“Poderia eu repetir, para Tarantino, aquilo que fiz com Sergio Leone? Seria absurdo, uma coisa ridícula, aquela música é antiga. Tarantino considera este filme um western. Não é western nenhum, é um filme de aventuras. Já passaram quase 60 anos desde que trabalhei nesses western spaghetti. As minhas ideias sobre a música mudaram. Desejava fazer algo absolutamente diferente do que tinha composto para o Leone. São coisas incomparáveis”, diz, aos 87 anos, Ennio Morricone, a propósito da banda sonora que criou para The H8ful Eight. E, sem rodeios, vai um pouco mais longe: “Ele [Tarantino] não estava à espera daquela música. No entanto, após tê-la escutado duas vezes, aprovou-a. Mas, a princípio, não a entendeu, foi um choque, estava à espera de uma coisa muito diferente. Não foi isso que lhe dei, não queria entregar-lhe algo que já conhecesse”.
De facto, se Tarantino contava com uma partitura repleta de uivos de coiote estilizados, golpes de chicote, arrebatamentos operáticos de (uma outra) Edda Dell'Orso, assobio e guitarra eléctrica à maneira de Alessandro Alessandroni ou até – como na sequência de abertura de Once Upon a Time In The West – variações sobre os 4’33”, de Cage, só poderá ter ficado desiludido. Ele que, em Kill Bill, Death Proof, Inglourious Basterds e Django Unchained, citara mais de uma dezena de vezes as obras de Morricone e que, há anos, lhe suplicava por uma banda sonora integralmente original para um filme seu, o que, afinal, recebeu foram 50 minutos de música (gravados com a Orquestra Sinfónica da República Checa) em que a única aproximação à identidade sonora dos western spaghetti são... os títulos em italiano. A saber: 50 portentosos minutos assinados pelo veteraníssimo compositor (que, sem complexos, tira o chapéu a Boulez, Stockhausen, Berio e Nono), terreno fértil para dissonâncias violentamente estridentes e rasteiras de ambiguidade tonal – incluindo a repescagem de fragmentos musicais não utilizados em The Thing, de Carpenter (1982), confessada fonte de inspiração de Tarantino para The H8ful Eight, e Exorcist II: The Heretic, de John Boorman (1977) –, em coexistência pacífica com os White Stripes, Roy Orbison e uma Jennifer Jason Leigh em modo crepuscularmente folk.
2 comments:
O The Thing é um luxo,o filme,a musica,o realizador,tudo...pensando bem vou deixar o oitavo do Tarantino para vêr daqui a dois anos.Prefiro vêr/ouvir o The Thing(com musica do Morricone,pois claro)
Uma coisa não exclui a outra.
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