25 August 2022

Revisões da matéria dada (X)

A propósito do debate nesta caixa de comentários, recorde-se aqui, aqui e aqui

40 comments:

Kid N said...

Obrigado. Acabo de adicionar uns esclarecimentos

Music lover said...

Tom Waits
blues
jazz
cabaret
valsas
polkas
...

nickname big black said...

"Quando você for convidado pra subir no adro da fundação
Casa de Jorge Amado
Pra ver do alto a fila de soldados, quase todos pretos
Dando porrada na nuca de malandros pretos
De ladrões mulatos e outros quase brancos
Tratados como pretos
Só pra mostrar aos outros quase pretos
(E são quase todos pretos)
E aos quase brancos pobres como pretos
Como é que pretos, pobres e mulatos
E quase brancos quase pretos de tão pobres são tratados"

Kid N said...

Music lover said...

Os Stones são uns desavergonhados, os Led Zeppelin, esses, ladrões. Que cambada de bandidagem, pilharam os pretos. Os Dead Combo, ai, que mixordia mulata.
Até aqui, tudo bem, mas Mozart interpretado por um preto ou oriental, é que nem pensar - o respeitinho é muito bonito.

Kid N said...

Há quem não perceba aquilo de que se está a falar. Esse post é prova cabal.

Os Stones pilharam muito, sim. Mas sempre deram o crédito devido

João Lisboa said...

"Há quem não perceba aquilo de que se está a falar"

Puríssima verdade:

https://lishbuna.blogspot.com/2016/10/apropriacao-cultural-debussy-pagodes.html

https://lishbuna.blogspot.com/2016/01/nenhuma-bandeira-nao-estara-proximo-de.html

Music lover said...

Caro Kid N,
Talvez não me tenha expressado da melhor forma, pretendia ser irónico, claro que os Stones não necessitam de qualquer explicação.

Music lover said...

Caro João Lisboa,
Apenas estava, tentava, ser irónico. Não tenho nenhum preconceito com qualquer tipo de música, seja de estilo ou de raça.
Proponho que se considere discutir a qualidade do intérprete de Mozart, do reggae, rock, jazz e todas as outras músicas, independentemente de quem as toca e donde vem.

Kid N said...

Muito bem. Suponho que os amigos que usaram os sombreros nunca lhes foi dito “volta para a tua terra”, “vai fazer a minha enchilada”, “fala em inglês, e outras coisas. Suponho que nunca pensaram nos mexicanos como um povo preguiçoso, que só quer fazer a siesta, de sombrero na cara. E suponho que muitos fãs dos Stones e dos Zep nunca pensaram “Não ouço isso que é música de pretos”, quando antes lhes tentavam mostrar o Buddy Guy, o John Lee Hooker, ou o Muddy Waters. Tirando isso, são muito giros e very pictoresque

João Lisboa said...

"Apenas estava, tentava, ser irónico"

Eu tinha percebido. E não era ao seu comentário que me referia.

João Lisboa said...

"Suponho que os amigos que usaram os sombreros..."

Se só consegue retirar essa conclusão, desisto.

João Lisboa said...

Já agora: https://lishbuna.blogspot.com/2019/07/i-think-important-part-is-to-retain.html

João Lisboa said...

E esta também tem muita graça: https://lishbuna.blogspot.com/2021/05/a-partir-do-solo-pelo-meio-dos-anos-90.html

João Lisboa said...

... e ainda aqui: https://lishbuna.blogspot.com/2021/05/sequencia-daqui-nao-foi-unica-vez-em.html

Kid N said...

É que há quem ache que quando se fala na terrível AC que se quer dizer “um português não pode tocar bossa nova” ou qualquer coisa do género. E nunca foi isso.

Pessoalmente, acho que aqueles que acham muita graça parecerem-se com A, B ou C, deviam parecer-se mesmo. Ou seja, toda a gente devia achar que eles eram mesmo A, B ou C, e tratá-los como habitualmente.

Kid N said...

Eu acho piada que eu falei em música negra actual, e saem-me com os Rolling Stones e os Led Zeppelin. Para mais esclarecimentos, nomeadamente de que o problema nunca esteve no facto de serem influenciados por certas músicas, ver em baixo

João Lisboa said...

"quando se fala na terrível AC que se quer dizer “um português não pode tocar bossa nova” ou qualquer coisa do género. E nunca foi isso"

Foi, então, o quê?

Daniel Ferreira said...

Toda a sua intervenção é uma fuga para a frente baseada em ideias vagas. Conviria passar a factos e argumentos.

«É que há quem ache que quando se fala na terrível AC que se quer dizer “um português não pode tocar bossa nova” ou qualquer coisa do género. E nunca foi isso.»

Na verdade, essa é a bitola mínima para um acto ser considerado apropriação cultural. Recorda-se da recente polémica sobre uma poeta negra insignificante que achou que só devia ser traduzida por negros?

Mas se diz que nunca foi isso, então foi exactamente o quê? Pode explicar de forma inequívoca?

«Pessoalmente, acho que aqueles que acham muita graça parecerem-se com A, B ou C, deviam parecer-se mesmo. Ou seja, toda a gente devia achar que eles eram mesmo A, B ou C, e tratá-los como habitualmente.»

Tratá-los como habitualmente para quê? Sofre da mentalidade da praxe? Já ouviu falar em abstracção?

Até que ponto sugere que um homem vá se se quiser disfarçar de mulher no Carnaval?

Até que ponto sugere que um actor vá se não for judeu mas pretender representar um? Mas no cinema ou no teatro, não sabemos de antemão que estamos perante actores? E se o papel for o Rei Lear?

Ou, visto de outro ângulo, porque é que alguém que queira imitar o Miles Davis num concerto tem de sentir a necessidade de se parecer fisicamente igual a ele? E o Miles Davis já morreu. Quer dizer que ninguém se pode fazer passar por ele. Portanto, ninguém pode imitar o Miles Davis. É isso? Se não é isso, é o quê?

Se não é um ângulo nem outro, então qual é o ângulo afinal? Pode explicar?

E se os exemplos que eu referi não vão ao encontro do que quis dizer, então o que é que quis dizer exactamente? É capaz de explicar de forma totalmente esclarecedora?

Em suma, é capaz de dizer algo sem andar às voltas e multiplicar as questões em vez de elucidar a primeira? Ou seja, o que é isso afinal de música negra? Os brancos podem ou não cantar hip hop? Se não podem, consegue explicar de forma inequívoca porque é que não podem? E se a questão não é essa, então o hip hop não é música negra, mas fez parte da sua lista.

E isto, é admissível? https://www.youtube.com/watch?v=_OqiEmgnBpQ

Por favor, explique-se de uma vez por todas!

Kid N said...

No link https://lishbuna.blogspot.com/2016/10/apropriacao-cultural-debussy-pagodes.html que pôs vejo exemplos que foram realmente considerados, e outros que são especulação. Quem sabe a divisão não está precisamente aí. Entre usar sombreros e igloos, porque sim, e fazer música/arte que nasce de influências e contactos e trocas culturais.

João Lisboa said...

"exemplos que foram realmente considerados, e outros que são especulação"

Quais?

Kid N said...

A confusão claramente não está na minha cabeça.

“ Recorda-se da recente polémica sobre uma poeta negra insignificante que achou que só devia ser traduzida por negros? ”

Recordo. Não sou entendido em poesia, por isso não comento. Nem sei o quão insignificante ela é. Mas vamos usar o exemplo do hiphop. Pode ser feito por brancos? Óbvio que sim. Inclusivé há milhares de colaborações entre rappers negros e brancos. Uma delas é bastante bem sucedida (Run The Jewels). Agora, deve um rapper branco usar a n-word? Deve fazer covers de canções que falam explicitamente da vida e condição negras? Aí a coisa muda de figura.

“ Tratá-los como habitualmente para quê? Sofre da mentalidade da praxe?”

Aqui, claramente não percebeu. Eu digo que quem acha muita piada à Blackface, por exemplo, devia sentir na pele o tratamento que um negro infelizmente ainda recebe na sociedade, por parte de muita gente e instituições. Podia ser que aí deixasse de achar tanta piada.

Ja o Miles? O Miles, o Coltrane, e tantos outros já foram homenageados por músicos de N etnias. Veja o exemplo que dei do hiphop, transponha para o jazz, e conclua. Eu se tocasse jazz, não ia pôr um dashiki no corpo, e dizer que tinha uma nova Arkestra. Também não vou dizer que sou o Fela Kuti, mas o Ginger Baker tocou e colaborou com o Tony Allen, e aprendeu muito com ele. Música negra nunca quis dizer tocada só por e para negros. Mas o papel da criatividade e cultura negras na sua fundação e criação deve ser reconhecido, e não apagado da história, como no passado quase aconteceu com os pioneiros do rock. Veja-se, por exemplo, o esforço recente feito para reconhecer o papel dos pioneiros de Detroit na criação do techno.

Apropriação cultural não é, em suma, uma mera questão de divisórias ou fórmulas. Eu dou exemplos, como os que dei acima, porque não tenho uma fórmula clara para fornecer. Andar mascarado de estereótipos de mexicano, árabe, chinês, etc, entra no campo da falta de respeito. Perguntou-me sobre andar vestido de mulher no Carnaval. Pessoalmente, acho o mesmo que acho sobre a blackface, embora esteja disposto a debater isso.

Mas se é uma fórmula que diga que é se A+B+C, duvido que exista.

Kid N said...

Os musicais sobre os quais perguntou “será que seriam”

João Lisboa said...

"o papel da criatividade e cultura negras na sua fundação e criação deve ser reconhecido, e não apagado da história"

Evidentemente. Mas do que se trata é da territorialização/privatização "étnica" de formas de expressão: se não fores negro/chinês/índio/esquimó/mexicano... hands off!... isto não te pertence!

Music lover said...

Kid N,
A questão da negritude na música é inequívoca, sabemos, julgamos saber, as suas origens mas a partir de uma certa altura já não damos conta do recado - qual o verdadeiro RAL de cada música?
Sobre o travestismo do que quer que seja, qual é o problema? Desde que seja interessante. Se faltar ao respeito, melhor ainda.

Kid N said...

Acho que já fui claro sobre o que penso sobre essa falta de respeito, e o que aqueles que a praticam deviam sentir

Kid N said...

Prefiro ilustrar um caso em que a questão da pertença se evidencia, a meu ver:

https://youtu.be/xDzW3Acu748

Mas há muitos casos, como disse, e dei exemplos, em que julgamos que a AC se aplica, e não é o caso.

Music lover said...

"Agora, deve um rapper branco usar a n-word? Deve fazer covers de canções que falam explicitamente da vida e condição negras? Aí a coisa muda de figura."

Creio que disse tudo. Desde quando é que o n-word ou xyz-words são propriedade de alguém?
E o que é isso da condição negra?

Daniel Ferreira said...

«Recordo. Não sou entendido em poesia, por isso não comento. Nem sei o quão insignificante ela é.»

Eu não pedi a sua opinião sobre poesia, mas sobre a exigência da poetisa em ser traduzida por uma negra. Como, de resto, bem entendeu. O que estava em causa era a alegação por parte da poetisa de apropriação cultural, portanto é legítimo pedir a sua opinião. Exemplo mais recente e melhor para lhe permitir elucidar a sua posição, será difícil de encontrar.

«Agora, deve um rapper branco usar a n-word?»

Se estamos a falar de posse cultural de certas palavras, então os negros nem sequer estariam autorizados a falar inglês ou qualquer outra língua ocidental. Muito especificamente, a palavra «nigger» foi inventada por brancos, portanto com que direito se apropriam dela e proíbem os brancos de a utilizar?

Um negro português pode referir-se a um inglês como «bife»?

Abordemos o outro ângulo: Sendo «nigger» uma palavra pejorativa, porque é que os rappers o usam tanto? Provavelmente porque, nesse contexto, a palavra não seja pejorativa, mas seja antes o equivalente a «companheiro» ou «camarada», portanto não haverá um motivo para que um branco não a possa usar. Se não é assim, então como será?

«Deve fazer covers de canções que falam explicitamente da vida e condição negras? Aí a coisa muda de figura.»

Porque é que muda de figura? Pode um ateu dirigir, tocar ou cantar uma cantata de Bach com a mesma emoção de um católico fervoroso? Ou o Messias de Händel? Que tem África a ver com a ópera Tristão e Isolda para que Jessye Norman a cante? Que tem Denzel Washington a ver Aragão para interpretar o Don Pedro no Much Ado About Nothing, de Kenneth Brannagh?

«Aqui, claramente não percebeu. Eu digo que quem acha muita piada à Blackface, por exemplo, devia sentir na pele o tratamento que um negro infelizmente ainda recebe na sociedade, por parte de muita gente e instituições. Podia ser que aí deixasse de achar tanta piada.»

Percebi, e muito bem. Como eu dizia, mentalidade da praxe. Encontre as diferenças, se conseguir: «eles foram estudantes e sofreram; tu, se quiseres fazer-te passar por estudante [ou ser um], também tens de sofrer, senão não sabes o que é ser um».

«Eu se tocasse jazz, não ia pôr um dashiki no corpo»

Um branco pode usar rastas? Um negro pode usar um fato? Uma farda do exército? Um bikini? Um panamá? Uns sapatos de ténis? Um relógio de pulso? Um telemóvel? Uma pistola? Quando a maioria destas coisas foi inventada, nem sequer passava pela cabeça dos seus autores permitir que um negro a utilizasse.

«e dizer que tinha uma nova Arkestra.»

Pode um negro londrino falar cockney? Pode um branco angolano expressar-se no crioulo da sua terra?

«Mas o papel da criatividade e cultura negras na sua fundação e criação deve ser reconhecido, e não apagado da história»

Ainda existe alguém no planeta com a opinião contrária?

«Andar mascarado de estereótipos de mexicano, árabe, chinês, etc, entra no campo da falta de respeito.»

Porquê? Um negro não tem a legitimidade de se mascarar como um branco e gozar com os seus estereótipos? E os portugueses não têm o direito de se mascarar como franceses e gozar com os seus estereótipos?

«Perguntou-me sobre andar vestido de mulher no Carnaval. Pessoalmente, acho o mesmo que acho sobre a blackface, embora esteja disposto a debater isso.»

O problema é que, ao fim de tantas páginas escritas, continuo à espera de argumentos. Como se viu, tudo o que disse só me levou a colocar ainda mais questões.

alexandra g. said...

Apre!, Que salada!!!
Parece uma competição de referências pessoais...
Só tenho a declarar que não, o termo Nigger, aliás, Nigga, não constitui ofensa para muitos pretos/negros (em PT há quem prefira o termo Preto, de resto). Pode mesmo, aliás, ser motivo de enorme orgulho (pertença) para quem se está nas tintas (nós, somos brancos? - e por aí adiante...).
A minha mai' nova é nigga, por exemplo, desde a puberdade. E, como a minha mai' velha, grande e eclética melómana.
Tenho dito.

nickname only drake said...

Pode apagar o meu comentário ? :-)

Kid N said...

Algo que eu nunca saberei exatamente o que é, pois não sou, pelo menos aos olhos tugas, negro. Embora viva noutro país há 9 anos.

Mas milhões de homens e mulheres negros dizem existir. Quem sou eu para duvidar? Quem sou para questionar o facto de a palavra usada por certas pessoas os ofender? Sobretudo qdo o porquê já foi explicado tantas vezes.

Kid N said...

“ Muito especificamente, a palavra «nigger» foi inventada por brancos, portanto com que direito se apropriam dela e proíbem os brancos de a utilizar? ”

“It’s our word now, and you can’t have it back”, Ice Cube. Vejo aí muita raiva contra os negros. Devia tratar disso. Diga-me um único exemplo em que a N-word tenha sido usada por um branco para se referir a um negro, sem ser pejorativamente? Porque havia de ser aceite?

“ Porque é que muda de figura?”

Nao sou adepto dessa “liberdade”. Sofrer racismo na pele não se adivinha. Não se especula como é. Podemos empatizar, podemos protestar, podemos defender as vítimas do mesmo. Saber como é, não sabemos.

“ Encontre as diferenças, se conseguir: «eles foram estudantes e sofreram;”

Os estudantes foram escravos? A diferença é tão óbvia que começo a achar que isto é piada.

“ Quando a maioria destas coisas foi inventada, nem sequer passava pela cabeça dos seus autores permitir que um negro a utilizasse.”

Tenho muita pena deles.

“ Pode um negro londrino falar cockney? Pode um branco angolano expressar-se no crioulo da sua terra? ”

Sim e sim.

“ Um negro não tem a legitimidade de se mascarar como um branco e gozar com os seus estereótipos? E os portugueses não têm o direito de se mascarar como franceses e gozar com os seus estereótipos?”

Um português que se faça passar por francês de forma a não se saber a diferença, não vai sofrer discriminação. Um branco que se mascare de negro de forma a não se saber a diferença, vai.

Sim, houve mais questões. E é bem claro de onde elas nascem. De uma atitude “Quero poder dizer n****r, e os pr***s que se ofenderem que se fodam”

Music lover said...

"Pode um ateu dirigir, tocar ou cantar uma cantata de Bach com a mesma emoção de um católico fervoroso?"

Pode um arquitecto ateu desenhar uma igreja?
Pode, o Arquitecto Siza Vieira fê-lo magnificamente na Igreja de Marco de Canaveses!

Daniel Ferreira said...

Caro Kid N:

À falta de argumentos, recorre a manobras de diversão, pelo que estes serão os meus últimos comentários.

«“It’s our word now, and you can’t have it back”, Ice Cube.»

Argumento de autoridade inconsequente. O Ice Cube tem tanta legitimidade para dizer isso como qualquer outra pessoa tem razão para dizer o contrário.

«Vejo aí muita raiva contra os negros. Devia tratar disso.»

Sofisma. E tolice.

«Diga-me um único exemplo em que a N-word tenha sido usada por um branco para se referir a um negro, sem ser pejorativamente?»

Sofisma. A questão inicial não era essa. E o seu pedido é absurdo, porque só poderia ser provado por omnisciência.

«Sofrer racismo na pele não se adivinha. Não se especula como é. Podemos empatizar, podemos protestar, podemos defender as vítimas do mesmo.»

Sofisma. Em vez de responder às perguntas que fiz (que são analogias perfeitamente válidas e responderiam à pergunta), distorce o foco da questão. E esquece-se que o racismo é um fenómeno universal e que qualquer pessoa pode ser vítima de racismo no contexto apropriado.

Portanto:

«Saber como é, não sabemos.»

Fale por si.

«Os estudantes foram escravos? A diferença é tão óbvia que começo a achar que isto é piada.»

Sofisma. A escravatura do passado não tem qualquer relação com a discussão da legitimidade do blackface ou da discriminação dos negros no presente. A não ser, claro, que o consiga demonstrar.

E o facto de ter invocado a escravidão de forma tão gratuita e simplória exige alguns esclarecimentos:.

1) Nem todos os negros que sofrem de discriminação no presente são necessariamente descendentes de escravos.

2) A escravidão do passado não legitima ou deixa de legitimar o sofrimento presente. Não existe sofrimento colectivo herdado de há séculos, como não existe culpa colectiva herdada de há séculos. Essa gente já está toda morta e já passou demasiado tempo. As tropas napoleónicas cometeram imensas atrocidades na Península Ibérica e não se vê ninguém a fazer choradinho contra os franceses. Fora tudo o resto que se passou aqui e por esse mundo fora desde o início da escravidão (que precede ao início da civilização). Aliás, temos coisas igualmente vergonhosas na Europa numa época bem mais recente.

3) À parte talvez alguns grupos populacionais altamente isolados do mundo exterior, é quase impossível encontrar neste planeta uma etnia que não tenha escravizado ou sido escravizada no passado. Para dar um exemplo entre muitos possíveis, no início do século XX o império Otomano ainda estava cheio de escravos europeus, incluindo portugueses e descendentes de portugueses.

4) Há negros que são descendentes de escravos e negros que escravizaram outros negros, quer para os manter a servir localmente quer para os vender, sobretudo aos árabes e europeus, durante séculos. Sem essa venda, o intenso tráfico de escravos para a América não teria sido possível. A maioria desses escravos era capturada em raids ao interior do continente, onde os europeus só começaram a entrar nos finais do século XIX e inícios do século XX.

5) Ainda há etnias em África que são tradicionalmente escravas de outras.

6) A origem da palavra «escravo» está relacionada com a escravidão na Europa bem antes dos descobrimentos.

7) Quando as quase inexistentes revoltas escravas levaram à fuga de grande número de escravos, estes criaram sociedade baseadas na escravidão porque era essa a realidade que conheciam. As revoltas tinham como objectivo a liberdade, não o fim do sistema escravista. A visão abolicionista é fruto das elites europeias.

8) Os escravos livres que foram levados da América para África por brancos e fundaram a Libéria, tornaram-se imediatamente escravistas. Foi essa opressão que criou as tensões étnicas que levaram à sangrente guerra civil que se iniciou nos anos 80.

Em suma:

1) Um negro pode ser descendente de escravos ou descendente de negros escravistas.

2) Praticamente qualquer pessoa no planeta pode invocar o passado de escravização da sua etnia.

Daniel Ferreira said...

(continuação por ultrapassar o limite de caracteres)

«Tenho muita pena deles.»

Sofisma.

«“ Pode um negro londrino falar cockney? Pode um branco angolano expressar-se no crioulo da sua terra? ”

Sim e sim.»

Suponho que isso significa que posso dizer «arkestra» quando bem me apetecer.

«Um português que se faça passar por francês de forma a não se saber a diferença, não vai sofrer discriminação. Um branco que se mascare de negro de forma a não se saber a diferença, vai.»

Sofisma. Esse nem sequer era o ponto em discussão. A legitimidade para se mascarar não tem qualquer relação com a possibilidade de ser discriminado. Isso é apenas o risco de quem se mascara. Está a confundir o antecedente com o consequente.

Acresce que há pessoas que nunca confundiriam um branco disfarçado de negro com um negro. De acordo com a sua hipótese, ainda por demonstrar, isso significaria que a legitimidade do disfarce variaria consoante a pessoa disfarçada fosse ou não reconhecida como tal, o que é absurdo, porque a legitimidade é uma questão ética. Uma pessoa não pode estar e, ao mesmo tempo, não estar legitimada para se disfarçar.

«Sim, houve mais questões. E é bem claro de onde elas nascem. De uma atitude “Quero poder dizer n****r, e os pr***s que se ofenderem que se fodam”»

Sofisma. As questões nasceram da sua condenação do João Lisboa por não dar atenção à música negra (o que quer que isso seja).

Já me sinto tão enfadonho por ter de escrever ainda mais, que desisto aqui mesmo.

E por amor dos deuses, João Lisboa, veja lá se começa a dar atenção à música negra! Por sua causa, veja lá aonde esta conversa foi parar!

Daniel Ferreira said...

«Pode um arquitecto ateu desenhar uma igreja?
Pode, o Arquitecto Siza Vieira fê-lo magnificamente na Igreja de Marco de Canaveses!»

Muito obrigado. Haj alguém que me compreenda!

João Lisboa said...

"E por amor dos deuses, João Lisboa, veja lá se começa a dar atenção à música negra! Por sua causa, veja lá aonde esta conversa foi parar!"

:-)))

Music lover said...

De nada Daniel Ferreira.
Parece-me que Kid N está um pouco confuso.

Music lover said...

Caro João Lisboa,
O que é que tem andado a fazer estes anos todos?
Caro Kid N,
Os gostos, ao contrário da lenga lenga popular, discutem-se . O homem não gosta de hip-hop, de rap? E depois, qual é o problema? Nem todos gostam de bacalhau com batatas.
Caro João Lisboa,
Perdoe-me ter intercedido em sua defesa, sei que não pediu e que precisa, mas já estou a ficar farto desta porcaria do PC.