M3LL155X
Quando, a 6 de Agosto do ano passado, foi publicado LP1, já os anteriores EP1 (2012) e EP2 (2013) nos tinham obrigado a arregalar olhos e ouvidos perante a magnífica e sufocante estranheza das imagens e sons que FKA twigs – com Arca/Alejandro Ghersi e Jesse Kanda à ilharga – nos lançava à cara, coisa oriunda de Interzone sideral, definitivamente o género de estimulante de que a música contemporânea precisa como um afogado necessita de oxigénio. O álbum de estreia foi, assim, somente a fulgurante confirmação da suspeita de termos, enfim, a possibilidade de escutar música que não se limita a perseguir, incessantemente, a própria cauda e não vive exclusivamente do gesto de mirar, à socapa, o espelho retrovisor da História. A brigada de catalogadores não descansou enquanto não a capturou no interior de fronteiras minimamente reconhecíveis – por exemplo, a jaula do “R&B futurista” ou “alternativo” – o que conduziu twigs/Tahliah Barnett a, justissimamente, desafiar: “Não se trata de eu não querer ser classificada como R&B, mas há, igualmente muitas outras coisas. Falemos, então, de tudo!”
Tudo é, precisamente. o que, 12 meses depois, volta a descobrir-se no EP de cinco faixas, M3LL155X, ler MELLISSA, a ninfa que alimentou Zeus com mel e, na versão de twigs, o nome da sua energia feminina primordial. Veneno new age à vista? Não nos preocupemos (por enquanto): o conteúdo mais subliminarmente esotérico em que poderemos tropeçar são assaz explícitos farrapos de mensagens - “Teach me how to lead with my middle finger”, “Love me rough, I'm your doll”, “Shut your eyes and feel the rush, will you fuck me while I stare at the sun?” –, argumento mínimo para um vídeo de cerca de 17 minutos por ela realizado, no qual, por entre vertiginosas reconfigurações de “vogueing”, jorros de líquido amniótico multicoloridos, aparições da lendária musa-"evil witch" tatuada franco-argelina, Michèle Lamy, e sobreposições do rosto de Tahliah ao corpo de uma boneca insuflável, vítima ambiguamente submissa de violação, se lê um guia labirinticamente feminista do que, confundindo género, vulnerabilidade, explorações sonoras terminais e radical abstraccionismo digital, só poderia ter lugar num clube onde ninguém, na verdade, dança mas imagina o que poderia ser dançar.
2 comments:
Entretanto, na Noruega:
https://www.youtube.com/watch?v=pYtvkoqTnSs
Parece-me também existir uma certa ironia subjacente que desafia a estética mainstream. Nesta última tudo surge mascarado de diversão e estilo de Vida cool. Fka assume a perversão sem qualquer pudor, está em discurso directo, goza abertamente com as shakiras.
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