31 May 2022

Folknery - "Da Zyma Nasha Biela"

LABIRINTO
Foi em Milwaukee, a 30 de Setembro de 1859, numa feira da Wisconsin State Agricultural Society, que Abraham Lincoln contou a história de um monarca oriental que dirigiu aos sábios às suas ordens o desafio de inventar uma frase capaz de exprimir a realidade em todas as épocas e circunstâncias. Observando antes que, se ocasiões como as de então proporcionavam benefícios duradouros, “os vencedores, se aliviarem o seu esforço, serão rapidamente vencidos, e os derrotados de hoje hão-de triunfar mais tarde”, Lincoln acabaria por revelar a frase que seria proposta ao monarca: "And this too shall pass away". Aparentemente originária da poesia Sufi persa, haveria de ressurgir sob formas diversas (Bob Dylan: “For the loser now will be later to win, for the times they are a-changin'”) e também agora, de modo deliberadamente inacabado – This Too –, enquanto título do segundo álbum do extraordinário Kinnaris Quintet. (segue para aqui)

Live at MG ALBA Scots Trad Music Awards
Duchampiano ou caso psiquiátrico?

28 May 2022

Eu bem digo que eles nem precisam de ajuda para implodir sozinhos

Edit (30/05/2022) - ... voilá!
Amber Coffman - "Run Run Run"
 
(sequência daqui) Seria, justamente, isso que, paralelamente ao preconceito que a lançaria para todo o sempre nas labaredas da Inquisição pop, a transformaria em farol das movimentações punk, pós-punk e new wave com discípulos e fãs confessos como Thurston Moore, Kim Gordon (Sonic Youth), B-52, Kathleen Hanna (Bikini Kill), Courtney Love, RZA ou todos os que viriam a participar nos álbuns de homenagem Every Man Has a Woman (1984) – Elvis Costello, Harry Nilson, Rosanne Cash, Roberta Flack –, Yes, I’m A Witch (2007) – Peaches, Le Tigre, DJ Spooky, Cat Power, Flaming Lips – e Mrs. Lennon - Canções de Yoko Ono (2010) – só com intérpretes brasileiras. Aos quais deverão acrescentar-se aqueles que, agora, sob a produção de Ben Gibbard (Death Cab For Cutie), em Ocean Child – Songs of Yoko Ono, a 18 de Fevereiro, lhe ofereceram este valioso presente pelo seu 89º aniversário. Muito em particular, David Byrne com os Yo La Tengo, Sudan Archives, Sharon Van Etten, Thao, U.S. Girls e Stephin Merritt mas também Flaming Lips, Amber Coffman e Deerhoof.
Mas isto não era assunto arquivado desde há 12 anos?... (embora a tradução não seja lá muito exacta)

25 May 2022


(via MnP)
Embora pelas piores razões e, no contexto actual, com indesejáveis consequências, o abandono da mistela bolonhesa pela Rússia pode bem ficar como o único resultado (potencialmente) positivo do desatino putanesco putinesco

Sudan Archives - "Dogtown"
 
(sequência daqui) O anátema de maléfica harpia japonesa responsável pela desagregação dos Beatles – depois bastamente desmontado – decorria, em parte, do currículo anterior de Yoko: filha de abastado banqueiro japonês que, após o pesadelo da 2ª Guerra Mundial, se havia mudado para Nova Iorque, inicialmente devota de Schoenberg e Alban Berg, rapidamente se envolveria com os neo-dadaístas do Fluxus, convertendo o seu loft no nº 112 de Chambers Street em espaço para concertos e performances (com Marcel Duchamp e Peggy Guggenheim entre os convidados) de La Monte Young, Joseph Byrd – posteriormente, motor criativo dos United States of America –, John Cage e Henry Flynt. O explosivo cocktail de arte conceptual, Dada, poesia concreta, arquitectura, performance e literatura assemelhava-se demasiado a uma ameaça ao equilíbrio colectivo dos, até aí, quatro despreocupados “mop tops” que, contudo, por essa época, com Revolver, até pareciam ter-se tornado particularmente permeáveis à sedução de todo o espectro de experimentalismos. Yoko, porém, em algum ponto, pisara uma linha vermelha. (segue para aqui)

22 May 2022

The last day at Azovstal, Mariupol, Ukraine (Dmytro ‘Orest’ Kozatsky)

"Azov photographer publishes his work just before being taken prisoner. 'That’s it. I am thankful to Azovstal for shelter - the place of my death and my life', Dmytro ‘Orest’ Kozatsky said in his Instagram post, published on Friday. The Azov regiment fighter made his photography from the sieged Azovstal steel plant available for free, asking for it to be shared as much as possible. Some of these photographs have already gone viral revealing the situation of Azov regiment fighters, notably the injured personnel. 'By the way, while I will be in captivity, I leave you my photos, apply to all the journalist awards and photography competitions for me. If I get something, I will be really pleased to learn about it after I am released. Thank you all for your support. See you', he wrote".
PISAR A LINHA VERMELHA
No final de Janeiro deste ano, Neil Young, com o habitual pelinho na venta, fez questão de informar publicamente o Spotify que, enquanto desse abrigo a The Joe Rogan Experience – o podcast mais popular do mundo, de veia populista e aberto à máfia anti-vacinas –, ele retiraria a totalidade da sua discografia dessa plataforma de "streaming": “Faço-o porque o Spotify dissemina informação falsa acerca das vacinas provocando potencialmente a morte de quem se deixa enganar por essa campanha de manipulação”. Vários outros músicos lhe seguiram o exemplo mas, por diversos motivos, o mais significativo acabaria por ser um "meme" que circulou pelas redes no qual Yoko Ono ameaçava... verter toda a sua música no Spotify caso o podcast de Rogan não fosse removido! Era apenas o último capítulo na longuíssima história de má língua e animosidade contra Yoko que se iniciara a 7 de Novembro de 1966 quando, pela primeira vez, ela se cruzou com John Lennon na Indica Gallery, em Londres, na altura em que preparava Unfinished Paintings, uma exposição de arte conceptual. Na verdade, essa não fora a sua primeira intromissão no terreno sagrado do quarteto de Liverpool: ela já havia contactado anteriormente Paul Mc Cartney a quem pedira um manuscrito de uma canção dos Beatles para ser incluído em Notations, um livro que John Cage iria publicar. (daqui; segue para aqui)

David Byrne & Yo La Tengo - "Who Has Seen The Wind?"

19 May 2022

(You Belong There - álbum integral aqui
 
(sequência daqui) E, referindo-se ao facto de grande parte do disco ter sido concebido nas atmosferas rurais do Norte do estado de Nova Iorque e de Santa Fe, no Novo México, acrescentava; “Não sou uma pessoa particularmente espiritual. Não sou religioso. Mas, definitivamente, sinto uma espécie de relação misteriosa com certos lugares. É o mais próximo que chego de uma experiência espiritual”. É, então, num registo de art/rock/folk – de Van Dyke Parks a Baden Powell, Robert Wyatt, Jim O’Rourke, Nick Drake, a clássica de câmara e o jazz – que estas 10 matrioscas sonoras meticulosamente orquestradas circulam, entre espirais de guitarra, arrebatamentos orquestrais e oceânicas massas corais, à esquina de um quase aforismo Zen: “Our work for work’s sake, we’re useless in our way, clear the brush and push the paint, nothing’s lost when there’s nothing there, whatever was and whatever will”.

Após ter tornado mundialmente conhecido o "inglês técnico" e ter derramado sapiência nas Sciences Pô, dando continuidade a um primeiro ensaio transatlântico e apoiando militantemente o velho camarada de armas, Lula, o 44 segue uma velha dica do Pinho dos corninhos e persiste na febril e incessante busca do conhecimento! (o novo penteado fica-lhe a matar!)

A seita karambista-alternativa está no poder na Coreia do Norte (e a brilhante luz do passado iluminará o presente)

16 May 2022


Joryj Kłoc — "ŻYTO"

10 MATRIOSCAS
 
 
Há 10 anos, a propósito de Shields, dos Grizzly Bear, pareceu-me inevitável sublinhar que – tal como já acontecia em Veckatimest (2009) – o que mais seduzia naquela música que nos afectava “do pescoço para cima”, era “a intrincada inteligência da arquitectura de cada peça que, laboriosamente, edificam”, prova definitiva de que “na linha evolutiva da música do século XX, o prog-rock não desembocou, irremediavelmente, nem beco sem saída” e era perfeitamente possível “recusar o juramento-de-sangue punk e não acabar a tocar os Brandeburgueses para banda rock com a Filarmónica de Swindon”. Agora, coincidindo com a publicação de You Belong There, primeiro álbum a solo de Daniel Rossen (com Ed Droste, o motor criativo dos Bear, desde 2020, em pausa de duração imprevisível), este, em entrevista à “Uncut”, afirma que “Para mim, fazer música é nuito semelhante a construir mundos. Na minha opinião, faz sentido enquanto forma de criar objectos – a escrita confessional de canções não é, realmente, aquilo que faço”. (daqui; segue para aqui)

15 May 2022

"This year’s Lithuania’s entry for the Eurovision Song Contest, Monika Liu, used the power of music to show support to Ukraine and its Eurovision finalist Kalush Orchestra. Not only did she wave the Ukrainian flag during the live semi-final and final shows, but also joined an initiative in Vilnius, the capital, where the country’s famous musicians, the soloists of the National Opera and Ballet Theatre, and a children’s choir manifested musical solidarity, urging to continue supporting Ukraine during and after the Eurovision Song Contest. Monika Liu together with other Lithuanian performers sang Ukraine’s Eurovision entry song Stefania in a new video, filmed on the streets of Vilnius. The initiative highlighted Vilnius’ continuous support to Ukraine ever since the beginning of the war on February 24th and showed solidarity with the war refugees" (Go Vilnius)
Edit (18:58) - O videoclip original
 
 

Edit (16/05/2022) - "Eurovision winners sing at Polish border on way back to Ukraine: Psiuk said when they got home they would take off their stage outfits and wear the uniform of the Ukrainian resistance"

13 May 2022

Edit (14/05/2022):
"Alongside the launch of a new ‘Dylan60’ Microsite, today sees the release of a new music video, 'Subterranean Homesick Blues 2022', to commemorate Bob Dylan’s 60th Anniversary as a ‘recording artist of immeasurable musical and cultural impact’" (aqui)
Maravilhas da Natureza

Entendamo-nos: 
russofobia ≠ putinofobia
... se calhar, como dizia o outro sobre o Adolfo, até é judeu
Opá, mas a gajinha já por lá andou a laurear a pevide e não fez senão figuras tristes...
 
(e FIF nº 2 a caminho)

Edit (13/05/2022) - ... mais outra que vai perder a cabeça...

12 May 2022

Gabriel Kahane - Not Using the Internet for One Year and the Art of Orchestra

(ver aqui e aqui)
... entretanto, no mui livre Ocidente...

Exactamente o tipo de cenário que uma cabeça nem sequer prodigiosamente genial (bastar-lhe-ia ser inteligentemente egoísta) colocaria, de imediato, fora da equação
STREET ART, GRAFFITI & ETC (CCCI)
 
Checkpoint à saída de Dnipro, Ucrânia, 2022


 

(via DT)
Colados com cuspo

11 May 2022


"Sit Shiva" 

(sequência daqui) A experiência – revista e aumentada – teria início em Novembro de 2019 quando Gabriel iniciou o corte de um ano na sua ligação à Internet: “Quis deixar tudo isso para trás não como manifestação de tecno-pessimismo mas enquanto busca de uma alternativa positiva. Tinha um bloco-notas onde fui escrevendo todo o ano. Em Outubro de 2020, impus-me a missão, de todos os dias, criar o rascunho de uma canção, tendo a liberdade de escrever sobre coisas pessoais e insignificantes. Mas, no fim, o mundo acabou por se intrometer”. Qual obra de Paul Simon na oficina de joalharia de Brian Wilson, Magnificent Bird é, então, o precioso estojo sonoro no qual, entre pérolas e gemas, se avistam “heads of state all made from papier mâché”, o pânico é palpável (“Wake up tangled in the bed, a dream, an explosion, the dead”) e os amanhãs emudeceram (“Go fetch the paper from the front step and learn that the country fears another Civil War”).
Até parece que sou bruxo...

09 May 2022

VINTAGE (DXCV)
 
Marianne Faithfull - "The Ballad Of Lucy Jordan"

(do álbum Broken English, 1979, na íntegra aqui)
Putin não anuncia o Apocalipse e os media entram em crise! Por este andar, lá terão de regressar à Covid (a hepatite infantil é um flop total) e ao lavrador de Cinfães que violou idosa de aldeia vizinha - o que vale é que a "saison" dos incêndios deve estar quase a começar!
O MUNDO ACABOU POR SE INTROMETER

 
“É preciso recuar até 2016 quando, poucas semanas antes das eleições presidenciais de Novembro, decidi que, no dia a seguir a elas, fosse qual fosse o resultado, iria fazer uma viagem de comboio. Nessa quarta-feira, embarquei na Penn Station, de Nova Iorque, e percorri o continente durante mais de 14 000 quilómetros, conversando com estranhos nos vagões-restaurante dos comboios. No último instante, decidi deixar computador e telemóvel em casa. Recordo-me de, algures no Novo México, ter pensado: 'Isto é uma experiência realmente transformadora! Tenho de repeti-la mas não apenas em treze dias'”, conta Gabriel Kahane à WABE (FM). Daí resultaria Book of Travelers (2018), quarto álbum a solo de Kahane, "singer-songwriter", compositor, multi-instrumentista, “creative chair” da Orquestra Sinfónica do Oregon e cúmplice notório de Sufjan Stevens, Andrew Bird, Shara Worden, Kronos Quartet, Paul Simon, yMusic e John Adams. (daqui; segue para aqui)

"To Be American"

06 May 2022

STREET ART, GRAFFITI & ETC (CCC)
 
Mural on Ukrainian woman offering a Russian soldier sunflower seeds to put in his pockets so that they would bloom when he died (Amanda Newman)

Melbourne, Australia, 2022
"This piece is about hope and resilience. A video circulated at the beginning of the war showing a Ukrainian woman offering a Russian soldier sunflower seeds to put in his pockets so that they would bloom when he died. This image has stuck with me. The bravery of the woman. Beauty sprouting from something awful. A sunflower (Ukraine’s national flower) symbolising the resilience of the Ukrainian people and the hope that they would not only survive, but prosper, in the wake of evil. A nightingale (Ukraine’s national bird) singing with sweet victory and hope for the future. A young girl in traditional Ukrainian clothing, sowing the seeds of her identity so that her culture is not lost" (aqui)
Amélia Muge - "Versão Condensada do Nascimento dos Desertos"

(daqui; álbum integral aqui; ver também aqui)
Mas custará assim tanto compreender que o único responsável pela "campanha" (assim como por outras "campanhas") é o próprio PCP? (via DdO)

Nota: ... e, até agora, ainda nada...

04 May 2022


... talvez passar os olhos por umas linhas de George Steiner evitasse alguns disparates...
 

"‘It’s a hell of a scary time’: leading US feminists on the threat to Roe v Wade"

(full album visualizer)

(sequência daqui) Tamara Lindeman não tem muitas dúvidas: “Não é fácil fazer caber o mundo numa canção. Quando tentamos fazê-lo conscientemente, na maioria das vezes, falhamos. As melhores canções exigem uma certa humildade. Trata-se apenas de descobrir o botão certo, premi-lo, e esperar que quem ouve faça o resto”. Experimentemos então, por exemplo, escutando-a a desafiar os constrangimentos da linguagem: “And you pointed out the window – looking straight in at me – a black and white bird sitting on the fence. I thought about the man who called it magpie; confronted by the great expanse of his ignorance, he wanted to name it, to detain it, forever in that small phrase, it seemed like a shame, to give it a name”. Ou procurando decifrar o sentido do tremendo enigma final: “It's only the end of an endless time, they don't put that in the paper, you won't hear it on the news, but we knew and it's just like a sunset about to begin”.

01 May 2022

(sequência daqui) Durante esses três dias, ao piano e com o transparente acompanhamento de um quinteto de luminárias da cena jazz/improv local – Christine Bougie (guitarra e lap steel), Karen Ng (saxofone e clarinete), Ben Whiteley (contrabaixo), Ryan Driver (piano, flauta e voz), e Tania Gill (teclados) –, concentrou-se naquelas canções que, durante o processo de construção de Ignorance, sem lhe pertencerem verdadeiramente, teimavam em surgir: “Apercebi-me que estava a escrever dois álbuns diferentes. Um para ser publicado e outro que ficaria só para mim. Mesmo não as imaginando no disco em que que estava a trabalhar, elas queriam existir. Quando terminei Ignorance, voltei a pensar no que tinha deixado escondido no bloco notas e senti vontade de não as deixar esquecidas e assegurar que acabassem por ser gravadas. Apenas para que pudessem existir, sem nenhum plano para o destino a dar-lhes”. Mas, porque sempre que uma coisa fica por publicar é como se estivesse inacabada e ambos os discos “espreitam um qualquer final, uma enorme mudança plena de incertezas, em curso no nosso mundo”, How Is It That I Should Look At The Stars, quase como um eco pianissimo de Ignorance, deixaria de ser objecto secreto. (segue para aqui)

1º DE MAIO (XXXI)