03 April 2007

CLAUSTROFOBIA NA CATEDRAL

The Comsat Angels:
Waiting For A Miracle
Sleep No More
Fiction
Time Considered As A Helix Of Semi-Precious Stones (The BBC Sessions 1979-1984)


Em Rip It Up And Start Again - Post Punk 1978/1984, a enciclopédica obra de referência publicada no ano passado, Simon Reynolds não lhes dedica uma única linha. É preciso ir ao site da editora Faber & Faber para, nos anexos que Reynolds aí decidiu alojar, na secção significativamente intitulada "Post-Punk Esoterica", se descobrir uma breve menção aos Comsat Angels enquanto fugazes rivais/epígonos dos Gang Of Four.

Reynolds tem frequentemente razão mas, neste caso, dificilmente poderia ter falhado mais o alvo. Porque aquilo que distinguiu a magnífica banda de Sheffield cujo nome foi retirado de um conto de J. G. Ballard — a afinidade com a "sci-fi" não fica por aí: "On The Beach", do primeiro álbum, alude ao livro homónimo de Nevil Shute e o título da colecção de sessões para a BBC, Time Considered As A Helix..., provém de uma "short-story" de Samuel R. Delany — foi, justamente, a sua singularidade, muito pouco comparável a qualquer outra banda da mesma época.

O que, se lhes assegurou um cativo lugar de culto, também os lançou definitivamente para o tipo de obscuridade que continua a possibilitar equívocos como aquele em que Simon Reynolds persiste. A verdade, porém, é que Waiting For A Miracle (1980) e Sleep No More (1981) merecem integralmente ser colocados a par de Unknown Pleasures, dos Joy Division, Heaven Up Here/Porcupine, dos Echo & Bunnymen, Jeopardy, dos Sound, 154, dos Wire, The Correct Use Of Soap, dos Magazine, ou, sim, Entertainment!, dos Gang Of Four, no quadro de honra do pós-punk britânico.

Agora reeditados (com o ainda muito bom Fiction, 1982, e a recuperação das gravações de 1979 a 1984 para o programa de John Peel — a carreira posterior dos Comsats, fora da Polydor, é francamente menos estimável...),mostram a música de um grupo que vivia do jogo de verdadeira tensão entre a secura da bateria-tribal-Maureen Tucker-minimalista de Mik Glaisher, a intensidade fluorescente da guitarra de Steve Fellows, as cintilações quase-Krautrock dos teclados de Andy Peake, o baixo geométrico de Kevin Bacon e a ansiedade psicoticamente analítica dos textos de Fellows ("I can't relax 'cause I haven't done a thing and I haven't done a thing 'cause I can't relax", de "Independence Day", sintetiza, praticamente, o universo da banda). Waiting For A Miracle é fibra muscular, tendões e terminações nervosas à flor da pele, Sleep No More asfixia de claustrofobia no interior de uma catedral. (2006)

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