26 January 2022

NO MEIO NÃO HÁ NADA


Sob a luz incerta do nascer do dia, o "travelling" de um caminho arborizado de montanha cruza-se, de súbito, com uma estrada ao fundo da qual, nos apercebemos vagamente de um corpo deitado. "Zoom in" lento até ao instante em que se distingue a figura de um miúdo adolescente, de pijama, que se senta no chão, frente â bicicleta caída na berma. Ergue-se para observar o horizonte coberto de núvens rosadas e, como que recordando-se de algo, sorri em silêncio. Corte. No mesmo momento em que o vemos já pedalando estrada abaixo até chegar a um paraíso suburbano de relvados impecáveis, crianças felizes e MILFs reclinadas lendo Stephen King, escutamos, em empolgada orquestração, “Under blue moon I saw you, so soon you'll take me up in your arms, too late to beg you or cancel it, though I know it must be the killing time, unwillingly mine”. Entrada imediata no panteão das sequências de abertura inesquecíveis para Donnie Darko, de Richard Kelly (2001), e "The Killing Moon", dos Echo & The Bunnymen. Segundo Ian McCulloch, o argumento do filme ter-se-ia inspirado na própria canção (“Afirmei uma vez que ‘The Killing Moon’ era acerca da predestinação. O patife escreveu todo o argumento em torno disso e pagou-nos uma ninharia pela utilização da canção no filme. Podia, ao menos, ter admitido que a ideia original era nossa”, declarou McCulloch à “Louder”, em 2017) o que, se pensarmos como a figura de um gigantesco “bunnyman” é omnipresente em Donnie Darko, até nem parece demasiado extravagante... (segue)

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