VIVA MOZ ANGELES!
Na edição de 2006 do IndieLisboa, foi exibido o documentário de William E. Jones, Is It Really So Strange?, que retratava uma peculiaríssima subcultura dos subúrbios da zona leste de Los Angeles: a transbordante devoção pelos Smiths (e por Morrissey, em particular), concretizada em noites temáticas nos clubes locais, frequentadas e organizadas por milhares de jovens oriundos da comunidade “latina” de LA (cerca de metade dos 10 milhões de angelenos), sobretudo, mexicanos, que adoptaram como um dos seus o contraditório britânico de Manchester aí expatriado, criatura melancólica, ácida, petulante, desmedidamente romântica e, paradoxalmente, alegado racista "borderline". Informalmente designada como “Moz Angeles” ou “Mozlandia”, era (e continua a ser) um fluido território social e mental colectivo de simbólica cidadania transcultural, para o qual convergem marginais, excluídos, ilegais, gays, párias, alvo privilegiado de diversas agressões legislativas anti-emigração, recentemente, convertido em "bête noire" do bovino Donald Trump.
Se o filho de proletários irlandeses emigrados em Inglaterra se reinvindica de "Irish Blood, English Heart", os seus seguidores chicanos das várias Moz Krews arvoram o "Mexican Blood, American Heart" nas t-shirts que envergam durante os concertos dos Sweet And Tender Hooligans – a "tribute band" que mimetiza ao milímetro a discografia e os tiques dos Smiths –, acorrem em massa às Smiths/Morrissey Conventions e criaram o Teatro Moz, um festival de teatro inspirado pela obra de Morrissey. O amor é mútuo: Moz dedica-lhes "Mexico" (“In Mexico I went for a walk to inhale the tranquil, cool, lover's air, but I could sense the hate, from the Lone Star state… It seems if you're rich and you're white, you'll be alright”), desfralda a bandeira mexicana em palco, intitula as apresentações em LA “homecoming concerts”, incita a que ninguém vote em Trump e declara “I wish I was born Mexican”. Mexrrissey, banda de notabilidades da música popular do México, e No Manchester, álbum, eram inevitáveis: incluindo sete temas de Morrissey (dos quais, cinco são retomados "live", no registo de um concerto na Brooklyn Academy of Music), nada se perde e algo se ganha nesta exuberante conversão ao idioma dos "corridos", "mariachis" e "rancheras".
3 comments:
Penso que o "racismo" do Morrissey tem mais a ver com uma qualquer saudade por aquela Inglaterra "quaint" dos filmes dos anos 50-60. Infelizmente, isso reflecte-se numa série de declaracoes parvas sobre N assuntos. Entre os quais, os gostos musicais.
Dos gostos musicais dele nem virá nenhum mal ao mundo (também nunca achei grande piada ao reggae e isso não faz de mim racista). Já as "declarações parvas" https://en.wikipedia.org/wiki/Morrissey#Reaction_to_comments_involving_race_and_ethnicity, mesmo desmentidas e tal, não deixam de ser, pelo menos... parvas.
De "nao acho piada" até "is vile" ainda vai uma diferenca substancial. No entanto, estava mais a pensar nele aparentar ser da onda "real music with real instruments".
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