07 December 2009

A REPÚBLICA ESPIRITUAL DE NORTHUMBERLAND



The Unthanks - Here’s The Tender Coming

Os Elliotts, de County Durham, são uma lenda do folk revival britânico: dinastia de mineiros do nordeste de Inglaterra – Jack, Em e os quatro filhos –, intérpretes da tradição musical do proletariado industrial, comunistas, fundaram, em 1962, o Birtley Folk Club, onde, em plena efervescência da redescoberta do baú de tesouros da música popular, gente como Peggy Seeger, A. L. Lloyd ou Ewan MacColl os foi encontrar e, como relata Pete Wood, no livro The Elliotts of Birtley, os fez chegar à rádio, à televisão e à gravação de discos. Chamemos (como já outros o fizeram) a esta atmosfera geográfica, social, musical e política que se respirava no Birtley Folk Club a “república espiritual de Northumberland” e acrescentemos que foi nela que os pais de Rachel e Becky Unthank cresceram e, mais tarde, as educaram, embaladas pelos "sea shanties" que, nos Keelers, Mr. Unthank cantava, ou pelos álbuns da série Morris On (conspiração folk-rock de Ashley Hutchings, Richard Thompson, Shirley Collins e outras cabeças coroadas do género) que animavam os fins-de-semana domésticos. Acessoriamente, esclareça-se que o apelido “Unthank” deriva da designação dos ocupantes ilegais dos terrenos "de ninguém" (os "squatters" primordiais) entre o norte de Inglaterra e a Escócia.



O que não deixa de ser belissimamente simbólico no que respeita à música das irmãs Unthank (anteriormente, Rachel Unthank & The Winterset): se a matéria sobre que trabalham é (quase) toda ela profundamente enraizada na memória das terras da Northumbria, depois de haver sido filtrada pelas assombrosas vozes de ambas e transfigurada pela requintada relojoaria dos arranjos instrumentais (para cordas, sopros, acordeão, ukulele, bandolim, marimba, autoharp e piano), pertence tanto às antiquíssimas lendas mineiras como ao idioma barroco revisto por Steve Reich, ao jazz tal como, obliquamente, Robert Wyatt o sobrevoa, ou à pop de câmara que habita as fantasias de Sufjan Stevens. A propósito do anterior, The Bairns (2007), era impossível não invocar como termos de comparação June Tabor ou o melhor de Richard & Linda Thompson, de Shirley Collins e dos Fairport Convention. A partir de Here’s The Tender Coming e de puríssimos milagres da estirpe de "The Testimony of Patience Kershaw", "Living By The Water", "Sad February" ou "Tender Coming" (em rigor, todas, da primeira à décima segunda faixa, entre tradicionais e temas de Anne Briggs, Ewan MacColl ou Lal Waterson), dificilmente se encontrará forma de não ter as Unthanks como padrão para tudo o que, na muito ampla área da folk e imediações, vier a seguir.

(2009)

3 comments:

rui g said...

Música de contágio imediato,obra-prima absoluta e (talvez) disco do ano...

RL said...

Paradoxos... Tanta "revelation" num site tão ateu! :-)

Grato. Sinto-me ignorante por só agora conhecer isto e ainda por cima aperceber-me que não nasceram ontem.

Anonymous said...

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