DING DONG!
Red Wedge Tour
“When England was the whore of the world, Margaret was her madam”, escreveu e cantou Evis Costello em "Tramp The Dirt Down" (sétima faixa de Spike, publicado em Fevereiro de 1989), um dos mais fétidos vómitos de ódio alguma vez vertidos por um autor pop sobre uma figura política. Invectivando Margaret Thatcher por ela, aparentemente, supor que todo o povo inglês lhe deveria estar grato, “look proud and pleased, because you've only got the symptoms, you haven't got the whole disease”, Costello enterrava o punhal até ao fundo e não pesava as palavras: “I hope I don't die too soon, I pray the Lord my soul to save, oh I'll be a good boy, I'm trying so hard to behave, because there's one thing I know, I'd like to live long enough to savour, that's when they finally put you in the ground, I'll stand on your grave and tramp the dirt down”. O fel já fermentava há muito: no rescaldo da Guerra das Falklands/Malvinas (o tal arquipélago que Adrian Mole só a custo conseguiu descobrir no mapa, debaixo de uma migalha de bolo), em Punch The Clock (1983), "Pills And Soap", sibilava ameaças, entre dentes (“The sugar coated pill is getting bitterer still, you think your country needs you but you know it never will”), e "Shipbuilding", oferecida à voz desencarnada de Robert Wyatt, era um requiem envenenado.
The Specials - "Ghost Town"
Não foi a metralha cultural pop a afastar Thatcher do poder mas Costello esteve muito longe de ser o único a quem a personagem de valquíria (do nórdico arcaico, "a que escolhe os que irão morrer") socialmente devastadora de Thatcher despertou pulsões vingadoras: em Viva Hate (1988), Morrissey, docemente, insinuava “The kind people have a wonderful dream, Margaret on the guillotine”, The Beat reivindicavam 'Stand Down Margaret', Pete Wylie e os Hefner sonhavam com 'The Day That Thatcher Dies', e os Pink Floyd, Specials, The The ou o colectivo Red Wedge (vários dos anteriores mais Billy Bragg, Paul Weller, Jimmy Somerville, Lloyd Cole e diversos outros) agitaram quanto puderam. Já na altura, contudo, Costello não tinha dúvidas: “Podemos supor que uma canção contém algum potencial de mobilização mas isso pouco significa se estivermos a cantar para um grupo de pessoas que já comunga dos nossos pontos de vista. É a forma como o fazemos que importa”.
The Knife - "Full Of Fire"
É exactamente isso que, em contexto cultural inteiramente distinto, continua, agora, a preocupar o duo sueco The Knife, que, no monumental duplo Shaking The Habitual, afirma desejar “investigar o que poderá ser, hoje, uma canção de protesto: poderá ela integrar diferentes perspectivas sobre o mesmo tema, em vez de propor uma resposta?” A realidade, porém, tê-los-á esclarecido bem mais depressa do que esperariam: a canção que, para os seus eternos opositores, celebra – com a previsível controvérsia –, o desaparecimento de Thatcher é "Ding Dong! The Witch Is Dead", da banda sonora do filme O Feiticeiro de Oz. Apressadamente reeditada no dia seguinte à morte da ex-primeira ministra, em seis dias, atingiu o 2º lugar do top de singles da BBC Radio 1. A polissemia pop ou, se preferirmos, o "détournement" situacionista, são inesgotáveis.
2 comments:
Só agora reparei no cartoon
http://lishbuna.blogspot.pt/2011/03/detournement-clicar-na-imagem-para.html
... genial!
Nuno Gonçalves
É muito bom, é.
:-)
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