02 November 2008

OLIVEIRA DA FIGUEIRA



"Eu imagino o ar entalado do ministro dos Negócios Estrangeiros, um homem civilizado e capaz, moderado e 'diplomata', no bom sentido da palavra, ao ver o que se estava a passar, ao ver o seu primeiro-ministro a fazer de vendedor de cobertores como se estivesse numa feira manhosa, promovendo o 'verdadeiro computador ibero-americano'. Sócrates, na pele de vendedor de uma empresa privada, a JP Sá Couto, que produz em regime de monopólio um computador que o Estado português 'compra', sem concurso público, em condições mal explicadas e mal esclarecidas, deu mais um passo num processo bizarro de envolvimento do Estado português como caixeiro-viajante de uma só empresa portuguesa. Imagino o que dirão as outras empresas do mesmo ramo, esmagadas perante esta competição desigual. (...)



Mas a história só piora cada dia. Ela está a degradar cada vez mais a nossa política externa, com momentos ridículos, pasto dos Gatos Fedorentos, tanto mais que se passam numa cimeira internacional. É penoso ver Sócrates a dar computadores, numa extensão do e-escolinhas, aos chefes de Estado ibero-americanos, perante o sorriso irónico da maioria dos chefes de Estado, que, ou aproveitavam a descontracção para ir ver o correio íntimo ou o site dos jornais da oposição dos seus países (quando ainda sobrevive a oposição), ou o puro desinteresse daqueles que não estão ali para ouvir aquelas brincadeiras um pouco inconvenientes. Sócrates nem sequer se apercebe, que, quando diz que o computador é resistente aos líquidos, pela cabeça daqueles adultos empedernidos, os líquidos que se imaginam não são propriamente nem água, nem leite, nem iogurte.



Mais. Sócrates obviamente nunca faria uma cena daquelas num conselho europeu, e nessa diferença está a rebaixar os seus anfitriões, como se estivesse ali a fazer de sr. Oliveira da Figueira, a trocar umas contas de vidro por ouro entre os tuaregues do deserto. Sócrates falava para os 'índios'. E os 'brancos' na reunião, como Zapatero, estavam noutra. Um desses índios, explicou ele, uma criança grande chamada Chávez, uma criança descuidada e desajeitada, até tinha atirado o 'Magalhães' ao chão para lhe gabar a resistência. E nem sequer passava pelo óraculo da televisão a mensagem de 'Não tentem repetir isto em casa'. Gostava de ver as criancinhas, perante o olhar horrorizado dos pais, a atirar o 'Magalhães' contra as paredes. Experimentem e mandem a conta a Chávez e a Sócrates.



Eu tinha vergonha de lá estar e ouvir um primeiro-ministro de Portugal a dizer que os seus assessores não precisavam de outro computador para trabalhar a não ser o 'Magalhães', concebido para as crianças do ensino básico, o que implica que devem passar o dia a soletrar a tabuada com carneirinhos e florzinhas a voar no ecrã. Deve ter sido assim que foi feito o Orçamento pelos assessores, a jogar ao 'peixinho' no 'Magalhães', até que uma 'mão invisível' saindo da sombra, certamente com um Dell ou um Sony Vayo ou um MacBook Air ou um qualquer computador muito a sério, lá escreveu a anónima alteração da lei do financiamento partidário. Essa não foi feita de certeza num 'Magalhães'. É que, se fosse verdade que os seus pobres assessores tivessem de laborar nos seus gabinetes de 'Magalhães' à frente, o que obviamente não é verdade, isso diria muito sobre o infantilismo de toda esta conversa. (...)" (José Pacheco Pereira - texto integral aqui)

(2008)

2 comments:

Anonymous said...

"Sócrates nem sequer se apercebe, que, quando diz que o computador é resistente aos líquidos, pela cabeça daqueles adultos empedernidos, os líquidos que se imaginam não são propriamente nem água, nem leite, nem iogurte."

ahahah depois dizem que o pacheco não tem sentido de humor.

João Lisboa said...

Ora... estava a pensar em Coca-Cola.