25 October 2007

TOM WAITS: AUTOBIOGRAFIA EM PEQUENAS PRESTAÇÕES, DITOS DE ESPÍRITO E SABEDORIA (XIX)



"O Troubadour, em Los Angeles, era o lugar certo para tocar, nos anos 70. Punham uma grande fotografia nossa na vitrine e, se esgotássemos a lotação, estávamos em grande. O nosso nome era anunciado, um foco ilumináva-nos ao pé da máquina dos cigarros e acompanháva-nos até ao palco. Doug Weston, o patrão, aparecia e declamava 'The Love Song Of J. Alfred Prufrock'. Depois, havia tipos a tripar que queriam contar histórias. Era como o programa do Ed Sullivan sem o Ed. Chegava a haver gente que viajava até lá à boleia só para estar vinte minutos em palco.

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"Houve provavelmente mais canções de Small Change do que de outros discos que continuei a cantar em concerto. Há canções que se escrevem e nunca mais queremos saber delas. Outras, cantamo-las todas as noites e continuamos a perguntar o que querem dizer. 'Tom Traubert's Blues' foi, decerto, uma das canções que mais cantei e com que encerrava os concertos.

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"Na altura em que o Francis Ford Copolla me convidou para escrever as canções de One From The Heart, já tinha decidido afastar-me dessa cena 'lounge'. Quando ele me sugeriu uma opereta 'lounge', pensei 'chegaste com dois anos de atraso'. Para mim, isso estava no fim. Tive de voltar atrás e trazer tudo de volta. Foi como estar a crescer e bater com a cabeça no tecto. As pessoas têm uma imagem de nós a partir da qual nos definem e sabem o que hão-de exigir. É complicado mudar de atitude e operar mudanças no clima. Transportamos connosco a percepção que o público tem de nós.

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"Não sei se consegui conciliar muito bem essa tensão entre canções agrestes e suaves. Apetecia-me mais misturá-las do que colocá-las lado a lado. Ou, se calhar, é como rebentar uma parede a murro e, depois, pedir desculpa, o reflexo alcoólico. Provavelmente, tem mais a ver com as festas a que ia quando era adolescente. Havia quatro ou cinco canções rápidas e, a seguir, uma mais lenta em que se convidava as raparigas para dançar. Nunca me devo ter esquecido desse ciclo musical. Os DJs também funcionam assim. Está relacionado com o ritmo cardíaco. Há canções mais rápidas que o ritmo do coração e outras mais lentas. Acho que sempre distingui as duas.

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"Para onde quer que se vá, o lugar terá de nos afectar. Em Nova Iorque, andei mais pelos clubes onde a mistura musical era maior. Em Greenwich Village, partilhava um quarto com o John Lurie e o Evan, o irmão dele. Escrevíamos canções até às tantas. O problema, quando se tem putos, é que se pode ficar a pé até às cinco da manhã mas é preciso voltar a casa para lhes dar de comer.

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"Muito do mérito em Swordfishtrombones foi da minha mulher, Kathleen. Esse disco foi o primeiro que fizemos sem um produtor externo. Foi ela que me disse que eu era capaz de o fazer. Estava convencido que era milionário e não tinha mais de 20 dólares no banco. A Kathleen ouviu os meus discos e percebeu que havia muitos géneros musicais que me interessavam e que eu nunca tinha explorado. Ela é uma DJ fantástica. Fez-me ouvir imensos discos. Foi ela quem, realmente, co-produziu esse disco. Eu andava à procura de música que se ajustasse melhor às personagens das canções em vez de as vestir todas com o mesmo fato como acontecia até aí.

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1999

(2007)

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