O QUE SABEMOS AGORA
“Quando fazemos alguma coisa durante bastante tempo, é fácil acabarmos a discutir com o nosso próprio passado. Não tinha nenhum interesse em gravar um álbum cujo lema fosse: 'Lembram-se deste tipo? Este disco irá recordar-vos de quando gostavam dele'. Não é essa a vida que vivo. Queria gravar um álbum que, anteriormente, não pudéssemos ter gravado. Acerca do que sabemos agora, de como agora nos sentimos e do que amanhã faremos”. Há, obviamente, algo seriamente errado no hipotético lema que Elvis Costello refere no texto de apresentação de Look Now: não apenas o tempo de conjugação do verbo “gostar” não é correcto – onde está escrito que, de um momento para o outro, se tenha deixado de “gostar” dele? – mas, apesar dos 8 anos de ausência desde o óptimo National Ransom, ele não esteve propriamente "missing in action". Ouvimo-lo em Wise Up Ghost (2013) com The Roots, na reconstrução arqueológica (não magnificamente sucedida, é verdade) dos textos inéditos de Bob Dylan em Lost On The River: The New Basement Tapes (2014), lemos vorazmente a autobiografia Unfaithful Music & Disappearing Ink (2015) e, durante todo esse período, quem peregrinou até aos palcos a que ele subia – as tournées “The Return Of The Spectacular Spinning Songbook” (2011), “Detour” (2015/2016) e “Imperial Bedroom & Other Chambers Tour” (2016/2017) – teve oportunidade de testemunhar a óptima forma de Costello & The Imposters, particularmente evidente na avassaladora interpretação de "The Future", de Leonard Cohen (cada vez mais tragicamente actual), no Memorial Tribute a Cohen, de 6 de Novembro de 2017, em Montreal.
Não é, pois, de espantar que, perante tantas provas de intensíssima vida, Costello se tenha deixado convencer que, ao contrário do que havia decidido, ainda era demasiado cedo para desistir dos estúdios. Look Now remove as últimas dúvidas que pudessem existir: com três novas belíssimas canções escritas a quatro mãos com Burt Bacharach e uma saborosa “antiguidade” com Carole King, a totalidade do álbum é uma exuberante demonstração da vitalidade do idioma pop clássico – aquele que começa no Brill Building, é reconfigurado pelo rock e pelo punk e, pelo caminho, vai mudando inúmeras vezes de pele – quando entregue aos cuidados dos melhores mestres. Daqueles que promovem felicíssimos casamentos de melodia e harmonia capazes de acolher palavras como “I see you looking at me, looking at how you’re looking at me”.
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