DECIFRAÇÃO DO BRASIL
“Somos mulatos híbridos e mamelucos, e muito mais cafuzos do que tudo mais, o português é o negro dentre as eurolínguas, superaremos cãibras, furúnculos, ínguas, com Naras, Bethânias e Elis, faremos mundo feliz, únicos vários iguais, Rio Canaveses (...) católicos de axé e neopetencostais, nação grande demais para que alguém engula, avisa aos navegantes, bandeira da paz, ninguém mexa jamais, ninguém roça e nem bula, João Gilberto falou e no meu coco ficou, 'quem é, quem és e quem sou? somos chineses'”. Três minutos e nove segundos após o início de Meu Coco (álbum e canção), concluído o manifesto erguido sobre a brigada de percussões de Marcio Victor (timbal, talk drums, atabaque, derbak, shake, balde, tamborim, aro, alfaia e surdo) e rasgado pelo labiríntico arranjo de sopros de Thiago Amud, Caetano Veloso não poderia deixar tudo mais transparentemente nítido: meio século depois, a explosão tropicalista permanece absolutamente actual e, se calhar, inesperadamente necessária. O precursor Oswald de Andrade já falava de como os desbravadores do futuro se achavam “perdidos como chineses na genealogia das ideias” e, no “Manifesto Antropófago” (1928), não sonhava sequer que o que propunha – “Só a antropofagia nos une. Socialmente. Economicamente. Filosoficamente. (…) Tupi or not tupi, that is the question. Só me interessa o que não é meu. Lei do homem. Lei do antropófago. (…) Queremos a Revolução Caraíba. Maior que a Revolução Francesa. A unificação de todas as revoltas eficazes na direcção do homem. (…) A idade do ouro anunciada pela América” –, com 100 anos de antecipação, fornecia munições contra todos os tribalismos identitaristas e patrulhas de vigilância da “apropriação cultural”. (daqui; segue para aqui)
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