17 February 2016

mp3


A culpa foi de Eberhard Zwicker. Um dos fundadores da psicoacústica – o estudo científico da forma pela qual os humanos apreendem o som –, o seu ponto de partida havia sido a verificação de que o ouvido humano não funciona como um microfone. Na verdade, o processo de selecção natural configurara-o apenas para ser competente em duas tarefas fundamentais: ouvir e interpretar a linguagem e actuar como um sistema de alerta perante a aproximação de grandes felinos carnívoros. Em praticamente todo o resto, as imperfeições da percepção sonora são inúmeras. A investigação de Zwicker concentrou-se, pois, na identificação dos limites da audição e partilhou-a com Dieter Seitzer, engenheiro informático de quem foi orientador de tese. Pelo que, quando, em 1982, o surgimento do CD foi entusiasticamente saudado pela comunidade de engenheiros e técnicos de som (“Perfect sound forever!”), Seitzer, praticamente isolado, encarou-o como um exercício absurdo de criação de um repositório de informação irrelevante, a maioria da qual o ouvido ignorava.


Com a colaboração da equipa de Karlheinz Brandenburg que conhecera quando lhe coube a vez de ser o seu orientador na Universidade de Nuremberg, ao fim de vários anos de experimentação e pesquisa, chegaram, em 1991, ao formato de compressão áudio, o mp3, que, com perdas de qualidade imperceptíveis, reduziria um ficheiro para 1/11 do tamanho original. E, por arrasto, inauguraria a era da pirataria de música na Internet. Pode supor-se que um livro de cerca de 300 páginas cujo objectivo é contar esta história de A a Z, dificilmente possa cativar quem não esteja directamente interessado nesse assunto. A verdade é que How Music Got Free (The End of an Industry, The Turn of the Century and the Patient Zero of Piracy), de Stephen Witt, é um absoluto "page-turner" que se lê avidamente mesmo conhecendo-se, à partida, o desfecho. Verdadeira história de piratas, com heróis, vilões, peripécias inesperadas e volte-faces surpreendentes, entre muitos outros, permite-nos conhecer o anti-heroi, Dell Glover, operário negro da Carolina do Norte e campeão indisputado do "leaking" (20 000 álbuns em menos de uma década) que, quando Witt lhe perguntou porque nunca tinha contado a sua história, respondeu: “Man, no one ever asked”.

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