Essencialmente autodidacta (embora tenha estudado violino, viola de arco, piano, orgão, harmonia e cantado no coro da Iowa School For The Blind), considerava-se "um europeu no exílio, cuja alma e coração estão na Europa, fundamentalmente um clássico na forma, conteúdo e interpretação. Sinto-me como se tivesse um pé na América e outro na Europa ou um no presente e outro no passado. Ritmicamente, sinto-me no presente, mesmo 'avant garde', enquanto que, melódica e harmonicamente estou verdadeiramente no passado. Mas o presente transforma-se em passado tal como o futuro virá a ser o presente...". É exactamente isso que a quase totalidade da sua obra, agora finalmente reeditada (até aqui, só uma miraculosa aparição na banda sonora de The Big Lebowski o recordava) documenta. Moondog (que reune Moondog, de 1969, e Moondog 2, de 1971) assinala o início registado da lenda quando este "clochard" novaioquino que frequentava os clubes de Manhattan na companhia de Charlie Mingus, Miles Davis, Benny Goodman, Buddy Rich ou Charlie Parker conseguia (como?) gravar música orquestral que, inspirando-se na "early music" da tradição europeia — cânones, "grounds", "ostinati", "chaconnes", "rounds", "passacailles", madrigais —, desde 1952, iria inspirar os, então jovens, Philip Glass ou Steve Reich. Escutando hoje este extraordinário álbum (recheado de improváveis dedicatórias e homenagens a Tchaikovsky, Benny Goodman e Charlie Parker, partituras para Martha Graham e sinfonias para mitológicas figuras como "Thor The Nordoom, Emperor Of Earth") pode descobrir-se que também Michael Nyman ou toda a "escola de Canterbury" e adjacências ainda um dia lhe deverão reconhecer uma considerável dívida
"Clandestinamente" emigrado para a Europa, sob convite da editora Kopf, gravaria, a partir de 1976, In Europe, H'art Songs e A New Sound Of An Old Instrument, colecções de deliciosas miniaturas musicais que, tanto celebravam o lançamento da sonda espacial americana Viking para Marte em "scherzi" para celesta, como inventavam valsas impossíveis, se divertiam com o "nonsense" puro daquele tipo de canções em que Robert Wyatt ou Kevin Ayers se haveriam de especializar ou combinariam o contraponto no orgão barroco da igreja de Oberhausen com desenhos rítmicos supostamente ameríndios ou com fantasias sobre a Grécia clássica. Elpmas e Sax Pax For A Sax (respectivamente, de 1991 e 1994) representariam, o primeiro, um protesto ecológico contra os maus tratos inflingidos à natureza e aos povos nativos, sob a forma de requintados cânones minimalistas para marimbas, balafones, violas de gamba, banjos e amplos exercícios de contraponto "ambiental" e, o segundo, uma magnífica e extravagante comemoração do 100º aniversário da morte de Adolphe Sax que Moondog aproveitou inventar o conceito de "ZAJAZ" — jazz em duas direcções — que lhe permitiria divertir-se com enxertos de linguagem barroca sobre matriz swing e infinitos outros vice-versas para o que contribuiriam nomes como Peter Hammil, o saxofonista de Michael Nyman, John Harle, Danny Thompson ou o Apollo Saxophone Quartet. Nunca é tarde para descobrir um "maverick" com uma interessantíssima história para contar. (2000)
5 comments:
Nunca tinha ouvido falar dele. Vou pesquisar.
e olhe que vale bem a pena.
Nem uma referência ao Tom Waits. Nem parece seu...
tenho que ouvir isto, não sei bem porquê mas lembrou-me o eden abhez.
lá vou eu ao pássaro:)
"Nem uma referência ao Tom Waits. Nem parece seu..."
Gravíssima falha. Não se repetirá.
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