HOJE À NOITE (21.30), NA CULTURGEST, AMÉLIA MUGE, MICHALES LOUKOVIKAS E UMA VASTA BRIGADA LUSO-GREGA VAI APRESENTAR "PERIPLUS" E DEMONSTRAR COMO, AO CONTRÁRIO DO QUE, NO MENU DO DIA, ESTAMOS HABITUADOS A LER, PORTUGAL TEM TUDO A VER COM A GRÉCIA E A GRÉCIA TEM TUDO A VER COM PORTUGAL
(fragmentos da conversa com AM e ML - publicada hoje no "Actual"/"Expresso" - caídos no chão da sala de montagem)
(dos périplos)
ML – Marselha era uma colónia grega. Existe uma lenda de um marinheiro grego do sec IV aC, Pítias, que viajou a partir de Marselha, circumnavegou as ilhas britânicas e continuou para Norte, tendo-se referido à mítica Thule. Do Báltico – segundo algumas teorias mais extravagantes –, terá chegado ao Mar Negro e, navegando pelos rios do continente europeu, terá regressado a Marselha.
AM – Apeteceu-nos juntar o fado com a rebetika mas houve outras coisas que vieram atrás porque o que estava em cima da mesa as atraíu. O próprio material acabou por ditar o que se fazia, funcionou um pouco como bússola.
(tratou-se de um feliz encontro por acaso, foi o resultado natural da existência de uma ligação cultural, ou a manifestação de um espírito europeu que, quando começamos a escavar, acaba por vir à superfície?)
ML - Em vez de europeu, eu diria mediterrânico. Na Idade do Bronze, para fazer o bronze, precisávamos de cobre e estanho. O cobre existia em abundância em Chipre (cujo nome vem do próprio cobre). Mas, para o estanho, era preciso ir à Cornualha. Não se imagina a enorme quantidade de histórias que nasceram a partir dessas navegações – como a do reino de Tartessos ou a dos cretenses Minoicos que levaram toiros da Ibéria para as suas festividades tauromáquicas.
AM – Se pensarmos na ligação de todas estas histórias com aquilo que, na altura, se poderia cantar, como esta viagem foi também uma viagem no tempo, fez-me pensar nestas canções tradicionais como algo residual: mesmo que saibamos que foram músicas compostas no século passado, quem compôs já o fez a partir de alguma coisa que ouviu. É como o jogo em que se segreda uma palavra ao ouvido do companheiro e, quando se completa a volta, já chega completamente transformada. Mas, se nós reconstituirmos o percurso, descobrimos uma familiaridade antiga que não sabemos bem definir. Chegámos a colocar a hipótese de um guião mas recusámo-la porque se tratava de uma viagem de viagens. Há sequências mas aconteceram por agregação de temas que puxavam certo material e deixavam outro de lado. Isto poderia ter partido da intenção de fazer uma história comparada das músicas tradicionais. Mas como não foi isso que pretendemos, deixou-nos muito mais livres: as coisas aconteceram e reagiram umas com as outras...
(2012)