31 August 2018

DISTOPIA

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Babelsberg, a curta distância de Berlim, é o maior distrito de Potsdam, capital do estado de Brandenburg. Foi lá que, em 1945, Estaline, Truman e Churchill se encontraram para a conferência que assinalou o fim da Segunda Guerra Mundial, e é onde se situa também o Filmstudio Babelsberg, o estúdio de cinema em grande escala mais antigo do mundo, no qual Fritz Lang filmou Metropolis, Josef von Sternberg, O Anjo Azul e Leni Riefenstahl montou O Triunfo da Vontade. Para Gruff Rhys (aliás, Gruffudd Maredudd Bowen Rhys, motor criativo dos galeses Super Furry Animals), contudo, até há dois anos, não passava de um nome que vira, de passagem, numa tabuleta à beira da estrada, quando em digressão pela Alemanha, e que anotara por lhe fazer recordar a Torre de Babel bíblica. A Babelsberg que o artista russo Uno Moralez concebeu para a capa do último álbum de Rhys, essa, parece saída de High-Rise, de J. G. Ballard: uma enorme torre de apartamentos luxuosos onde Cristo se senta à mesa com Donald Trump (que o fotografa – ou lhe mostra "tweets" – no telemóvel), um dinossauro em traje de executivo dedilha maços de dólares e, no céu, Deus comanda drones à distância, enquanto, lá em baixo, se avista a estátua de um qualquer Kim Jong-un. 



A figura do canto inferior direito – apenas uma silhueta negra que, com um velho rádio-gravador portátil perto de si, observa a cena – só poderá ser Gruff Rhys que, mais ou menos conscientemente, somando guerra, Metropolis, Ballard, Riefenstahl, Trump e mitologia bíblica, chegou a Babelsberg, o álbum - simetria perfeita com Praxis Makes Perfect (2013), do alter-ego Neon Neon, ensaio sobre o guerrilheiro aristocrata Giangiacomo Feltrinelli, marquês de Gargnano, fundador dos Gruppi d'Azione Partigiana. Desta vez, acompanhado pela National Orchestra do País de Gales que interpreta os sumptuosos arranjos de Stephen Mc Neff (algures entre Forever Changes, Jim Webb e Divine Comedy), a utopia redentora dá lugar à ansiosa distopia (“No silver linings, this is the end, get your phone out to document, selfies in the sunset (…), it's the last film that we'll ever see, Armageddon wants company, the backdrop's blazing red and everyone is equal in the valley of the dead”), a montagem da armadilha é óbvia (“Architecture of amnesia, scare the people with hysteria”) mas a saída que resta mete medo (“I'm keeping my eyes peeled for military takeover at night”). Nesta Babelsberg não há conferências de paz.

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