29 December 2023

Que mil Maines floresçam! (II)
 

 
(sequência daqui) Se, há menos de um ano, no àlbum de estreia (The Mary Wallopers), o programa estético-ideológico ficara já claro - libertinagem, álcool, anarquia e desbunda -, desta vez, Irish Rock N Roll define-lhe melhor os contornos e apresenta um quase manifesto insureccional que, sobre os traços da folk irlandesa, desenha um manual abreviado da luta de classes. "Na nossa casa, havia uma saudável falta de respeito pela autoridade, fosse a polícia ou o governo. Para nós é tudo, realmente, a preto e branco: sejam eles quem forem, são os ricos que estão no poder e apenas pretendem manter-se lá e continuar a enriquecer, enquanto os pobres ficam mais pobres". Em modo sinuosamente melódico ou em desbragado galope, "Rakes Of Poverty", "Rich Man and The Poor Man", "The Idler" ou "Vultures Of Christmas", atribuem-lhe a forma de canções que, uma vez alojadas no canal auditivo, dificilmente serão removidas.
2023 - Prémio "X marks the spot"
 

26 December 2023

MÚSICA 2023 - INTERNACIONAL (III)
 
(iniciando-se, de baixo para cima *, de um total de 28)
 
 
 
 
 
  
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
  * a ordem é razoavelmente arbitrária 

“'I now live above the Arctic Circle. In the village of Kharp on Yamal. The nearest town has the beautiful name of Labytnangi', he wrote, after announcing: 'I am your new Santa Claus' and noting that he had grown a beard during the '20 days of my transportation. I am your new Santa Claus. Since I’m Santa Claus, you’re probably wondering about the presents. But I am a special-regime Santa Claus, so only those who have behaved very badly get presents. I don't say 'Ho-ho-ho', but I do say 'Oh-oh-oh' when I look out of the window, where I can see a night, then the evening, and then the night again. Well, I now have a sheepskin coat, an ushanka hat (a fur hat with ear-covering flaps), and soon I will get valenki (a traditional Russian winter footwear)'"
 TUDO A PRETO E BRANCO

 
"O meu pai era condutor de máquinas numa lixeira onde encontrou um acordeão. Apanhou-o e aprendeu a tocá-lo sozinho. Foi desse modo que tomámos contacto com a música. Foi só pegar nele e aprendermos também a tocar. Tudo muito DIY ("do it yourself"). A nossa irmã cantava baladas. Um dos irmãos ouvia 'heavy metal' e outro tinha uma rádio pirata. Escutávamos vários géneros de música - eu adorava punk - e todos bons. Não foi, de todo (felizmente!), uma introdução muito formal à música", conta à "Songlines", Charles Hendy, um terço do trio fundador dos irlandeses The Mary Wallopers. E explica também que os primeiros passos da banda obedeciam a uma estratégia bem urdida: entravam num pub, cantavam e, como pagamento, eram-lhes oferecidas bebidas. "Quando já estavam fartos de nos ouvir, saíamos e seguíamos para o pub seguinte". O que, de pub em pub, numa ampliação da pequena Dundalk natal para uma área um bocadinho maior, lhes proporcionou um método eficaz ("O único que funciona connosco") de recolha de músicas tradicionais. (daqui; segue para aqui)

"Wexford" ("My father was called the Fiddler Dunne, now I'm a fiddler too")

22 December 2023

"A prayer against 'Evil drones' is found in the pocket of a killed Russian soldier.* The text under the image says 'Prayer against the devil drone attacks'. The text on the opposite page says 'O, Saint Barbara, the great martyr and the patron, look upon us, grieving and suffering. Against evil drones, that sow death and destruction'" (daqui)
 

*... parece que não funciona...
Peter Gabriel - "Après Moi"  
(Regina Spektor)

(de Scratch My Back, na íntegra aqui; ver também aqui)
Esclarecidíssimo! Ele já se lembra de tudo: o filho do Marselfie "fez o pedido ao meu gabinete, com o objetivo de apresentar cumprimentos" (coisa formal e friamente diplomática) e, com o interesse e empenhamento próprios da função, "Deixei-o falar, simplesmente"

19 December 2023

Pussy Riot - "Swan Lake"

This song is our statement against Russian state propaganda.

 
“Forced patriotism” lessons have been introduced in Russian schools. Teachers force kids to form a Z formation to show support for the war. All over Russia, children are forced to write “letters of support” to occupying soldiers. Fifth-grader Timofey wrote that he wishes the russian military “to return home and not to kill people on foreign soil” The teacher condemned the child, he was bullied for “insufficient patriotism.” “Soldier, don’t kill people” was written by a boy, and this inspired us to write a song.

 
New history textbooks have already been distributed to high school students. To pass the exam and receive a certificate, schoolchildren must memorize propaganda — talk about the greatness of Russia, which is fighting the "fascists" in Ukraine. Children are protesting — sixth-grader Masha Moskaleva made an anti-war drawing against Russia’s invasion of Ukraine. Her single father was sent to prison for two years for “discrediting the Russian army,” and Masha was sent to an orphanage.

 
Russian state propaganda poisons people's hearts and brains with hatred. Putin's propagandists are no less war criminals than the soldiers who kill and rape the civilian population of Ukraine, or the generals who give these orders.

 
Russian authorities are holding thousands of Ukrainian children hostage. Children are kept in sanatoriums, where they are taught to love Russia, and if the children say that they miss Ukraine or speak Ukrainian, they are beaten. These children are often recognized as orphans and given up for adoption, although most have parents in Ukraine who are trying to find them and return them. Children are the most vulnerable in this war. Children should not suffer. 


We call for: 

1. immediate return of all kidnapped Ukrainian children 

2. stop poisoning children with Putin's propaganda 

3. to sanction Russian propagandists and Russian artists that serve this fascist propaganda.

18 December 2023

 
(sequência daqui) E sobre que deseja, afinal, Peter Gabriel falar-nos? Está praticamente tudo sintetizado em "i/o", a faixa-título: "So we think we really live apart, because we’ve got two legs, a brain, and a heart, we all belong to everything, to the octopus' suckers and the buzzard’s wing, to the elephant’s trunk and buzzing bee’s sting, stuff coming out, stuff going in, I'm just a part of everything, I’ll be laid to rest in a proper place, in the roots of an old oak tree, where life can move freely in and out of me". Uma espécie de panteísmo pagão serenamente eco-militante que, no vídeo que a apresenta no site oficial de Gabriel, ele desenvolve como se tivesse acabado de ler L'Extase Matérielle, de Le Clézio: "Imagino que, quanto mais velho me tornei, não terei ficado, provavelmente, mais esperto. Mas aprendi algumas coisas prestando atenção ao que escuto e observo. E, para mim, faz todo o sentido pensar que não somos aquelas ilhas independentes que julgamos ser. Somos parte de um todo. Nascemos, num piscar de olhos, do encontro entre um espermatozóide e um óvulo mas, essencialmente, somos apenas uma colecção de átomos e moléculas que absorvem e expulsam matéria. Intelectualmente também. Quando morremos, estes átomos não desaparecem, serão encaminhados para outros fins. É uma forma suave de nos encararmos como indivíduos certamente confusos mas, ainda assim, parte de um todo. Penso que o futuro tem ecos no presente e, por vezes, se estivermos atentos, identificamo-los". Em "So Much", sobre melodia e arranjo limpidamente clássicos, reflecte sobre o limitado prazo de validade de gentes e planeta ("So much unfinished business, all sticky with desire, raking through the empty shells, of all the rockets we fired, set the navigation for the Earth all warm and wet, and as the longing drops away, the compass is reset, oh, there’s so much to live for, so much left to give, this edition is limited") e "The Court" disseca o cadáver da justiça ("We lost the line between the good and bad, we lost the line between the sane and the mad, used to draw the line across the writing pad, the line of conscience that we never have had, and the court will rise, while the pillars all fall"). A linguagem é sempre elegantemente poliglota - música de câmara, art-pop, minimalista, cinemática, R&B, experimental, impressionista -, (im)puríssimo Gabriel vintage.
Não deveria ser obrigatório um teste de escrita e leitura de Português básico para ser eleito deputado? (e o "DN" está em tão mau estado que já se vê obrigado a recrutar na 4ª divisão?...)

17 December 2023

É a chamada síndrome "coitadinho do Marques Mendes"
"Pedronunismo": o covil onde se acoita a dinastia dos Césares e as nulidades da Educação, da Saúde, da Agricultura e da Habitação, as Estrelas e os Rebelos, as Canavilhas, os Ascensos, os Assis e os Cabritas, o Bardo e a guinchante Gomes, os Sousa Pinto e as Begonhas!
 

15 December 2023

... sendo que, "origami", segundo a Dona Judite, deverá entender-se como manter "relações muito próximas com diversos políticos, fornecendo-lhes estupefacientes e acesso a prostitutas e facilitando a falsificação de documentos", tudo verdadeiro serviço público essencial em que o Estado falha estrondosamente
 
(sequência daqui) De outro ângulo e duplicando o poder de fogo, Mark 'Spike' Stent e Tchad Blake contributiram com uma mistura de cada canção ("Bright-Side Mixes" de Stent e "Dark-Side Mixes" de Blake), como explicaria Gabriel, numa estratégia de fuga ao desperdício: "Em vez de escolher apenas uma mistura para publicação, decidi que as pessoas deveriam ter a possibilidade de conhecer o trabalho fantástico que ambos realizaram. O Tchad e o Spike são dos melhores na sua área de actividade e, sem dúvida, atribuem às canções um carácter diferente. O Tchad é mais um escultor, construindo uma experiência dramática e sonora. O Spike adora o som e a composição de imagens. É mais um pintor". Extra-musicalmente (ou, talvez, não) cada canção seria acompanhada de uma obra de arte visual encomendada a Ai Weiwei, Nick Cave, Barthélémy Toguo, Olafur Eliasson, Annette Messager, Antony Micallef, Henry Hudson, Megan Rooney, Cornelia Parker,Tim Shaw, David Spriggs e David Moreno. (segue para aqui)

13 December 2023

Sensacional transferência de apoios ("muitos princípios" e "muito bons" é o que é preciso, diz o Chevalier) a meio da temporada)!!!


Edit (22:22) - ... Transferência, aliás, já com tradição instituida

12 December 2023

É o que se chama 
democratização da cultura, não é?
 
(sequência daqui) 6 de Janeiro de 2023, enfim. 21 anos depois de Up, o mundo fica a saber que, começando nesse mesmo dia, em cada lua-cheia dos 12 meses do ano, será dada a conhecer uma das novas canções do longamente concebido i/o (significando "input/output" mas também o nome de uma das luas de Júpiter, Io), a publicar na íntegra na lua-cheia de 1 de Dezembro. Ajudando ao parto então iniciado, haviam entrado em estúdio o baterista Manu Katché, o baixista Tony Levin e o guitarrista David Rhodes, núcleo duro mas infinitamente maleável do universo sonoro de Gabriel ("Sempre gostei da combinação high tech/artesanato em que articulamos o futuro com algo físico do passado") a quem se juntariam o Soweto Gospel Choir, o coral masculino sueco Orphei Drängar, a New Blood Orchestra dirigida por John Metcalfe e o precioso Brian Eno (produção, sintetizadores, guitarra manipulada, ukulele, "vermes eléctricos", programação rítmica, electrónica e "sound design"): "Foi muito bom que ele pudesse ter vindo e tocado connosco. É um mestre na possibilidade de criar uma atmosfera utilizando um mínimo de matéria sonora. Estivemos com ele durante três dias peneirando o material e acrescentando-lhe umas partículas de Eno". (segue para aqui)

08 December 2023

Olha, tão a propósito...

ECOS DO FUTURO 


Preparem-se porque vai tratar-se de uma longa viagem de quase 30 anos. Mais ou menos pela mesma altura (1995) na qual Peter Gabriel iniciara a gravação de Up - publicado em 2002 -, havia já embriões de ideias para o que lhe deveria suceder. E data marcada para isso: 2004. Candidatas a figurar em Up, em diversos estados de evolução, existiam mais de 130 canções das quais 10 passariam todos os testes. Acerca das que restavam, Gabriel planeava virem a integrar um álbum com o título i/o (que fora provisoriamente o de Up). Com diversas digressões, a actividade da sua editora de world music "Real World", o envolvimento em múltiplos projectos de âmbito político/social, a gravação de bandas sonoras e dos álbuns de versões Scratch My Back (2010) e New Blood (2011) pelo caminho, 2004 ficara lá para trás. Mas, um ano depois, existia um caldeirão de 150 canções que, com o engenheiro de som Richard Chappell e o percussionista Ged Lynch, ia fazendo borbulhar: "Tenho escrito principalmente sobre o nascimento e a morte, com sexo pelo meio", diria ele, então, à "Rolling Stone". Um salto de 8 anos e, à mesma publicação, confessaria que tinha cerca de 20 canções no forno: "Provavelmente, as coisas não têm acontecido tão rapidamente quanto desejaria. As canções ainda cá estão, embora queira regravar algumas. E há sempre outras novas a aparecer". Mais uma pausa de 6 anos (com problemas de saúde familiares pelo meio) e, finalmente, em 2019, anuncia que desta vez é que é: há 50 ideias prontas a eclodir e até ao final do ano tudo deverá estar concluído. Interrupção dramática para alerta de Covid e comunicado oficial informando que "o lockdown atrasou-nos um pouco" mas "há canções suficientes para gravar um álbum de que me possa orgulhar". (daqui; segue para aqui)

Peter Gabriel - "i/o (Bright-Side Mix)"