25 September 2018

NO PASSARÁN! 


Dias antes das eleições presidenciais francesas do ano passado nas quais Macron e Marine Le Pen se enfrentavam, Marc Ribot e “um grupo de músicos novaiorquinos preocupados” – Jack Dejohnette, Mary Halvorson, Roy Nathanson, Marco Cappelli, Ches Smith – publicavam no “Le Monde” uma carta dirigida “aos nossos amigos franceses que pensam abster-se no domingo”. E alertavam: “A eleição de Donald Trump foi, para nós, um pesadelo. Escrevemos-vos porque, vendo os números das sondagens de Le Pen e ouvindo os debates acerca da abstenção, vivemos um aterrador 'déjà vu'. Esperamos que possam beneficiar da nossa experiência. Como muitos de vós, muitos de nós opuseram-se ao neo-liberalismo de Hilary Clinton e, agora, ao de Macron. Mas a cura para a opressão neo-liberal – em França, Grã Bretanha, Hungria ou EUA – não é a eleição das respectivas Frentes Nacionais. Dizemos: NO PASSARÁN! E apelamos a todos que apoiem uma Frente Popular que as detenha. (...) Não à abstenção! Não a Le Pen!” 



Por essa altura, já Ribot tinha dado início à gravação do álbum que, “cinco minutos após a eleição de Trump”, decidira ser inevitável: Songs Of Resistance 1942 – 2018. Inspirado por Liberation Music Orchestra (1970), de Charlie Haden, Sounds of the Civil Rights Movement, da Smithsonian Folkways, e tudo o que os Last Poets publicaram”, o ubíquo guitarrista da vanguarda de Nova Iorque que Tom Waits, Elvis Costello e John Zorn não dispensam pesou prós e contras – “Há muitas contradições no acto de fazer música com objectivos políticos: como agir contra alguma coisa que detestamos sem nos tornarmos iguais a ela? Porventura, iremos cometer erros mas aprenderemos com eles” –, avançou e, belissimamente acompanhado, não cometeu um único erro. Entre clássicos do cancioneiro antifascista italiano como "Bella Ciao" (esventrada por Tom Waits) e "Fischia II Vento" (transfigurada pela voz de Meshell Ndegeocello em levitação), o desfile de imprecações reorientadas para Trump na canção popular mexicana "Rata de Dos Patas" (“Rata inmunda, animal rastrero, escoria de la vida, (...) espectro del infierno, maldita sabandija, cuánto daño me has hecho”), hinos reconfigurados dos Direitos Cívicos, ou as novíssimas e magníficamente iradas "Srinivas" (por Steve Earle e Ribot) e "The Big Fool" , se Songs of Resistance, cobrindo um reportório de quase 80 anos, parece ecoar Hegel – “aquilo que a História ensina é que nunca aprendemos nada com a História” –, na verdade, dos "partigiani" italianos aos combatentes de Charlottesville, obstina-se em nunca depor as armas.

2 comments:

t. said...

Mais um belo ano. Este disco é incrível.
E o que aí vem para a semana...
https://youtu.be/nAEF_EUVa90

João Lisboa said...

E há mais...