CATEDRAL SUBMERSA
Robert Wyatt & Friends - Theatre Royal Drury Lane,
Sunday 8th September 1974
Sempre que sou submetido ao interrogatório-tipo "Qual é o disco da sua vida?" ou, em alternativa, "Qual o melhor álbum de sempre?", invariavelmente hesito, perdido pelo meio de uma lista onde Colossal Youth (Young Marble Giants), Music For A New Society (John Cale), Songs Of Love And Hate (Leonard Cohen), Highway 61 (Bob Dylan), The Ascension (Glenn Branca), The Velvet Underground & Nico ou I Want To See The Bright Lights Tonight (Richard & Linda Thompson) vão entrando e saindo da "shortlist" à medida das circunstâncias de temperatura e pressão ou dos ângulos de incidência da luz no momento. Mais uma outra boa dúzia de candidatos se pode ainda perfeitamente perfilar, à espera de substituir algum dos anteriores mas, para além de todos esses, existem sempre dois que não arredam pé: Astral Weeks, de Van Morrison, e Rock Bottom, de Robert Wyatt.
Este último, está, entretanto, muito para além de ser apenas um favorito pessoal: segundo álbum a solo de Wyatt, após The End Of An Ear (1970) e a discografia a bordo dos Soft Machine e Matching Mole, é um daqueles momentos únicos em que, no interior daquilo a que (pouco perspicazmente) se chamou "progressive rock", a música transcendeu inexoravelmente todas as categorias. A voz e as composições de Wyatt, um colectivo de músicos reunido sob uma conjunção astral irrepetível, tocando por pura telepatia, e uma atmosfera de catedral submersa, engendraram algo que nunca antes se havia escutado e que não mais voltou a acontecer. Não é, pois, de admirar que o lendário concerto de apresentação do álbum (a 8 de Setembro de 1974, cerca de um ano depois do acidente que confinou Wyatt a uma cadeira de rodas) se tenha tornado objecto de culto, multiplicado, até hoje, em inúmeros "bootlegs". Ei-lo, então, finalmente, disponível em publicação "oficial" e só restará dizer que valeu inteiramente a espera: Wyatt, Fred Frith, Hugh Hopper, Mongezi Feza, Gary Windo, Mike Oldfield, Ivor Cutler, Laurie Allan, Dave Stewart, Nick Mason e Julie Tippetts (ex-Driscoll) obedecem à determinação bíblica "Fiat lux!" e, percorrendo a totalidade de Rock Bottom acrescentada de composições anteriores de Wyatt, oferecem-nos um dos raríssimos "live" literalmente imprescindível. (2005)
14 February 2008
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6 comments:
esta história dos raríssimos «live» imprescindíveis tem o seu quê de curioso... Vai-se ver e o José Mário Branco ao vivo é essencial, o «weld» e o «unplugged» do Neil Young também são. O «live MCMXCIII» dos Velvet, idem idem aspas aspas. O mesmo para «sabotage/live» do John Cale, para o Dylan ao vivo em 1966, o «dream letter» do Tim Buckley, o dvd «vespertine/live» da Bjork, os Mão Morta no «muller no hotel hessischer hof» (gravado ao vivo), o dvd de Van Morrison «live at Montreux 74/80», etc, etc, etc. raro + raro + raro + raro + raro + raro + ... + raro = raríssimo?!
Pois é, mas, por cada um desses, há 1000 que são um colar de bocejos.
Concordo consigo, mas isso também acontece com os discos de estúdio. E não é costume ouvir comentários do género: «um dos raríssimos discos (de estúdio) realmente imprescindíveis»... Não leve a mal.
Porque havia de levar a mal?
O problema é que há muitos bons, muito bons e óptimos discos de estúdio e, realmente, muito poucos live que não sirvam apenas para "encher" vazios entre álbuns de originais, disfarçar writer's blocks, rentabilizar duas ou três vezes o mesmo reportório, etc, etc.
Ok. É capaz de ter razão. Realmente com os registos «live» fica-se, quase sempre, com a sensação «já contribuí para este peditório». Obrigado e assunto encerrado.
Juntem lá + estes: Stop Making Sense, Europe 1993 da PJ Harvey (já que falamos de bootlegs) e Live in Tokyo de Nico. Dos Velvet prefiro o 1969 e não é pela capa, concerteza.
Manuel Carvalho
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