Ao contrário do que refere a entrada do Bataclan na Wikipedia (versão francesa) e, em reflexo condicionado, imediatamente repetido por vários media, a vetusta sala de espectáculos de Paris, após o encerramento, em 1969, não reabriu apenas em 1983. Na quarta-feira, 15 de Abril de 1981, estava em plena actividade e, para o comprovar, existe a reprodução de um bilhete do concerto de John Cale, às 19 horas desse dia. Podem vê-lo no blog Atalho de Sons, do crítico de música, Luís Peixoto, num post de 21.02.2011. Como ele aí recorda, “Naquele fim de tarde invulgarmente ameno para a época do ano no local, o João Lisboa e eu atravessámos a cidade em direcção ao 11ème arrondissement. O destino era o número 50 do Boulevard Voltaire. O objectivo, assistir ao concerto parisiense da tournée de suporte ao recém-editado Honi soit”.
E o que vem a seguir, lido depois de 13 de Novembro de 2015, arrepia: “Ao transpor o átrio do Bataclan nenhum de nós podia imaginar o que se iria passar a seguir no palco do velho teatro. Quando 'Dead Or Alive’ e, logo a seguir, ‘Strange Times In Casablanca’ explodiram, estilhaçando acorde atrás de acorde, numa atmosfera absolutamente insana (...), foi como se todo aquele público estupefacto, ao contrário do que minutos antes imaginara, se desse conta que afinal não estava preparado para encaixar um tão violento soco no estômago. (...) Durante cerca de 1 hora, entre o piano eléctrico e a guitarra, Cale não se preocupou em fazer prisioneiros. (...) Não me recordo de nenhum [concerto de Cale] que se tenha sequer aproximado do cataclismo que o Bataclan esteve perto de sofrer naquele fim de tarde primaveril”. Em 1988, eu próprio asseguraria “ter sido esse o mais devastador concerto a que já assisti (...) pura explosão de energia que, no palco deflagrava, com origem num grupo de terroristas sonoros tendo John Cale como epicentro (...), e o que se supunha ser um clímax inultrapassável era feito esquecer pelo momento seguinte: uma viagem à velocidade da luz por um túnel negro sem abertura do outro lado”. Não, não vimos o futuro. Pela terrível razão de que, então, nenhum de nós seria realmente capaz de conceber o que, ali, poderia vir a ser um autêntico cataclismo provocado por verdadeiros e religiosamente alucinados terroristas. E continuaríamos a viver bem mais felizes assim, livres da materialíssima ameaça de um túnel negro sem abertura do outro lado, pairando sobre nós.
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