30 December 2022

Pussy Riot (feat. Slayyyter) - "HATEFUCK"

(ver video no YouTube; da mixtape Matriarchy Now + ver aqui)
 
"The audio-visual art piece 'HATEFUCK' is the next piece of Pussy Riot's ongoing 2022 cycle Patriarchy R.I.P. that revolves around a super(s)hero character who owns magic superwoman-like qualities & uses these powers to destroy the patriarchy. 'HATEFUCK' follows another piece from this cycle, 'PUNISH' released earlier this year. 'HATEFUCK' runs in tandem with Pussy Riot-curated exhibit Patriarchy R.I.P. that runs on billboards all across the US, mostly in red states. 'HATEFUCK' heroines, vengeful dominatrixes and goddesses, they serve justice by creating a hell on earth for sexual abusers, for privileged exploiters of marginalized, alienated and objectified groups. Created under the influence of Hieronymus Bosch's visions of hell". 
 
(sequência daqui) Mas, pelo meio, podemos observar como, diversas vezes, Florence consulta o placard coberto de folhas com fragmentos de textos, fonte de alimentação das canções em processo de gravação. Algures por ali – sob os espectros de Sterne, Burroughs, Gysin e Laurie Anderson –, John Parish, no posto de (discreto) comando, esforça-se por arrumar tudo ao jeito de um diário dadaísta, acondionado por um "brainstorming" instrumental em comunicação mental com os Wire, Pavement, Johnny Marr e Robert Fripp. Na capa do sucessor de New Long Leg, um sabonete no qual o título do álbum se desenha numa elegantíssima filigrana de pelos púbicos. Um manifesto? “For a happy and exciting life, locally, nationwide or worldwide, stay interested in the world around you”.

28 December 2022

DELIBERADA (DES)ORGANIZAÇÂO
No passado dia 10 de Outubro, os Dry Cleaning, para dar a ouvir o segundo álbum, Stumpwork, escolheram o rinque de patinagem no gelo do Rockfeller Center, em Nova Iorque.. No video para a canção de abertura, "Anna Calls From The Arctic", sobre o infinito "loop" visual de um patinador, Florence Shaw, em conversa consigo mesma, interroga-se confusamente (“Should I propose friendship? Flies going crazy, wriggling and flipping, Emporio Armani builder, I see shit everywhere”), divaga (“I like it when you can see inside houses from a car, it's cozy”) e resmunga (“Nothing works, everything's expensive and opaque and privatised, my shoe organising thing arrived, thank God”). Noutro video, o de "No Decent Shoes for Rain", montagem aleatória de imagens, os quatro Dry Cleaning (e um cão) espelham o mesmo plano de deliberada (des)organização do texto – “New Zealand, France, Switzerland, Northampton, Exeter, Egypt, it won't do to cry about it, I've seen a rat, I've seen a guy cautioned by police for rollerblading, let's smoke and drink and get fucked, I don't know, let's eat pancake” –, enquanto a música se dilata em crescendo, interrompe-se, e, após nova escalada, por fim, desmorona-se. (daqui; segue para aqui)
Em sintonia com o espírito da quadra (XII)
 
"The Most Offensive Song Ever (Virgin Mary)" - South Park

(por sugestão nesta caixa de comentários)

"It was very important for us to create the image of not just a beautiful, but also a strong-willed girl who personifies the whole of Ukraine – unbending, courageous, free. Despite all the difficulties and challenges, we coped with creating the image on time, because each of us is a Warrior in his business”. (via DT)
... mas que a pobrezinha, ao menos, comece a receber já o subsídio de desemprego!...

26 December 2022

Domenico Modugno - "Volare (Nel Blu Dipinto Di Blu)"
 
(sequência daqui) Mas nenhuma supera o ponto de vista sobre "Volare", de Domenico Modugno (“Esta poderá ter sido uma das primeiras canções alucinogénicas antecipando em quase dez anos "White Rabbit", dos Jefferson Airplane”), que desencadeia uma especulação linguística inesperada: “Há algo muito libertador em escutar uma canção numa língua que não compreendemos. Vão a uma ópera e verão como o drama salta das páginas mesmo que não percebam uma só palavra. Escutem um fado e a tristeza escorrerá dele ainda que não falem uma sílaba de português”. Pelo caminho, depois de ampliar desmedidamente o "plot" original do texto de uma canção, é perfeitamente capaz de se pôr a escrever em rimas (em "The Pretender", de Jackson Browne: “He’s an ice-cream vendor, a drunk on a bender, a moneylender, and he could have been a contender, the pretender has drawing power“) ou de – a meio da abordagem de “The Little White Cloud That Cried”, de Johnnie Ray – apresentar uma lista de 26 canções banhadas em lágrimas, nenhuma delas na ponta da língua de ninguém.
 
  
 
 Elvis Costello -"Pump It Up"
 
Genuína obra-prima de elogio acri-doce temperado de ciumeira é, no entanto, o que escreve sobre "Pump It Up", de Elvis Costello: “Esta canção tem imensos defeitos mas consegue disfarça-los a todos. Por essa altura, Costello tinha andado a ouvir Springsteen de mais. Mas também tinha ingerido uma valente dose de ‘Subterranean Homesick Blues’. É implacável como são todas as canções dele deste período. O problema é que isso fatigava as pessoas, continham um excesso de ideias que chocavam umas com as outras e eram palavrosas demais. Aqui, porém, tudo é compactado numa única canção. Com o tempo, Elvis demonstraria possuir uma gigantesca alma musical. Dali em diante, comporia música de câmara, escreveria canções com Burt Bacharach, discos de country, versões, soul, música orquestral e para bailado. E, se escrevemos canções com Burt Bacharach, quem quer saber o que as pessoas possam pensar?”
É absolutamente urgente que alguém ouse fazer a única pergunta que importa: é, de facto, verdade que isto aqui é uma data de gatunos, uma data de ladrões e uma data de chupistas?

MÚSICA 2022 - INTERNACIONAL/NACIONAL (VII)
 
(iniciando-se, de baixo para cima *, de um total de 37)

Laurie Anderson - Norton Lectures, Spending the War Without You: Virtual Backgrounds

  

 

Amélia Muge – Amélias 


Dry Cleaning - Stumpwork 


 

* a ordem é razoavelmente arbitrária

22 December 2022

Willie Nelson & Merle Haggard - "Pancho and Lefty"

(sequência daqui) Esta última regra surge a propósito de "Pancho And Lefty", de Willie Nelson e Merle Haggard, na qual Dylan encontra um ponto de apoio para se lançar numa análise de classes da Revolução Mexicana. Não é caso único: a propósito de "There Stands The Glass", de Webb Pierce, desenterra a história de Nuta Kotlyarenko – nome artístico, Nudie Cohn, judeu ucraniano fugido aos pogroms da Rússia czarista – convertido em costureiro de vedetas country, 4 presidentes americanos e dois papas (e Dylan pega no pretexto para falar de si enquanto recorda Kotlyarenko: “Como acontece com muitos que se reinventam, os detalhes biográficos, por vezes, são nebulosos...”), e "Blue Suede Shoes", por Carl Perkins, parece-lhe inteiramente apropriada para se debruçar sobre Felix Edmundovich Dzerzhinsky, aka Felix de Aço, fiel comparsa de Lenine e Estaline e dirigente da Cheka, primeira organização da polícia política sovética: “Durante o Terror Vermelho, no início da Guerra Civil Russa de 1918, Lenine perguntou-lhe por quantas execuções era a Cheka responsável. Dzerzhinsky sugeriu que se contasse o número de sapatos e se dividisse por dois”

Carl Perkins - "Blue Suede Shoes"
 
Quanto a própria matéria das canções, Dylan tem opiniões muito suas acerca dos diversos casos sobre que escreve: “Os Grateful Dead são essencialmente uma ‘dance band’. Têm mais em comum com Artie Shaw e o bebop do que com os Byrds ou os Stones”; “O "bluegrass" é o outro lado do heavy metal. Ambos são formas musicais enraizadas na tradição que, tanto visual como auditivamente, não mudaram durante décadas”; “A country music vai à igreja ao domingo porque passou a noite de sábado à facada, num beco, e a tentar convencer a miúda do bar a levantar a saia até à cintura”; “Os discos de soul, hillbilly, blues, calypso, cajun, polka, salsa e outras formas indígenas de música contém uma sabedoria que as classes altas apenas adquirem na academia”; “Um 'serial killer' poderia cantar esta canção (‘You Don’t Know Me’, de Eddy Arnold). Os 'serial killers' têm um sentido estranhamente formal da linguagem que os leva a falar do sexo como a arte de fazer amor”. (segue para aqui)
Convém não esquecer
 

20 December 2022

Elvis Presley - "Money Honey"
 
(sequência daqui) "Money Honey", de Elvis Presley, por exemplo, onde este é apenas referido de passagem: “A arte é um desacordo. O dinheiro é um acordo. Eu gosto de Caravaggio, tu gostas de Basquiat. Gostamos ambos de Frida Kahlo e Warhol não nos aquece. A arte alimenta-se destas disputas. É por isso que não pode existir uma arte nacional. Quando essa tentativa ocorre, apercebemo-nos do limar das arestas, da tentativa de incluir todas as opiniões, do desejo de não ofender ninguém. Demasiado depressa, transforma-se em propaganda ou comercialismo rasteiro. Não que haja algo errado com o comercialismo mas, como tudo que tem a ver com dinheiro, baseia-se num salto de fé mais abstracto do que o abstraccionismo geométrico de Frank Stella”.
 
 
Frank Sinatra - "I'm A Fool To Want You"

No fundo, tudo poderia reduzir-se a poucas regras: 1) “Se uma canção nos emociona, isso é o que importa. Não tenho de saber o que ela significa. Já escrevi sobre tudo nas minhas canções. E não me preocupo nada com isso”; 2) “Conhecer a biografia de um artista não nos ajuda especialmente a compreender uma canção. Aparentemente, o que Frank Sinatra sentia por Ava Gardner é a matéria de ‘I’m A Fool To Want You’ mas isso são apenas banalidades. O que importa é como uma canção nos faz sentir acerca de nós próprios”; 3) “Uma forma de avaliar um autor de canções é reparar em quem são os intérpretes que as cantam. Outra é verificarmos se elas continuam a ser cantadas”. (segue para aqui)
Festas felizes

Luis Ricardo Falero - Witches Going To Their Sabbath (1878)

18 December 2022

16 December 2022

 
 
 
Bobby Bare - "Detroit City"
 
(sequência daqui) Com 399 páginas, 66 textos em torno de outras tantas canções e uma generosa colecção de mais de 100 imagens e fotografias (relacionados directa ou indirectamente com os tópicos abordados), The Philosophy Of Modern Song é muito mais uma natural sequência de “Theme Time Radio Hour” – o fabuloso programa de rádio tematicamente estruturado que, entre 2006 e 2009, Dylan apresentou na XM Satellite Radio e, depois, na Sirius Satellite Radio, no qual músicas de todos os géneros (1894 por 1158 artistas) coexistiam com histórias e farrapos de informação avulsos, jingles, recitações de poesia, receitas de cocktails, ou elucubrações acerca deste mundo e do outro – do que o (impacientemente) aguardado segundo volume de Chronicles
 .
The Temptations - "Ball Of Confusion"
 
Se, sobre “Theme Time Radio Hour”, Tom Waits uivou “He’s better than Wolfman Jack!”, desta vez, somos convidados a visitar a jukebox privada de Dylan e a acompanhá-lo enquanto disserta sobre os mais improváveis assuntos e temas que, por vezes, mantèm apenas uma vaga relação com o disco ou o músico que tomaram como rampa de lançamento. O que, não se tratando, de todo, de um “best of” ou de um “greatest hits” da “canção moderna” – na verdade, das 66, apenas duas foram publicadas no presente século, a maioria data dos anos 50 e só 4 são interpretadas por cantoras – explica por que motivo, para só citar uns quantos, Joni Mitchell, Leonard Cohen, Chuck Berry, Tom Waits, Billie Holiday, Bessie Smith, Odetta, Edith Piaf, Patsy Cline, Lennon/McCartney, Muddy Waters, Howlin’ Wolf, Skip James ou John Lee Hooker estão ausentes mas uma considerável percentagem de ilustríssimos desconhecidos aqui se reune. Na realidade, este não é um tratado sobre a filosofia da canção moderna mas um pretexto para filosofar a partir da canção moderna. (segue para aqui)

14 December 2022

A JUKEBOX DE BOB DYLAN
Antes de mais, como se deve, a capa: à esquerda, num sorriso de demónio falsamente ingénuo, Little Richard; à direita, Eddie Cochran, o elegante “all american boy”, James Dean do rock’n’roll, morto aos 21 anos; ao centro, onde poderia prever-se que Elvis Presley completaria a santíssima trindade, uma figura não imediatamente identificável e de género indeciso, a única que empunha uma guitarra. Quando, enfim, descobrimos de quem se trata, não duvidamos que, em The Philosophy Of Modern Song, publicado 18 anos após Chronicles Vol. 1, Bob Dylan – aliás, Blind Boy Grunt, Tedham Porterhouse, Boblandy, Robert Milkwood Thomas, Elston Gunn, Boo Wilbury, Lucky Wilbury, Jack Frost, Sergei Petrov e, mais significativamente, Alias – desejou deixar claro que ninguém está imune ao síndroma-“Je est un autre”, primeiramente identificado por Rimbaud e, no caso dele, extensamente estudado em I’m Not There (filme de Todd Haynes “inspirado pela música e pelas muitas vidas de Bob Dylan”). A figura misteriosa, então: Alis Lesley, desde agora, a mais famosa das diversas “female Elvis Presley” da época, com uma meteórica carreira de 2 anos, um único single (sem qualquer sucesso), e a medalha de Elvis ter feito questão de assistir a um concerto dela em Las Vegas. (daqui: segue para aqui)
MÚSICA 2022 - INTERNACIONAL/NACIONAL (III)
 
(iniciando-se, de baixo para cima *, de um total de 37)

Alela Diane – Looking Glass

 

Neil Youmg - Barn 

 

Daniel Rossen - You Belong There

 

Stick In The Wheel - Perspectives On Tradition

 

The Mysterines – Reeling

 * a ordem é razoavelmente arbitrária.