14 October 2015

ORK


Na edição de 13 de Setembro de 1982 do “New York Magazine”, a Cinemabilia, situada no nº 10 da West 13th Street, em Nova Iorque (onde, hoje, se situa a loja de roupas vintage, Beacon’s Closet), era apresentada na qualidade de livraria dedicada ao cinema a ser obrigatoriamente visitada pelos devotos das 24 imagens por segundo – em especial, devido à enorme secção de revistas estrangeiras –, “apesar dos maus modos de quem lá trabalha”. Não é provável que, nessa altura, um dos funcionários mal encarados fosse ainda William Terry Collins, aliás, Terry Ork, cinéfilo terminal, ávido por uma boa conversa, como recorda, à “Uncut”, Glenn Mercer, dos Feelies: “Tínhamos tocado no CBGB’s e o técnico de som, Mark Abel, disse-nos que estava a pensar convidar o Terry para o nosso concerto seguinte, ele havia de gostar do nosso som. Não me lembro já muito bem como correu mas surpreendeu-nos o aspecto dele: não era vulgar aparecerem muitos barbudos de cabelo comprido na cena punk. De qualquer modo, ele era um fanático de cinema e conversámos mais sobre filmes europeus do que acerca de música”.



O objectivo desse encontro era que os Feelies gravassem para a Ork Records (fá-lo-iam mas o seu primeiro single, "Fa Ce-La", acabaria por sair, em 1978, pela Rough Trade), a indie de vão de escada de Terry Ork – financiada pelos magros proventos da Cinemabilia –, ex-assistente de Andy Warhol, na “Interview”, e esteta visionário mas com pouca queda para o negócio. Foi ele quem apresentou Tom Verlaine e o empregado da Cinemabilia, Richard Hell, ao "flatmate", Richard Lloyd, sendo, assim, responsável pela primeira formação dos Television de que a Ork editaria o registo de estreia, "Little Johnny Jewel". Gravaria também o EP de Alex Chilton “Singer Not the Song”, Chris Stamey e Peter Holsapple pré-dB’s, Lester Bangs (sim, esse mesmo), Mick Farren, Marbles, e meia dúzia de outras magníficas obscuridades. “Era uma atmosfera muito boémia”, conta, agora, Stamey, “muito Rive Gauche, Rimbaud e Nerval andavam no ar”. Previsivelmente, durou só até 1979. Terry Ork, sob o nome de Noah Ford, escreveria ainda para revistas de arte, passaria três anos na prisão por fraudes várias e morreria de cancro em 2004. A caixa de 2 CD e 49 faixas, Ork Records: New York, New York, repõe a lenda em circulação.

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