18 May 2016

AJOELHAR

  
Como, pelo menos desde Cristóvão Colombo, bem sabemos, é perfeitamente possível, a partir de um ponto de vista errado, chegar a muito felizes resultados. I’ve Always Kept a Unicorn: The Acoustic Sandy Denny assenta numa ideia, no mínimo, controversa: seria em versão radicalmente a solo e acústica que as extraordinárias voz e sobrenatural capacidade interpretativa de Denny achariam o ponto ideal para delas podermos desfrutar integralmente. Apenas a relutância em deixar a voz demasiado exposta e o desejo de abrigá-la na companhia de outros músicos e timbres instrumentais a teriam impedido de aceitar a opinião dos muitos que procuraram convencê-la a dar esse passo. Assim, quase quatro décadas após a sua morte (em 1978, aos 31 anos), em I’ve Always Kept A Unicorn teríamos, finalmente, “o melhor álbum que ela nunca gravou”: reunindo registos ao vivo, de rádio e televisão, "demos" de canções posteriormente gravadas com os grupos de que fez parte (Strawbs, Fairport Convention, Fotheringay, The Bunch) ou nos álbuns a solo – todas, à excepção de três, já publicadas em diversas compilações mas aqui tematicamente agrupadas pela sua condição acústica –, os 40 temas acolhidos no duplo CD contituiriam a genuína obra-prima oculta que Sandy sempre se recusou a assinar. 

Por trás deste conceito, encontra-se, claro, o persistente puritanismo estético "unplugged", segundo o qual, só totalmente despida de quaisquer adornos, uma peça musical pode revelar a sua mais profunda “verdade”. O que, no caso de Sandy Denny, nos conduziria, inevitável e estupidamente, a desvalorizar os magníficos What We Did On Our Holidays, Unhalfbricking e Liege & Lief (todos do prodigioso ano de 1969, quando, com os Fairport Convention, literalmente inventou o folk-rock britânico), o não menor Fotheringay (1970) e o mais que perfeito The North Star Grassman And The Ravens (1971), em nome individual. Na realidade, se Unicorn, obviamente, não afirma qualquer superioridade do modo acústico, o que, porém, fica é uma excepcional recolha de outros ângulos de escuta que, particularmente em "John The Gun", "She Moves Through The Fair", "North Star Grassman", "Quiet Joys Of Brotherhood" ou "Lowlands of Holland", nos obriga a ajoelhar, de novo, perante Sandy Denny. 

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