30 June 2025

Jarvis Cocker’s Closet Picks

 
(sequência daqui) Era uma tapeçaria musical que fundia psicadelismo, barbershop, folk, jazz, doo wop e música erudita, num painel lisérgico da história cultural americana — da Plymouth Rock ao Grand Coulee Dam. Como escreveu o "Guardian", "Se Aaron Copland, Charles Ives, George Gershwin e Duke Ellington eram génios da composição musical norte-anericana, Wilson também o era". E Lester Bangs subia a parada: "Ouvir  Smile é como, num sonho, entrar numa imensa catedral decorada com mil ícones da cultura pop americana". Mas o sonho converter-se-ia em pesadelo. Wilson tinha começado a experimentar canabis e LSD e gabava-se de ter escrito "California Girls" durante a sua primeira trip de LSD. Isso, porém, em conjunto com o excesso de trabalho e a influência perniciosa do pseudo-psiquiatra e "guru" Eugene Landy, conduzram-no a a um crescente isolamento e a internamentos hospitalares frequentes por transtorno esquizo-afectivo e perturbação bipolar. (segue para aqui)

26 June 2025

"Wouldn't It Be Nice" (de Pet Sounds, na íntegra aqui)
 
(sequência daqui) A exuberante estética de produção de Phil Spector foi também uma inspiração directa, e o seu eco pode ser ouvido com nitidez, por exemplo, em “Don’t Worry Baby” (1964), um dos primeiros momentos de transcendência emocional da banda. A saúde mental de Brian, no entanto, começava a vacilar. Sempre desconfortável em palco, sofreu um colapso nervoso durante um voo e abandonou as digressões. Livre dos terrores da estrada, mergulhou no seu universo próprio no estúdio, onde criava com uma liberdade sem precedentes, usando harmónicas, acordeões, garrafas, latas e outros instrumentos não convencionais. Era lá que se sentia feliz. Era lá que inventava o impossível. Em Pet Sounds (1966), atingiria a maturidade artística. Mas a recepção nos EUA foi morna. O projeto seguinte, inicialmente chamado Dumb Angel e depois renomeado Smile, aprofundaria tanto a sua genialidade quanto a sua instabilidade. (segue para aqui)

23 June 2025

AS VIDAS DE BRIAN
 
 
Em 1961, os irmãos Wilson — Brian, Dennis e Carl —, em Hawthorne (uma cidade a Sul de Los Angeles), com o vizinho Al Jardine e os primos Mike Love e Bruce Johnston, formaram um grupo - The Beach Boys. Se, desde o início, a influência directa de Chuck Berry era evidente (com "Sweet Little Sixteen", por exemplo, a servir de matriz para "Surfin’ USA"), foi em pouco tempo que Brian se destacou como o verdadeiro arquitecto sonoro da banda. Apesar de não ser surfista (e nem sequer saber nadar), Brian amava carros, raparigas e, sobretudo, os estúdios. Fora educado musicalmente por Roy Rogers, Carl Perkins, Bill Haley, Elvis Presley, Henry Mancini e Rosemary Clooney. Agora, encenava ali os sonhos do eterno Verão californiano, cercado pelos melhores músicos de estúdio de Los Angeles, fascinado com o poder de esculpir emoções em fita magnética. Tinha também ouvido absoluto. Mas nunca alguma vez iria ouvir as suas composições em stereo: em consequência de acidente escolar ou da brutalidade do pai, Murray, era surdo do ouvido direito. (daqui; segue para aqui)
 
Usmifka - "Danjova Mama"
 
 
(daqui + "USMIFKA (Bulgarian for 'smile' – усмивка) is a Danish women’s choir consisting of 28 talented singers. They are artistically and musically led by conductor Anne Louise Munch. Their repertoire consists mainly of Bulgarian folk music arranged for women’s choirs in the 1950s by famous Bulgarian composers such as Philip Koutev and Petar Lyondev. These arrangements became known in the West through the choir 'Le Mystère des Voix Bulgares'" + aqui)

21 June 2025

19 June 2025

 
(sequência daqui) Grande é, pois, o pasmo quando, agora, perante Instant Holograms On Metal Film - o proverbial álbum de fumo colectivo do cachimbo da paz -, se escuta as vozes de Sadier e Marie Merlet declarando "The numbing is not working anymore, an unfillable hole, an insatiable state of consumption, assigned trajectory". E, logo a seguir, "Killing the possibilities, of there being other stories, conceptualisations, of progress and development, Open are the possibilities! A deluding promise of a middle class for old times on". É verdade que ainda persistem sinais de baixa filosofia-de-redes-sociais mas, no seu melhor, é como se a banda tivesse dobrado a fita do tempo e, colando o passado sobre o presente, tivesse gerado um universo alternativo onde Magritte e Hopper - por entre Deleuze e Guattari, pulsações motorik e funk electrónico - trabalham no projecto de uma catedral Bauhaus para a Bacia de Aitken, no Sul Polar da Lua.

16 June 2025

Gwenno - "Den Heb Taves"  
(filme real. Mark Jenkin)

(ver aqui)
A FITA DO TEMPO
No ano passado, Rooting For Love apresentava-se com todos os preocupantes sintomas da obra de final de carreira: Laetitia Sadier, ao 5º álbum a solo após a separação dos Stereolab (2009), parecia desinteressar-se de vez do, até aí, fértil cruzamento entre a estética retro-futurista e o diálogo com o marxismo e o situacionismo e escorregava, ideologia abaixo, para o território das "personal politics", abeirando-se mesmo da involuntária comicidade "new age":“Smile at your spleen, inundated with light, and be serene, smile at your kidneys, lights escaping, color is blue, feel your organs smiling back at you”. Os Stereolab tinham emergido em Londres no acampamento "indie" local dos anos 90, mas, na verdade, nunca soaram como os seus contemporâneos. Se mantinham alguns pontos de contacto exteriores, estes situavam-se no pós-rock, no revivalismo do easy listening, na eletrónica experimental e na cena underground que revelou bandas como Pram, Broadcast e Plone.  (daqui; segue para aqui)

11 June 2025

Brian Wilson (1942 - 2025)

David Byrne ft. Olivia Rodrigo - "Burning Down the House"

"Grown Ups"

(sequência daqui) Na verdade - entre programas de rádio, televisão, conferências e quase-academismos afins - Jarvis nunca deixou de ter uma agenda generosamente preenchida. O que, de certo modo, é impossível não reparar neste novíssimo More que, tal como já acontecia com This Is Hardcore e We Love Life (apesar da produção de Scott Walker...), se apresenta como um sólido e, aqui e ali, impressionante trabalho de marcenaria mas nunca na qualidade de algo capaz de fazer abanar os alicerces do artesanato contemporâneo. Claro que se, apesar disso, no vaudeville de subúrbio de Hardcore..., os textos apontando sibilinamente em várias direcções não escasseavam ("I am not Jesus though I have the same initials, I am the man who stays home and does the dishes, a man told me to beware of thirty-three, he said 'It was not an easy time for me', but I'll get through, even though I've got no miracles to show you"), em More, Jarvis Cocker, Candida Doyle, Nick Banks e Mark Webber continuam a ser capazes de desenhar maravilhosos instantes de deboche ("Screwing in a charity shop on top of black bin bags full of donations, the smell of digestive biscuits in the air", 'Tina') envoltos em aromas de feira.

08 June 2025

Making America great again (XIII)! 
 

 
(sequência daqui) Tudo o que de extra-musical se lhes seguiu após os passos inseguros de This Is Hardcore (1998) e We Love Life (2001) e o longo hiato posterior tem apenas o valor da cusquice elevada ao patamar de teoria da conspiração: era Danae Stratou, mulher do ministro das Finanças grego, Yanis Varoufakis, a personagem de "Common People" ("She came from Greece she had a thirst for knowledge, she studied sculpture at Saint Martin's College, that's where I caught her eye")? Jarvis Cocker invadiu o palco dos BRIT Awards de 1996 quando Michael Jackson interpretava "Earth Song" num gesto impulsivo e irreflectido ou foi tudo minuciosamente planeado? Entregou ele ao Foundling Museum, de Londres, um saco cheio de cópias de "Romania Today", uma revista em língua inglesa de propaganda das maravilhas do regime de Ceausescu? A modelo da capa de This Is Hardcore é ou não a política e actriz russa Ksenia Sobchak? (segue para aqui)

07 June 2025

o assalto era já de aplaudir; a fuga de trotineta é simplesmente maravilhosa

05 June 2025

Pulp Later With Jools Holland 1st June 2025
 
(sequência daqui) O essencial, porém, fora assegurado: o instável grupo de criaturas que ia constituindo os Pulp mantinha-se junto (tanto quanto era possível num permanente vai e vem) e os próprios acidentes que ocorriam - por exemplo, Jarvis cair da janela de um primeiro andar quando, para impressionar uma miúda, fazia uma imitação do Homem Aranha - enquadravam-se perfeitamente nas coordenadas daquela peculiar normalidade. O que, caminhando ao longo de uma produção discográfica razoavelmente regular - Freaks (1987), Separations (1992) - lhes permitiu chegar a Intro - The Gift Recordings (1993), que, antes de His 'n' Hers (1994) e Different Class (1995), por essa altura, me obrigava a vê-los como "A banda sonora para um circo de aberrações (Individuais, domésticas, sociais)" na qual "a eufórica celebração da Grã Bretanha e da sua paisagem humana como sarjeta da moral cristã e vistoso lixo para incinerar numa colorida feira popular foi organizada por quem, pelo povo não revela um exagerado afecto. (...) Different Class (a baixa, desprezível, abjecta e orgulhosa) foi o alfa e o ómega de uma trajectória única. A escuta de tudo aquilo que o antecede pode não ser sempre exaltante mas, pelo meio do 'glamour' rasca, das lantejoulas em segunda mão e do 'chic' de saldo (isto é, Roxy Music devolvido ao proletariado suburbano), explica demasiado bem a genealogia de uma glória adiada". (segue para aqui)

04 June 2025

Já estava em muito boa altura 
de actualizar esta história
 
Edit (20:38) - ... e este senhor está a precisar de cuidados profissionais...
... ... ... e este(s) também... ... ...

03 June 2025

LIMPAR O PÓ AOS ARQUIVOS (XCVIII)

(com a indispensável colaboração do R & R)


(clicar na imagem para ampliar; ver aqui)
 
"Common People" (de Different Class na íntegra aqui)
 
(sequência daqui) À beira da desintegração por manifesto desinteresse das gentes (por essa altura, mais motivadas pelo carnaval Britpop), entra em cena Russell Senior, guitarrista e violinista, fundador da Dada Society - também conhecida como New Wave Society - na universidade de Bath (onde também desempenharia o papel de Josef K., numa encenação de O Processo, de Kafka), e activamente militante durante a greve dos mineiros de 1984 em cuja violenta Batalha de Orgreave participou. "O Russell, realmente, salvou-nos. Tinha a opinião que não deveríamos ser exclusivamente um projecto musical, que deveríamos incluir outras formas de expressão artística", conta hoje Jarvis à "MOJO". Prosseguiram, então, na qualidade de Jarvis Cocker Experience & The Wicker Players que, em diversos pubs, apresentariam The Fruits Of Passion, uma peça surrealista na qual o baterista Magnus Doyle tentava o coito com uma laranja. (segue para aqui)

01 June 2025

UMA PECULIAR NORMALIDADE
 
 
Pode dizer-se que, em boa medida, foi Russell Senior quem salvou os Pulp da extinção. Jarvis Cocker, desde os 7 anos, "por influência dos Beatles", sonhava ser membro de uma banda. E, por volta dos 14, preencheu um caderno de apontamentos com "The Pulp Master Plan": "O grupo deve insinuar-se na opinião pública criando canções pop bastante convencionais, porém, ligeiramente excêntricas", prometia o inventor dos então Arabicus Pulp, cuja estreia em palco ocorreria na Sheffield City School, em Março de 1980. Três anos depois, seria publicado o primeiro álbum, It, que, aquando da sua reedição, em 1996, me faria classificá-lo como uma "colecção de canções moldadas no idioma clássico da pop e já devidamente avinagradas por aquele tipo de ironia corrosiva que haveria de transformar-se na imagem de marca de Jarvis Cocker como 'songwriter'". Ninguém reparou. (daqui; segue para aqui)