AS MÁQUINAS DA ALEGRIA
Em Agosto de 2010, Ray Bradbury tinha 90
anos e Rachel Bloom 23. Mas, fiel aos seus princípios (“A primeira coisa que,
verdadeiramente, me atrai é a inteligência. E os escritores são o pináculo da
inteligência. Os actores podem ser óptimos e bonitos mas os escritores criam
mundos novos a partir de nada. O que há de mais sexy que isso? Francamente, não
entendo como é que toda a gente não namora com escritores”), Rachel – "stand-up comedian" e ex-estudante de
teatro da Tisch School of the Arts, na New York University – não hesitou em
escrever uma canção e gravar um videoclip em que, parodiando o conceito e a
coreografia de "Hit Me Baby, One More Time", de Britney Spears, dançando e
cantando nos corredores e salas de aula do colégio católico de St. Cecilia, em
Brooklyn, declarava muito graficamente a sua desmedida paixão pelo enorme autor
de literatura fantástica, suplicando-lhe "Fuck Me, Ray Bradbury". Era uma (im)puríssima
canção pop, um video impagável – Bradbury, que morreria em 2012, ainda o viu
e... aprovou – e, muito justamente, foi nomeada para os prestigiadíssimos Hugo
Awards (prémios para obras de ficção científica e fantasia) na categoria de
Best Dramatic Presentation/Short Form.
Da BD ao teatro, televisão, rádio e cinema
(Truffaut pegaria em Fahrenheit 451, a que Rachel Bloom – certamente um lapsus linguae – chamou “Fahrenheit 69”),
foram inúmeros os encontros imediatos da obra de Ray Bradbury com a cultura
popular. Que, em matéria de música, tanto passariam pelo autoexplicativo The
Cult Of Ray, de Frank Black, como por "Rocket Man", de Elton John e Bernie
Taupin, e, agora, The Machineries Of Joy, dos British Sea Power, inspirado
pela colecção de contos homónima de 1964. Yan Scott Wilkinson, compositor e
guitarrista do grupo, não espera que lhe perguntem para, espontaneamente,
confessar que “por muito que tente fugir-lhe, estou sempre a regressar a Ray
Bradbury”. No anterior Valhalla Dancehall (2011), em "Georgie Ray", juntara-o com o paladino da “common decency”, George Orwell, (“Before this day is cemented, in
memory of Ray, can we all do something, instead of pray, and it was good how
Georgie warned us, it was good what Georgie said, ‘It's kind of unbelievable
how we're not all dead’") e se, neste último álbum, a referência ao
escritor é apenas obliqua, há que saber identificá-la nos detalhes.
Por
exemplo, no video da canção título, que, instantaneamente, se deixa associar à
sequência de abertura de Donnie Darko – cujo argumento Bradbury não assinou
mas poderia muito bem tê-lo feito – e, por aí mesmo também, via-"The Killing
Moon", aos Echo & The Bunnymen, distantes antepassados desta colectividade
de Rough Traders de longo curso (dez anos de discografia), nada avessa a corais
búlgaros, dívidas estéticas aos Velvet Underground, mini-sinfonismos à la Vaughan Williams, e, em palco, "cumbrian wrestlers", cenografias
silvestres e ursos (pardos ou polares, na modalidade Ursine
Ultra-máscara-com-humano-dentro). Tudo coisas que nunca farão deles os próximos
U2 mas que, devidamente lidas – “We are magnificent machineries of joy, and
then some, you are a vision of extraordinary contortion, an athletic form of
warm distortion” – nos deveriam fazer levantar do sofá.
5 comments:
Deus está com os seus:
http://www.youtube.com/watch?v=j8ZF_R_j0OY
:-)))))))))))))))))))))
Este "Machineries" fez-me logo lembrar o "Blue Skies" dos Noah and the Whales
Nuno Gonçalves
É só uma baleia.
:-)
"É só uma baleia."
Pois é! Demorei tempo a perceber e não vi o filme :-)
Nuno Gonçalves
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