19 April 2009

ISTO É TUDO O QUE HÁ



John Parish & Polly Jean Harvey - Dance Hall At Louse Point

Segundo PJ Harvey, Dance Hall At Louse Point é a concretização de um projecto há muito concebido por ela e (pelo seu guitarrista) John Parish. O trabalho de composição propriamente dito coube a Parish e os textos foram da responsabilidade dela mas não se trata de uma peça conceptual, apenas de uma colecção de canções unidas por uma atmosfera comum. Ou talvez não. De facto, ao título de cada tema corresponde a enigmática indicação entre parêntesis de um local determinado (Bristol, Dorset, Tokyo, Modena, Stockholm, Washington DC) e todo o projecto foi planeado para ilustrar uma coreografia de Mark Bruce encomendada pelo Performing Arts Centre da Southbank, de Londres, que será apresentada em digressão pela Grã-Bretanha no início do próximo ano, com acompanhamento de música ao vivo executada por um quinteto onde se integrarão PJ Harvey e John Parish. Realmente importante é que Dance Hall At Louse Point opera uma perfeitíssima síntese entre a agreste rudeza das primeiras gravações de Polly Jean e a maior sofisticação "cenográfica" do anterior To Bring You My Love.



E fá-lo combinando faixas de uma candura acústica quase-folk ("Girl", "That Was My Veil"), exercícios de blues envenenados ("Rope Bridge Crossing", "Un Cercle Autour du Soleil"), poderosas explosões de electricidade ferreamente controladas "à la" Sonic Youth ("Urn With Dead Flowers In Drained Pool", "Taut", "Heela") e até uma desolada revisão de "Is That All There Is?", de Leiber & Stoller, escrita para Peggy Lee que, sobre o lamento fúnebre do orgão de Mick Harvey, destila amargamente a inesgotável capacidade do mundo para nos decepcionar ("If that's all there is my friends, then let's keep dancing, let's break out the booze and have a ball"). Curiosamente, aquilo que, desde o princípio, muitos apontavam e não era realmente evidente - PJ Harvey enquanto descendência "espiritual" de Patti Smith - torna-se, com este álbum em que a música não lhe pertence, misteriosamente plausível. No recorte de algumas composições, no grão da voz, no lirismo duro e violento. O que, por acaso, não só lhe fica muito bem como (sem qualquer contradição) a confirma na qualidade de uma das personagens cruciais da música britânica que não se resignam a coleccionar cromos das glórias passadas.

(1996)

No comments: