11 September 2013

CIDADE DE ECOS E SOMBRAS
 


É o mais recente mantra turístico-autárquico alfacinha: “Queremos Woody Allen a filmar em Lisboa!” Primeiro, em Março último, foi o Secretário de Estado do Turismo a formular o desejo, pondo, porém, como condição que fosse “um filme com manifesto potencial de captação de turistas e que projecte realmente o destino”, constrangimentos com os quais Allen já confessou não se dar especialmente bem. No final da semana passada, foi o presidente da Câmara de Lisboa, António Costa, a bradar ao “Sol” “Quero Woody Allen a fazer um filme de Lisboa”, adiantando que “tem havido contactos”. Antes de mais, para evitar equívocos preposicionais que só costumam provocar sarilhos, conviria esclarecer bem se o que está em causa é um filme “de” Lisboa, um filme “em” Lisboa, ou um filme “sobre” Lisboa. E, a seguir, será útil saber que, cinefilamente erudito como é, Woody não se ensaiaria nada para repescar a matriz da Lisboa-do-cinema, tal como Hollywood (e não só) quase sempre a viu. 



Porque, é verdade, Lisboa já foi abundantemente filmada, facto que pode ser facilmente confirmado por uma visita à Carbono (loja de CD, vinil, DVD, livros e memorabilia em segunda mão, na Rua do Telhal, em Lisboa) onde se exibe uma bela recolha de peças de colecção – cartazes de cinema, revistas, livros e filmes, cobrindo cerca de 50 títulos –,“Espiões Em Lisboa”. E que permitirá também verificar como, para o bem e para o mal, essa Lisboa, inicialmente, em Casablanca, apenas um lugar abstracto no mapa e porta desejada de acesso à liberdade, rapidamente se converteu (consequência da posição de neutralidade de Portugal na Segunda Guerra Mundial) em cenário eleito de febril conspiração diplomática, espionagem, contrabando e negócios obscuros em geral. 


Alguns livros recentes – Lisboa/A Guerra Nas Sombras da Cidade Da Luz: 1939/1945, de Neill Lochery, Passagem Para Lisboa, de Ronald Weber, Lisboa Uma Cidade em Tempo de Guerra, de Margarida de Magalhães Ramalho - e outros mais antigos - Arrival And Departure, de Arthur Koestler -, documentam ou ficcionam bem esses tempos mas, mais do que tudo, as imagens que permaneceram foram as das inúmeras derivações, sequelas, clones, filhos, netos e bisnetos de Casablanca. Sim, as de Hedy Lamarr e Paul Henreid (The Conspirators, 1944), na “city of echoes and shadows”, escutando "Rua do Capelão" cantada pela irmã mais nova de Carmen Miranda, pouco antes de, numa aldeia de pescadores, a 3 quilómetros de Cascais, Henreid ser acolhido pela brasileiríssima canção da “cabocla retirante Maringá”, mas também as de Storm Over Lisbon (1944) – “Estoril is better than Montecarlo. Such a finesse!” –, as de Ray Milland (The Lady Has Plans, 1942, e Lisbon, 1956), explicando que "Lisboa Antiga" é uma espécie de “home sweet home for brazilians”, as de Eddie Constantine (Ça Va Être Ta Fête, 1960) conspirando nos Jerónimos e esmurrando meliantes em Alfama, ou as mais próximas de On Her Magesty’s Secret Service (1969) e A Casa da Rússia (1990). Matéria de inspiração é o que não faltará a Woody Allen. Mas, enquanto ele não se decide, os recursos de uma CML imaginativa estendendo a mão à estrangulada Cinemateca, facilmente pegariam na ideia da Carbono e a ampliariam com o devido relevo.

5 comments:

alexandra g. said...

Este post está carregadinho de C's. Diz que não pode ser.

João Lisboa said...

:-)))))))

Táxi Pluvioso said...

O que eu reparei foi que a Sasha Grey vem a Lisboa, para não perder tempo com cidades feias e com pouco interesse cultural (exceto se os angolanos comprarem e implementarem).

João Lisboa said...

Ecos e sombras de Grey.

Táxi Pluvioso said...

Ela era capaz de ensinar umas coisitas às donas de casa portuguesas. Como comportar-se quando o marido é condenado a pagar 10 milhões... por exemplo.

Só espero que a Sasha seja recebida na Câmara e lhe deem a chave da cidade (e já agora também o meu número de telefone).