07 April 2020

ASSIM SOBREVIVE-SE MELHOR


Em Março de 2013, Luke Haines escreveu uma canção de 2 minutos, “apenas com três notas, um riff imbecil e duas palavras repetidas 72 vezes: Lou Reed”. Viria a ser a nona faixa de New York In The '70s (2014). Na capa, um pastiche de Haines sobre a fotografia (por Oliviero Toscani) de Reed para Lou Reed Live (1975). Durante três anos, manter-se-ia fiel ao propósito de pintar 72 variações em torno dessa imagem, em acrílico sobre tela, que coloca à venda por 49£ cada. Em Abril de 2017, na sala de espera de um consultório médico, recebe uma mensagem de Peter Buck (ex-R.E.M.) que pretende adquirir uma delas. Por 99£. Não tendo nada a perder, aproveita o pretexto para lhe propor gravarem um álbum a quatro mãos. Buck acha piada à ideia mas responde que, naquele momento, tem a agenda demasiado preenchida e não irá ser possível. 


Quatro meses depois, porém, cai-lhe na caixa de email uma "demo" tosca de Buck com uma sequência de acordes sobre as batidas de uma "drum machine" Univox da qual Haines extrai uma melodia e um texto acerca de Jack Parsons, engenheiro e pioneiro aeroespacial, ocultista da seita de Aleister Crowley e íntimo do farsante L. Ron Hubbard, fundador da Cientologia. Nunca se haviam encontrado antes – nem se encontrariam até à conclusão das dez canções de Beat Poetry For Survivalists – mas, via-email, com a contribuição adicional de Scott McCaughey e Linda Pitmon (na verdade, Haines mais três quintos dos Filthy Friends), estava dado o tiro de partida para a materialização musical de uma “mutual admiration society”: Buck considerava Haines o melhor "songwriter" do Brit Pop e Baader Meinhof (álbum de Luke, de 1996), um clássico, e o criador dos Auteurs confessava que, para ele, só existiam três bandas: The Fall, Go-Betweens e R.E.M.. Naturalmente, Beat Poetry... é coisa singularíssima: preparem-se para canções sobre estações de rádio pós-apocalípticas que só difundem a obra de Donovan, e assistam ao desfile de Andy Warhol, Liberace, os Ramones, Jacqueline du Pré, Captain Beefheart e Maria Callas, por entre guitarras ácidas, tablas, glockenspiel e flautas de bisel. Assim sobrevive-se melhor.

1 comment:

zeromilhoes said...

Lou - L'Epée
https://www.youtube.com/watch?v=YMN668Pk4vs