PRÉMIO CHRISTOPHER HITCHENS POP 2013
Cab Calloway - "It Ain't Necessarily So"
Não é sequer necessário ir desenterrar exemplos ao sector mais radicalmente blasfemo da metalomecânica pesada do rock para nos apercebermos de como aqueles que alertam para que a música popular é uma insidiosa arma do demo têm (do seu ponto de vista, claro) uma certa dose de razão. Podemos começar lá atrás, em 1935, com "It Ain't Necessarily So" em que os alegadamente ateus George e Ira Gershwin, na ópera Porgy And Bess, induziam as almas a duvidar do Good Book (“They tell all you children the devil's a villain, but it ain't necessarily so! The things you’re liable to read in a Bible ain’t necessarily so”). Pulando para 1972, em "God’s Song", Randy Newman dava a palavra ao Poder Supremo e obrigava-o a confessar “I burn down your cities, how blind you must be, I take from you your children and you say how blessed are we, you must all be crazy to put your faith in me, that's why I love mankind, you really need me”.
Mas, mesmo considerando a decisiva contribuição dos Monty Python para a subversiva demolição do espírito do Natal (“Fuck Christmas, it's a fucking Disney show, fuck reindeer and all that fucking snow, fuck carols and fuck Rudolph and his stupid fucking nose”), até agora, por entre muitas outras, o grau 7 do “espectro de possibilidade teísta” de Richard Dawkins (“ateísmo integral: eu sei que Deus não existe, com a mesma convicção que Jung sabe que ele existe") estava, desde 1986, inexpugnavelmente ocupado por "Dear God", dos XTC: sob forma epistolar, Andy Partridge dispara perguntas incómodas (“Did you make mankind after we made you?”), põe em causa os direitos de autor da Bíblia (“Us crazy humans wrote it (...) Still believin' that junk is true, well, I know it ain't and so do you") e remata, violentamente, com “If there's one thing I don't believe in, it's you”).
A poucas semanas dos balanços de final de ano e seis meses depois da publicação, deve dizer-se que Modern Vampires Of The City, dos Vampire Weekend, sem fazer grande escândalo, ameaça tão duradouro lugar. A refrega com o sobrenatural dá os primeiros sinais em "Unbelievers" (“We know the fire awaits unbelievers, all of the sinners the same, girl you and I will die unbelievers bound to the tracks of the train”), em "Everlasting Arms" (citação do Deuteronómio 33:27), alude ao Dies Irae e ao Aleluia de Haendel, e comenta “I took your counsel and came to ruin, leave me to myself”, mas é em "Ya Hey" que, sob a mais pura e erudita ligeireza pop (batida marcial, serpentinas de piano, baixo elástico, coros "mock-gospel", inversão de "Hey Ya" dos Outkast, citação "spoken word" de Desmond Dekker e Stones, e registo vocal-Chipmunks, no refrão, para parodiar JeováYaveh/Ya Hey), o desinteresse do suposto criador pelas suas criaturas é frontalmente desafiado (“And I can't help but think, that you've seen the mistake but you let it go, through the fire and through the flames, you won't even say your name, only ‘I am that I am’, but who could ever live that way?”) e confrontado com o falhanço (“The faithless they don't love you, the zealous hearts don't love you and that's not gonna change”). Prémio Christopher Hitchens-Pop 2013.
5 comments:
Prémio BILF 2013 para o lishbuna.blogspot.pt.
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(repartido, claro está, mas a maior parte é para aqui, pelo que a taça fica aí num canto qualquer, se assim puder ser, em nome, por exemplo, das Pussy Riot :)
Será a letra "We watched the Germans play the Greeks" na música "Hudson" uma referencia Monty Pythonesca?
BILF?... as in MILF (com B de blog)?
"uma referencia Monty Pythonesca?"
Pode ser, pode.
Isso, com B de blog (não sei quem diabos inventou o prémio mas, a oferecê-lo, é a este :)
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