrie eleison" (BSO de Easy Rider, real. Dennis Hopper, 1969)

12 June 2020

O bácoro Lourenço pode vomitar todas as inanidades que lhe chocalham no crânio - teremos sempre o Mark Twain (esse temível marxista cultural) para recolocar as peças no seu devido lugar

(tradução em português)
"Há estátuas que podem e devem sair, ou ser removidas do pedestal e colocadas ao nível do solo, ou contextualizadas com texto ou mais arte, ou levadas para museus e inseridas em exposições que não escondam nada da história" (RT)

... e também há brasões que nenhuma contextualização poderá salvar...
Mas resta alguma dúvida de que Churchill era um porco racista?... (por outro lado, repito, antes, bem antes de incomodar o Padre António Vieira, há muito esterco para limpar)




10 June 2020

"Don't worry about 'rewriting history': it's literally what we historians do: People have always reinterpreted and re-evaluated the past. Every time a statue comes down, we learn a little more" (aqui)
A propósito de racismo e do derrube de símbolos fascistas, colonialistas e esclavagistas, que tal o ex-"sit-down comedian" aproveitar as solenidades tribais do 10 de Junho para propôr a higienização da toponímia das nossas cidades?

Edit (18:45) - não, o ex-"sit-down comedian" - como, aliás, seria de esperar - preferiu insistir no paleio épico-patrioteiro e anunciar homenagens aos "heróis da saúde" ...

09 June 2020


Modern Studies - "Heavy Water"

... e agora... um chernezinho 


UMA NAÇÃO DISTANTE


Era para ser La Nouvelle France, acabou por ser New Ireland, e, pelo caminho, deu origem a New Italy. Na origem de tudo esteve Charles Marie Bonaventure du Breil, marquês De Rays, nobre bretão aventureiro e lunático, que, em 1877 se proclamou “Carlos, rei da Nova França”, um império imaginário no Pacífico Sul. Para atribuir alguma realidade ao devaneio, em 1880, organizou uma expedição de cinco navios carregados com 570 alemães, franceses e italianos que ludibriara com promessas de um futuro radioso no novo império a troco de um investimento de 1800 francos por cabeça. Umas centenas de mortos mais tarde – por doença, inanição e maus tratos –, aportariam à actual New Ireland (uma ilha da Papua Nova Guiné), para descobrirem que a terra prometida como uma Riviera dos antípodas oferecia-lhes pouco mais do que fome, solo não arável e malária. Pelo meio de inúmeras peripécias e sucessivos desenganos, um grupo de italianos conseguiria chegar à Nova Gales do Sul, na Austrália, e aí fundar uma colónia, inicialmente, La Cella Venezia, e, depois, New Italy, 490 hectares à beira do rio Richmond, hoje, um lugarejo com menos de 200 habitantes, semeado de réplicas de estatuária greco-romana. 



É exactamente essa a origem da família de Marcel Tussie, baterista dos Rolling Blackouts Coastal Fever (a que acrescem as memórias mediterrânicas da ascendência dos guitarrista e baixista Tom e Joe Russo), que, para o segundo álbum, Sideways To New Italy, foram em busca de uma relação metafórica entre a existência nómada da banda desde a formidável estreia, Hope Downs (2018), e a história da emigração europeia para a Austrália: “São expressões de gente à procura de um lar em território desconhecido, à descoberta de uma utopia num mundo turbulento e imperfeito”, dizem eles agora, tal como, há dois anos, já falavam de “uma colecção de postais de um mundo cada vez mais estranho em que sentimos que a areia nos foge sob os pés”. Sem se prenderem demasiado ao perfil musical do primeiro disco (a mais que perfeita aliança entre Go-Betweens e Television) nem rompendo abruptamente com ele, por entre o fogo de artifício das três guitarras e sobre um mapa - de Melbourne, a Darwin ou a Rushwort -, projectam o filme: “I keep my vision tight at all the deep scenes, a stationary boy in a moving daydream, down on the corner, watching over, liquid crystal simulation, like a ghost at the service station, in some far-off fence post nation”.
Fiona Apple - "Limp"

08 June 2020

Jean Philippe Rameau - L'Orchestre de Louis XV (Le Concert des Nations, dir. Jordi Savall)

Elvis Costello - "No Flag"

A beatagem social-fascista, marcando território, reforça o estilo norte-coreano (que, além do mais, tem a vantagem de exigir menos soldadinhos para ocupar uma determinada área)



06 June 2020

Talkhouse: Jarvis Cocker & Stephin Merritt


"Screen New Deal - (...) This is a future in which, for the privileged, almost everything is home delivered, either virtually via streaming and cloud technology, or physically via driverless vehicle or drone, then screen 'shared' on a mediated platform. It’s a future that employs far fewer teachers, doctors, and drivers. It accepts no cash or credit cards (under guise of virus control) and has skeletal mass transit and far less live art. It’s a future that claims to be run on 'artificial intelligence' but is actually held together by tens of millions of anonymous workers tucked away in warehouses, data centers, content moderation mills, electronic sweatshops, lithium mines, industrial farms, meat-processing plants, and prisons, where they are left unprotected from disease and hyperexploitation. It’s a future in which our every move, our every word, our every relationship is trackable, traceable, and data-mineable by unprecedented collaborations between government and tech giants (...)" (Naomi Klein)

03 June 2020

É só esperar mais 15 dias até que ciganos, africanos, brasileiros, asiáticos, proletas brancos (lusos, ucranianos, moldavos, romenos...) e "lumpen" variado testem negativo - aquilo é tudo malta jovem e rija! - para que possam regressar às espeluncas miseráveis em que (sub)vivem e aos transportes onde se amontoam como gado a caminho do abate e (esquecendo generosamente  que nos deram cabo das estísticas que estavam a correr tão bem) lhes seja oferecida a fantástica oportunidade de participar na epopeia gloriosa da "retoma da economia"!
A reputação do Grande Manipanço Cósmico já andava pelas ruas da amargura... depois disto... kaput!
A ESTÉTICA DA RAPIDINHA


“Então, também está em quarentena?...” são as primeiras palavras que Stephin Merritt me dirige, a 5 400 quilómetros de distância, algures em Nova Iorque. Quilómetros a mais, aparentemente, para a rede telefónica que, após alguns minutos de tentativas frustradas de continuar um diálogo em termos inteligíveis, obrigará a prossegui-lo via e-mail. Ainda de viva voz, explicar-me-á que, para o novo álbum dos Magnetic Fields, Quickies – 28 canções com durações entre 17” e 2’30” – o conceito de “rapidinhas” só surgiu a meio caminho: “Raramente, se é que alguma vez isso aconteceu, decido fazer um álbum sem ter pelo menos algumas canções já escritas. Na verdade, 23 das canções de 69 Love Songs eram suficientemente curtas para poderem ter sido incluídas em Quickies. Creio que já tinha escrito ‘Bathroom Quickie’ e pus-me a imaginar como poderia ser um álbum em que ela encaixasse bem ou pudesse mesmo ser a peça central”


Pergunto-lhe se a atmosfera musical de caixa de música distorcida que atravessa todo o álbum terá algo a ver com aquilo que o "press release" revela – ele terá andado a ouvir muita música barroca francesa para cravo – e, primeiro, dá-me um bom conselho (“Nunca acreditar numa só palavra do que se lê num press release”), para, a seguir, confirmar: “É verdade que, no carro, tenho escutado bastante música para cravo de Rameau e da família Couperin. É perfeita porque não se deixa abafar pelo ruído do motor. Daí ter começado também a apreciar o som de um único instrumento, não usando a força mas a persuasão, e sem precisar de exagerar nos registos graves. Mas, de facto, tenho várias caixas de música e, um dia, ainda hei-de escrever alguma coisa para elas”. E remata com uma máxima digna de Leonard Bernstein: “Suponho que sou o tipo de pessoa que gosta desse tipo de sonoridade e exprimir aquilo de que gostamos em música é o primeiro e único propósito da música”. Todas as miniaturas de Quickies são povoadas por personagens peculiares, excêntricas, bizarras... ficcionais ou inspiradas em figuras e situações reais? “A maioria é imaginária embora "When the Brat Upstairs Got a Drum Kit" siga de muito perto algo que aconteceu com a Claudia Gonson e "I Wish I Were a Prostitute Again" registe e exagere discursos que ouvi a dois amigos meus que foram trabalhadores sexuais. "The Boy In The Corner" sou eu, sem dúvida, até ao ponto em que ele é atingido por um raio. Como figura contrastante, imaginei um amigo particularmente extrovertido que sempre que entra numa sala nunca passa despercebido. E nunca foi atingido por nenhum raio”.

Mas, numa gravação em que os temas recorrentes são “a morte súbita (por vezes, em escala massiva); os alemães; cientistas que fazem coisas estranhas com animais; conspirações; e o verdadeiro amor”, algumas merecem especial atenção: a rapariga de "The Biggest Tits In History”, o cientista louco de "Castle Down a Dirty Road", a criatura fantástica de "I WishI Had Fangs And A Tail", pretextos para divagações com consequências teológicas: “Qualquer pessoa que tenha aprendido a programar um sintetizador deve ter reparado como isso é semelhante a ser um cientista louco: ficar a pé, noite fora, a mexer em botões indecifráveis para fazer algo que os meros mortais nunca entenderiam nem que isso destruísse o mundo à volta!... Os desejos em ‘I Wish I Had Fangs And A Tail’ não são necessariamente cumulativos, o bigode garboso e as garras, por exemplo, podem anular-se. Tal como as qualidades de Deus se contradizem: é impossível ser, simultaneamente, omnisciente e omnipotente. A omnisciência implica conhecer o futuro mas, se o futuro já existe, não pode ser mudado, logo, não é omnipotente”.


O que, à boleia de "I’ve Got a Date With Jesus" e "You’ve Got a Friend in Beelzebub", o autoriza a concluir: “Acho a religião uma coisa completamente idiota, não entendo como pode ser levada tão a sério. A encarnação do mal costumava ser uma serpente mas, agora, tem asas de morcego e cascos fendidos. Pobre tipo! É o que dá desejar ter garras e cauda. Ser omnipotente? Nãããooo!...” Apresente-se, então o alter-ego de Bakunin moderno de Stephin Merritt, tal como é exposto nos dois manifestos radicais "The Day The Politicians Died" (todos! sem excepção!) e o feminista "Kill a Man A Week". São para levar à letra? “O desejo da eliminação dos políticos não é porque pense que devam ser destruidos individualmente por um raio de Zeus, ainda que isso fosse agradável. Mas não deveriam existir enquanto classe. As relações de poder entre pais e filhos são um mal necessário que, apenas décadas depois, pode ser vingado. Todas as outras relações de poder são males desnecessários. ‘Kill A Man A Week’ resolveria, sem dúvida, muitos problemas embora não de um modo tão eficiente como o extermínio dos políticos. Mas não me parece que, actualmente, pudesse existir um Bakunin, as armas nucleares deram cabo dessa possibilidade”.


Problemas de índole laboral e existencial abundam, como os do protagonista de "I Wish I Were A Prostitute Again", sonhando com um El Dorado irremediavelmente perdido (“A verdade é que ele pode sempre arregaçar as mangas e voltar a trabalhar como prostituto. Muito mais tristes são os desejos irrealizáveis daquele pobre diabo que quer pertencer a um 'biker gang' e nunca será suficientemente 'cool' para o fazer”), mas que, no que à trama narrativa respeita, poderiam passar de mão em mão, entre todas as personagens: “Lola, a ornitologista, despe a bata do laboratório e revela ter garras e cauda. Mas está também na comissão de planeamento da aldeia e é atingida por um raio no momento em que se preparava para atacar o ‘rock’n’roll guy’ com as suas mamas gigantes. E pode fazer-se o mesmo com as personagens de qualquer álbum: ‘Lucy in the sky’ ‘is leaving home’, despede-se do emprego como ‘meter maid’ e junta-se à Sgt Pepper’s Lonely Hearts Club Band que vai dar um concerto no Albert Hall (depois de taparem os buracos) porque o exército inglês acabou de vencer a guerra (como se tal coisa fosse possível! é sempre a marinha que ganha)”.

Ainda que todas brevíssimas, canções como "Bathroom Quickie", "Song Of The Ant", "Death Pact", "She Says Hello" e "Castles Of America", com um segundo a menos de respiração, evaporar-se-iam. O objectivo último é inventar o haiku pop? “Bem, elas rimam, para haikus, são ainda grandes demais, e falta-lhes uma relação entre a natureza e as estações do ano. Não diria que não a essa ideia mas alguém já o deve ter feito (e não me apetece ir procurar ao Google)”. Para o imprevisível futuro dos outros alter-egos de Merritt - The 6ths, Gothic Archies e Future Bible Heroes –, porém, é necessário que estejam reunidas algumas condições: “Ainda só passaram 7 anos desde o último álbum dos Future Bible Heroes. Da última vez, foram 12 o que é uma frequência tipo Kraftwerk ou Kate Bush. Os 6ths andam mais por um interregno à escala dos My Bloody Valentine, é melhor começar a pensar em gravar qualquer coisa. Os Gothic Archies deram há pouco um concerto o que significa que, mais década, menos década, haverá um álbum. Estamos à espera que a situação mundial se torne muito, muito negra. Ainda não está suficientemente negra”. Não há-de tardar muito.