06 November 2018

TUMULTO


13 canções, 13 Rivers. Parece fácil demais descrever assim o 19º álbum a solo de Richard Thompson. E é fácil demais, apesar de ser o próprio a fazê-lo. O motivo talvez seja – confessa-o no seu "website" – não compreender como funciona o processo criativo: “Por vezes, escrevemos canções sem perceber acerca do que são; supomos que tratam de coisas que vivemos mas acabam por resultar de modo diferente, ocupam um mundo alternativo. Reflectem as nossas circunstâncias mas também esse outro mundo. Imagino que seja uma bizarra existência paralela à minha vida. É frequente olhar para uma canção concluída e interrogar-me acerca do que raio haveria dentro de mim”. Em entrevista ao “Aquarium Drunkard”, sublinha que é, essencialmente, do seu tumulto interior que elas surgem, embora conceda que algumas são suficientemente abstractas para poderem ser lidas politicamente. E, vivendo há 30 anos nos EUA, não se esquiva a reconhecer que o país atravessa um momento de insanidade: “Donald Trump está para além da sátira! Seria preciso escrever uma canção nova todos os dias. Estamos às escuras acerca do que poderá acontecer a seguir mas é preciso estar preparado para tudo”. 



"The Storm Won’t Come", o primeiro “rio”, corre turbulentamente por esse território entre o íntimo e o político: “I'm longing for a storm to blow through town and blow these sad old buildings down, fire to burn what fire may and rain to wash it all away, but the storm won't come”. O segundo, "The Rattle Within", diagnostica a origem da inquietação (“Just when you think that your horses are running, just when you think that you're fixing to win, there's that wandering deep inside you, who's gonna save you from the rattle within?”) e, um pouco mais adiante, em "The Dog In You", avista-se a silhueta do mal: “All of the pain, again and again, to put a twinkle in your eye, all the grief, to give you some relief and to satisfy the dog in you”. Pelo meio de incendiárias explosões de guitarra, todos os rios convergem para o dilúvio final (“Don't need a ticket for the future, the apocalypse is free, Armageddon's in the mirror”) e, em modo de aproximação dissimulada – “Gosto de alternar entre a luz e as trevas, nunca deixar prever o que virá a seguir. É então que cravo o punhal sem que se apercebam” –, Richard Thompson arrasta-nos com ele, sonambulamente, até ao penúltimo instante: “If my feet betray me, lock the door, my heart may never be this wise again, I'm shaking, I'm shaking, I'm shaking the gates of hell”.

1 comment:

João Lisboa said...

Receio ter mandado um comentário para o lixo inadvertidamente...