NEUROCIÊNCIA
No último mês da campanha para a presidência norte-americana, Aimee Mann, contribuiu com uma canção peculiar para o site independente “30 Days 30 Songs”, ponto de encontro dos “musicians for a Trump-free America” (actualmente convertido em “1000 Days 1000 Songs”, segundo o Washington Post, “a playlist of songs that Donald Trump will hate”): numa demonstração exemplar do seu “sense of irony made of real iron”, "Can’t You Tell?" apresentava um Trump que, falando na primeira pessoa, confessava que apenas se candidatara pela emoção da vitória e para se vingar da humilhação que sofrera às mãos de Barack Obama, em 2011, no jantar de correspondentes da Casa Branca. Mas que, apavorado perante a possibilidade cada vez mais concreta de vir a ser presidente, terminava, suplicando: “Isn’t anybody going to stop me? I don’t want this job, my god, can’t you tell I’m unwell?”
“Unwell” é também o mínimo que poderá dizer-se do estado de espírito da maioria das personagens que, desde 1985, com os ‘Til Tuesday, e, a partir de 1993, a solo, habitam as canções de Mann. Muito em particular em álbuns como Bachelor No. 2 (2000), Lost in Space (2002), The Forgotten Arm (2005), @#%&*! Smilers
(2008), e, acima de todas, nas que escreveu para a perfeitíssima banda sonora de um dos mais devastadores filmes de sempre – Magnolia, de Paul Thomas Anderson (1999) –, cujo argumento foi, aliás, inspirado nelas. Razão pela qual não seria, de todo, um disparate supor que um título como Mental Illness designaria uma compilação/"best of" de Aimee. Afinal, é tão só o seu nono registo de estúdio que, em modo sarcástico, assume o rótulo “depressivo” que lhe foi colado mas não desiste de investigar e inventariar aquilo de que, já há 50 anos, em The Ghost In The Machine, Arthur Koestler suspeitava: fundamentalmente disfuncional, do cérebro da criatura humana pouco há a esperar senão a trágica repetição dos mesmos erros. Nas palavras e melodias de uma suprema classicista pop, isto deverá ler-se “Here we go again, it's obvious, here we go again, we've just become our worst mistakes, the rattles off two rattlesnakes, the antidote that no one takes, so here we go again”. Ou, nitidamente, já no fim da linha, “Philly thinks, and when he thinks he can't feel anymore, Philly drinks, and when he drinks, all the drunks hit the floor”.
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