17 March 2016

ORGIA

Imagine-se uma gigantesca orgia em que participariam os Talking Heads, Peter Gabriel (pré-"world music"), XTC, Prince, Squeeze, Van Dyke Parks, Robert Fripp, os Neptunes, Nile Rogers, Gang of Four e Prefab Sprout, organizada pelos irmãos Peter e David Brewis (aliás, Field Music). Eles desejariam ter também convidado Stravinsky, Thelonious Monk, Serge Gainsbourg, os Roxy Music, Beatles, The Left Banke e The Band mas, por motivos devidamente justificados, nenhum destes pôde comparecer. O programa obrigatório consistiria de uma rigorosa execução colectiva da totalidade das posições do Kama Sutra, acrescidas daquelas inúmeras variantes acrobáticas introduzidas pelo Divino Marquês. Os orgasmos, a acontecerem, porém, teriam de ser puramente cerebrais. Não em consequência de um pré-conceito tântrico ou taoista mas, sim, exclusivamente musical. Na ausência de confirmação ou desmentido oficiais, não será demasiado especulativo supor que, daí, teria resultado Commontime, registo da intrincada geometria sonora que tais coreografias haveriam de segregar.



Aparentemente e contra todas as probabilidades, tal estratégia destinar-se-ia a tornar o sexto álbum dos Brewises – publicado quatro anos após o imaculado Plumb - mais… err… acessível (“I am okay with the word ‘accessible’” diria o Brewis, David): em vez dos habituais labirintos rítmicos, a reconfortante vulgaridade do "common time" (o banalíssimo quaternário da silva); no lugar de uma variante civilizadamente contemporânea do prog, o pezinho erudito a fugir para a chinela pop. Deverá, então, dizer-se que, nessa exacta medida, Commontime é um glorioso fracasso. É verdade que, embora continuem a predominar os deleites do pescoço para cima, aqui e ali, vai-se sentindo, agora, também, qualquer coisinha funk da cintura para baixo. Mas, de um modo geral, é (felizmente) impossível dizer que os moços se esquivaram a incluir um solo razoavelmente atonal de sax na quase "crowd pleaser", "The Noisy Days Are Over”, que a arquitectura maniacamente detalhada de "Trouble At The Lights" é coisa para ser digerida de uma vez só, que os arranjos, simultaneamente económicos e expansivos do Crude Tarmac String Quartet são matéria óbvia ou que a pasmaceira metronómica tomou o poder. Era só que faltava.

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