03 July 2010

JUST FOR THE RECORD: ARTISTA INDEPENDENTE É ASSIM



"Recuso na sua totalidade o Prémio AICA/MC 2009 em repúdio pelo comportamento obsceno e de má fé que caracteriza a actuação do Estado português na efectiva atribuição do valor monetário do mesmo. O Estado, representado na figura do Ministério da Cultura (DGARTES), em vez de premiar um artista reconhecido por um júri idóneo pune-o! Ao abrigo de “um parecer” obscuro do Ministério das Finanças, todos os prémios de teor literário, artístico e científico não sujeitos a concurso são taxados em 10% em sede de IRS, ao contrário do que acontece com todos os prémios do mesmo cariz abertos a candidaturas. A saber: Quem concorre para ganhar um prémio está isento de impostos pelo Código de IRS. Quem, sem pedir, é premiado tem que dividir o seu valor com o Estado!

Na cerimónia de atribuição do Prémio foi-me entregue um envelope não com o esperado cheque de dez mil euros, como anunciado publicamente, mas sim com uma promessa de transferência bancária dessa mesma soma, assinada por Jorge Barreto Xavier, Director Geral das Artes. No dia seguinte, depois do espectáculo, das luzes e do social, recebo um e-mail exigindo-me que fornecesse, para que essa transferência fosse efectuada, certidões actualizadas da minha situação contributiva e tributária, bem como o preenchimento de uma nota de honorários, onde me aplicam a mencionada taxa de 10%, cuja existência é justificada pelo Director Geral das Artes como decorrendo de um pedido efectuado por aquela entidade à Direcção-Geral dos Impostos para emitir “um parecer no sentido de que, regra geral, o valor destes prémios fosse sujeito a IRS”.

Tomo o pedido de apresentação das certidões como uma acusação da parte do Estado de que não tenho a minha situação fiscal em dia e considero esse pedido uma atitude de má fé. A nota de honorários implica que prestei serviços à DGARTES. Não é verdade. Nunca poderia assinar tal documento. Se tivesse sido informado do presente envenenado em que tudo isto consiste não teria aceite passar por esta charada. Nunca, em todos os prémios que recebi, privados ou públicos, no país ou no estrangeiro, senti esta desconfiança e mesquinhez. É a primeira vez que sinto a burocracia e a avidez da parte de quem pretende premiar Arte. Não vou permitir ser aproveitado por um Ministério da Cultura ao qual nunca pedi nada. Recuso a penhora do meu nome e obra com estas perversas condições. Devolvo o diploma à AICA, rejeito o dinheiro do Estado e exijo não constar do historial deste prémio".
(Paulo Nozolino,1 de Julho de 2010, aqui)

(2010)

35 comments:

Unknown said...

Já gostava do Nozolino, agora passo a admirá-lo com esta decisão.

H said...

Pobre e mal agradecido. Coma moscas. É o artista do portugalinho, concerteza. Umbigo enorme, génio pequeno.

H said...

É que isto é mesmo aberrante e infantil: o gajo recebe um prémio monetário que ele próprio sublinha não pediu e o caralho vem agora dizer que não o quer por menos 10. Porra, nem que fossem 20 euros eram bem-vindos.

E caro João se me permites às vezes tens/dás uns acenos que me espantam. Encantou-te a atitute infantil do gajo?

H said...

Desculpa, percebi agora o "artista independente" (não tinha visto as aspas e o link).

:)


Ok, merda na mesma para ele então. Adiante.

João Lisboa said...

Quem não percebeu nada fui eu...

Caro/a H, releia primeiro com atenção e, depois, diga qualquer coisa que faça sentido.

Rui Gonçalves said...

Independente e corajoso, sim. Mas um pouco tonto também. Enfim, a forma como abordou a questão é própria de um adolescente tardio...

João Lisboa said...

"a forma como abordou a questão é própria de um adolescente tardio"

Porquê?...

E, contudo, é "Independente e corajoso"?...

Mas também "tonto"?...

Rui Gonçalves said...

Pois. Um bocadinho de bom senso não fazia mal ao artista. Sentir-se ofendido porque lhe pedem uma certidão?! Coitadinho. Também não vejo onde está o problema de pagar imposto sobre o prémio recebido, mas esta malta julga que vive num mundo à parte. E, já agora, também não era preciso tanto espectáculo e protagonismo. Ora, há coisas bem mais preocupantes neste "país de merda"! Enfim, se há quem aprecie o género...

João Lisboa said...

Mas onde está a falta de bom senso?

Sem ter concorrido a ele nem ter feito nada para que lhe fosse atribuído, o Estado "oferece-lhe" um prémio que, ao contrário do que acontece nos que são atribuídos por concurso, é taxado em 10% em sede de IRS. Para além disso, são-lhe exigidas certidões actualizadas da situação contributiva e tributária.

Qual a razão para a distinção entre dinheiro atribuído por concurso e dinheiro QUE NINGUÉM PEDIU e cuja iniciativa de atribuição partiu do próprio Estado?

Por que motivo(s), ao atribuir, POR SUA INICIATIVA, um prémio, o Estado exige conhecer a situação fiscal do premiado? Se isso é necessário (?) não competiria ao próprio Estado informar-se primeiro antes de atribuir o prémio? E porque não o exige aos contemplados em concurso?

Cada funcionário público, quando recebe o salário mensal, é obrigado a apresentar certidão comprovativa da sua situação contributiva? Evidentemente, não: recebe o que tem a receber, paga os impostos que deve e, se não os pagar, é, depois, punido, multado ou penhorado.

"esta malta julga que vive num mundo à parte"

O PN só julgaria que vive num mundo à parte se exigisse para ele uma situação de privilégio em relação a todos os outros. O que, como bem explica, não é, de todo, o caso. O único privilégio de que, muito justamente, gozou foi poder ter mandado o MC enfiar o prémio onde mais lhe apetecesse.

Rui Gonçalves said...

Acabou tudo bem. O artista teve os seus 15 minutos de fama, o Estado agradece a devolução do prémio; e assistimos a mais um caso em que um indivíduo não percebe que existirão sempre problemas burocráticos, não se trata de qualquer atentado ao seu bom nome.

«Qual a razão para a distinção entre dinheiro atribuído por concurso e dinheiro QUE NINGUÉM PEDIU e cuja iniciativa de atribuição partiu do próprio Estado?»

A única pergunta que fica sem resposta. Mas aí bastava dizer que recusava o prémio, e tinha toda a razão. Não precisava de vir com a conversa da "dama ofendida". Por que não tentar uma carreira com actor? Talento para o teatro não lhe falta... (O PN, obviamente).

Rui Gonçalves said...

como...

Anonymous said...

O que é importante é sempre o caso concreto: ele tem ou não dívidas às finanças?

João Lisboa said...

"Acabou tudo bem. O artista teve os seus 15 minutos de fama"

O PN não precisa para nada de 15 minutos de fama.

"O que é importante é sempre o caso concreto: ele tem ou não dívidas às finanças?"

Isso é, justamente, o que não importa: é assunto entre ele e o fisco.

Anonymous said...

"Isso é, justamente, o que não importa: é assunto entre ele e o fisco"

.. sim, mas como o fisco "pertence" ao Estado, o assunto é entre ele e o Estado.
Ele (PN) tem todo o direito em tomar a posição que tomou, mas não tem nada de heróico, salvo se efectivamente não tiver dívidas fiscais ou estas forem de valor diminuto. E não veja nisto qualquer atitude moralista: eu próprio tenho um IMI e uma coima em atraso.

João Lisboa said...

"mas não tem nada de heróico, salvo se efectivamente não tiver dívidas fiscais ou estas forem de valor diminuto"

Suponho que ainda ninguém o classificou como "herói" (seria um bocadinho ridículo, não?...). Quer tenha dívidas ou não tenha.

Tudo isso, aliás, é acessório. O que interessa é a atitude do MC para com ele e a reacção dele perante o MC. Ponto.

menina alice said...

Eu até diria que o Nozolino se deu a um trabalho grande demais. É claramente o caso de um manga-de-alpaca ignorante e cego na obediência a uma lei que provavelmente nem conhece. Estamos quase todos a ficar menos seres humanos quando escolhemos fugir da responsabilidade e da razoabilidade.

João Lisboa said...

Ou a ficar humanos, demasiado humanos.

cd said...

Cheguei tarde a esta notícia e a este post mas estou estupefacto com as reacções nestes comentários...
Há qualquer coisa de inquietante na forma como a normalização e a padronização se encontra com a ditadura do comportamento; qualquer coisa como: se alguém não se comporta como nós o faríamos é porque quer ser 'mais do que os outros' - como alguém que seja justo incomoda os que, não mesmas circunstâncias, não o seriam...
O desprezo pelo 'artista', diferente (lá está o carimbo: 'independente' a soar como um insulto), que não bebe da mesma teta e não é igual aos outros porque recusa prémios, para mais um prémio que o reduz a um mero produto burocrático, é um fenómeno contagiante e muito totalitário; torna-o, aliás, ao 'artista' - diferente, independente, como se atreve?! -, um problema a abater...
Parece que a dignidade de se recusar um prémio agride a mediocridade, normalmente predadora, daqueles que salivam por oportunidades equivalentes e seriam incapazes da mesma postura...
É uma pulsão violenta e assustadora, vem nos livros e normalmente não acaba bem... Este ranger de dentes em surdina raramente se dirige aqueles que, por muito, muito mais, usurparam ao estado o dinheiro de todos em troca de nada - muito para além de qualquer imposto. Paulo Nozolino até está a devolver dinheiro... Mas - qual é o problema? Percebo que se possa ser indiferente, encolher os ombros... mas por que há-de isso enfurecer um ser vivo?

João Lisboa said...

"É uma pulsão violenta e assustadora, vem nos livros e normalmente não acaba bem"

Exactamente.

ND said...

Discordo um bocadinho. Independente seria recusar o prémio só pelo prémio (ainda por cima, se bem entendi, vem do Ministério da Cultura, bastava isso)antes de saber que teria que pagar imposto. Isso, sim. Assim fica-se com a ideia de que é mais um daqueles portugueses que diz que paga muito de impostos e a esses eu digo sempre, (mais ou menos à Herman) isso queria eu: pagar muito, mas mesmo muito, muito.

ND said...

e o Nozolino que me perdoe que eu não o conheço e estive práqui a formular juízos...

ND said...

estive a ler depois os comentários.

cd, o problema parece-me ser Nozolino devolver o dinheiro porque tem que pagar imposto e apresentar uma certidão de não dívida para o receber. E isto é o que qualquer cidadão honesto tem que fazer perante o estado se receber do mesmo algum valor extraordinário. No meio disto tudo só acho que ele tem razão (e tem mesmo)quando se compara aos que recebem prémios isentos de imposto se concorrentes aos mesmos.

E é óbvio que me repugna (isso, sim) quem usurpa e não paga impostos e ainda mais todos os prémios não revelados/contabilizados.
Aliás, a gestão que é feita com os meus - e de todos- meus impostos (no geral) deixa-me à beira de um ataque de nervos se penso nisso.

João Lisboa said...

"Independente seria recusar o prémio só pelo prémio (ainda por cima, se bem entendi, vem do Ministério da Cultura, bastava isso)antes de saber que teria que pagar imposto"

A caríssima moura desculpar-me-á (é agudo ou grave? nunca sei...) mas não vejo problema nenhum em aceitar um prémio que nos cai, inopinadamente, no colo, sem termos mexido uma palha para que nos fosse atribuído. É assim uma coisa como o euromelões.

A questão dos impostos vem depois. Com mais um detalhe em que, só voltando a ler, reparei: "o preenchimento de uma nota de honorários, onde me aplicam a mencionada taxa de 10%". O que, como explica o PN, "A nota de honorários implica que prestei serviços à DGARTES. Não é verdade. Nunca poderia assinar tal documento".

Ou seja, o tal IRS incidiria sobre algo que nunca existiu - a prestação de serviços à DGARTES - para disfarçar o que, por causa de um beco escuro legal qualquer, não pode ser considerado como "prémio".

É, realmente, o chamado "tirem-me daqui!".

João Lisboa said...

"Aliás, a gestão que é feita com os meus - e de todos- meus impostos (no geral) deixa-me à beira de um ataque de nervos se penso nisso"

Tinha-me escapado este pormenor. "À beira de um ataque de nervos" é a versão benigna. Tenho momentos de me ver a sair para a rua, de Kalashnikov na mão, pronto a assaltar o palácio de Inverno. E com rios de sangue a correr pela calçada.

:)

ND said...

"mas não vejo problema nenhum em aceitar um prémio que nos cai, inopinadamente, no colo, sem termos mexido uma palha para que nos fosse atribuído. "

Vê-se logo que nunca recebeste telefonemas com pessoas do outro lado da linha a quererem oferecer-te serviços de mesa, talheres de prata, aparelhos auditivos... se eu recebesse uma notícia dessas a primeira coisa que perguntava era: sim, e querem que eu retribua a fazer o pino, a escrever um epitáfio generoso, a admitir algum crime que não pratiquei, ou o quê?


resumindo [e eu percebi isto desde o início, mas não resisti ao pré-conceito dos "independentes" e dos "ingénuos" :-)] a tal DGARTES em pleno acto pomposo de entrega de prémio devia ter anunciado que o valor do mesmo era de 8 mil e qualquer coisa. Ponto.

ND said...

ao pré-conceito - meu - sobre os "independentes" e "ingénuos".

João Lisboa said...

"Vê-se logo que nunca recebeste telefonemas com pessoas do outro lado da linha a quererem oferecer-te ..."

Não recebi? Claro que recebi. Duram, em média, 2 segundos: "Não, obrigado, boa tarde" (também pode ser "bom dia" ou "boa noite"). Sou o terror dos call-centers. Suspeito que já deve haver um prémio chorudo para quem conseguir apresentar a minha cabeça como troféu.

cd said...

Caríssimo/a N,
entendo os seus argumentos - e também acho que, idealmente, e à semelhança de outros exemplos bem reconhecidos (não muitos, é certo, mas também quase sempre vistos com desconfiança pelos convictos dos golpes publicitário e seguros das conspirantes segundas intenções...), se alguém quer recusar um prémio deve fazê-lo à partida...

Agora, também entendo como coisa legitimamente óbvia que alguém o aceite, inicialmente, mas recuse depois de perceber o embrulho que traz, como é o caso... Não encontro aí nenhuma incoerência; o que encontro é, por parte de quem dá, qualquer coisa de mesquinho e sopeiro - nisto tudo - e parece querer colocar o premiado na condição de pedinte - num prémio para mais a que nem sequer concorreu.

Não creio de todo que o problema esteja em pagar ou não pagar impostos (até porque quero acreditar que Paulo Nozolino os pague em muitas outras e variadas circunstâncias sem que daí retire nenhum protesto público); parece sim que está no processo, no modo, no tom; na intromissão e na postura paternalista e invasora de quem o dá.

Imagine que um familiar, a quem nada pediu e nem sequer convidou, lhe oferece uma camisa pelo seu aniversário mas depois exige-lhe ficar com uma das mangas e ainda por cima quer que prove com certificado oficial que tem o número de pescoço adequado ao colarinho da camisa e finalmente que prove que a merece comprometendo-se a estar presente na próxima reunião familiar, o natal todos juntos em casa de um dos tios...

Quer dizer, perante isso, o que é que lhe diria para fazer à camisa?
Não lhe parece?

menina alice said...

Porque se se concorresse havia condições e nessas condições, muito legitimamente, constaria a regra que determinaria que, para receber o prémio, o concorrente teria de ter a sua situação fiscal e social em dia (ou, não a tendo, a DGARTES reteria e entregaria à entidade credora os 25% do valor do prémio, como a lei estipula). Mas o Nozolino não concorreu. E, repito, porque sei do que falo, foi um chico-esperto ou um néscio qualquer que tratou de maneira igual um caso diferente. Aqui o que haveria a fazer era pedir desculpa e transferir-lhe o guito todo do prémio e fim de papo.

João Lisboa said...

"porque sei do que falo"

Dále!

Rui Gonçalves said...

«Ao abrigo de “um parecer” obscuro do Ministério das Finanças, todos os prémios de teor literário, artístico e científico não sujeitos a concurso são taxados em 10% em sede de IRS»

1 - Não vale a pena chover no molhado, mas queria apenas sublinhar que não se trata de um parecer obscuro do MF. O CIRS diz expressamente, salvo erro no art. 12.º, que só os prémios sujeitos a concurso público não são sujeitos a tributação. Discordo da norma, mas o fundamento está no combate à fraude fiscal. Evita-se assim atribuir a título de prémio qualquer tipo de remuneração paga ao sujeito passivo, com o fito de "aldrabar" o Estado. Infelizmente paga o justo pelo pecador. Melhor seria tributar qualquer tipo de prémio (sobretudo os que são atribuídos escandalosamente aos futebolistas em Europeus e Mundiais). Quanto aos 15 minutos de fama, a realidade é esta: os meus colegas de trabalho só conhecem o PN por causa do "não-prémio" e o "Provas de Contacto" nunca falou do seu trabalho. Apenas o trouxe à colação por causa de se ter recusado a receber o prémio.

2 - Embora discordando do João Lisboa dá gosto ver um "adversãrio" leal e que tem paciência para explicar os seus pontos de vista. Assim até apetece voltar a discordar da sua opinião...

Rui Gonçalves said...

"não são" é "não estão", naturalmente...

João Lisboa said...

"Melhor seria tributar qualquer tipo de prémio (sobretudo os que são atribuídos escandalosamente aos futebolistas em Europeus e Mundiais)"

Ai esses não são tributados?...

ND said...

"Ai esses não são tributados?..."

lá está, justifica-se empunhar a tal Kalashnikov de "goelas" bem abertas.

cd, sim, era mesmo aí que o/a mandava enfiar a camisa. :)

cd said...

N. touché. :)