"Moonstruck (Nico's Song)" (álbum integral aqui)
(sequência daqui) Ele próprio refere que, em Mercy, “houve certos parâmetros que procurei evitar, Na verdade, a maioria das canções nasceu de um certo tipo de improvisação no sentido em que eu não tinha um plano pré-determinado. Não tinha uma lista de artistas... Na altura, havia um certo número de pessoas disponíveis para gravar e procurei tirar partido delas o melhor que fui capaz. E não foi fácil”. Com a emergência pandémica a reforçar a reclusão, John Cale calcula que, nos últimos anos, terá escrito cerca de 80 canções. “Houve qualquer coisa em mim que fez clic de um modo positivo. Tive momentos de calma e também de raiva com os quais consegui lidar de uma forma que não me foi intolerável”. Esse gatilho, no entanto, tendeu a disparar sobre o eixo sombrio do mundo (“Lives do matter, lives don’t matter, wolves getting ready, they’re gonna buy more guns”, “The monster growls at you, it shakes you to your bones”), e sobre a vertiginosa aceleração do tempo à beira do desastre (“Did you realize how late it was? Later than you think”), o que determinou o modo de encarar cada instante: “Não quis realmente insistir demasiado nos aspectos de intimidação histórica. Mas vivemos um momento em que desejamos conhecer e identificar a posição de todos os malfeitores que foram surgindo e tornando as vidas de todos num inferno”.
É, talvez, um contraponto com o mal em acção que, num turbilhão de electronica malsã, ele procura na evocação de Nico (“Console me, I have come to make my peace... Don’t be afraid of this light, be afraid of this light”), em "Moonstruck (Nico’s Song)", ou dos encontros com David Bowie na noite de Nova Iorque ("Night Crawling"), em contraste imediato com a liturgia de sangue, cinzas e trevas de "Story Of Blood" (“This is the story, the story of blood, it starts in the heart, it moves all around, wakes you in the morning and brings you down”) em cujo video, Cale no papel de decano oficiante e Weyes Blood/Natalie Mering enquanto vestal de rendilhado branco, encenam um episódio de pausa súbita, brevíssimo "scratch" e retorno ao curso normal da canção. Tal como, uma noite., Rimbaud sentara a Beleza sobre os joelhos e, achando-a amarga, a injuriara, Cale não suporta viver sem aquele momento no qual desfigura a harmonia perfeita.
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