04 November 2013

ASSIM, DE REPENTE, E AINDA SEM GRANDE REFLEXÃO, ISTO PARECE-ME MUITO BEM * (ou um daqueles raros instantes em que Nuno Crato parece conseguir libertar-se das garras do ministro da Educação):

"Os textos complexos exigem específicas disposições dos leitores que podem ser treinadas através das estratégias de leitura postas em prática. Bauerlein destaca, entre elas: 

1) a vontade de experimentar e compreender, assente na consciência da planificação e da composição cuidadas. Um texto complexo não é apenas o que transmite informação, mas o que exprime também valores e perspetivas e o que permite, pois, exercitar as capacidades de observação e de análise crítica dos seus leitores ou ouvintes. É nesses valores e perspetivas que se deve reconhecer a capacidade de lidar com a informação recebida, e, por isso, de a compreender e utilizar em novos contextos, na escola e fora da escola; 

2) a existência de poucas interrupções – os textos complexos implicam o treino de um trabalho de pensamento assente na continuidade do raciocínio e, por isso, pouco compatível com formas de comunicação como emails, twitters ou sms. Requerem uma certa forma de lentidão e de concentração que repousa sobre a inexistência de constantes interrupções; 

3) a recetividade para aprofundar o pensamento – ao treinar a compreensão de que nem tudo é imediata e facilmente exposto, treina-se aquilo que é uma etapa necessária à descoberta e ao treino da vontade de prosseguir em direção a uma etapa posterior. 

É hoje possível argumentar que a complexidade textual se apresenta como uma das variáveis decisivas na compreensão da leitura e, concomitantemente, na produção textual, em particular escrita. É ela que permite o desenvolvimento de capacidades de compreensão mais elaboradas e robustas, que naturalmente tenderão a refletir-se nas opções realizadas ao longo da vida, quer dentro da escola, quer fora dela, como lembra, entre outros, Shanahan: 

(...) pode ser duro para os alunos confrontarem-se com um texto que os obriga a deterem-se nele, selecionando palavras, destrinçando frases, esforçando-se por estabelecer conexões. Os professores podem sentir-se tentados a facilitar a vida aos estudantes evitando textos difíceis. O problema é que o trabalho mais fácil não torna os leitores mais capazes. O professor tem de estimular a persistência dos alunos, especialmente quando o trabalho se torna mais exigente. A recompensa resulta da capacidade de perseverar. (Programa e Metas Curriculares de Português para o Ensino Secundário)

* e é fácil de compreender o "sobressalto"...

15 comments:

alexandra g. said...

Se foi agora que o Nunadas descobriu tamanhas pepitas é caso para perguntar que ciências andou a frequentar...

João Lisboa said...

Who cares... já estive a ler quase tudo e há bastante tempo que, em matéria de programas de Português, não via nada com tanta cabeça, tronco e membros.

O problema é que não é pêra doce para muitos... professores.

alexandra g. said...

" tanta cabeça, tronco e membros"

?

Mas concordo, para a maioria dos professores isto exige escolinha e muito tautau em acordês

João Lisboa said...

"muito tautau em acordês"

O acordês também irá à vida in due time.

alexandra g. said...

1) a alexandra baba-se para o camerado
2) a alexandra sorri para o camerado
3) a alexandra envia um beijinho ao camerado

João Lisboa said...

:-)

Anonymous said...

Sobre a prova de acesso, parece que não foi divulgada, até ao momento, nenhuma matriz. Espero a prova se centre em coisas como ler/interpretar, escrever, decifrar estruturas gramaticais.., e que não haja perguntas sobre pedagogia. Como se avaliaria isso (um saber pedagógico) sem assumir que "isso" é uma ciência?

João Lisboa said...

Completamente de acordo.

zeromilhoes said...

http://www.publico.pt/sociedade/noticia/associacao-de-professores-de-matematica-diz-que-novo-programa-tera-de-cair-quando-o-governo-cair-1611416

zeromilhoes said...

O ministro da Educação defendeu segunda-feira em Ovar que, para ser dispensada mais austeridade no Orçamento do Estado para 2014 e ainda pagar a dívida total do Estado, todos os portugueses teriam que "trabalhar um ano sem comer".

http://www.dn.pt/politica/interior.aspx?content_id=3514863

João Lisboa said...

"http://www.publico.pt/sociedade/noticia/associacao-de-professores-de-matematica-diz-que-novo-programa-tera-de-cair-quando-o-governo-cair-1611416"

Sobre matemática, guardo prudente, absoluto e envergonhado silêncio.

"http://www.dn.pt/politica/interior.aspx?content_id=3514863"

Bodysnatching, again.

zeromilhoes said...

sobressaltos, sobressaltos!

Nan said...

Por muito que me custe, tenho de confessar que o novo programa de português para o secundário me pareceu bastante bom - muito melhor do que a mixórdia mal amanhada que passa actualmente por programa. Eu alargaria um pouco mais o leque de opções relativamente a alguns autores.

João Lisboa said...

"Eu alargaria um pouco mais o leque de opções relativamente a alguns autores"

Indo por aí, provavelmente, cada um de nós tiraria uns e colocaria outros... mas o problema maior será haver (ou não) profs que saibam tirar partido disso e não transformem tudo numa estucha que leve os putos a odiar esses autores para o resto da vida.

Anonymous said...

Ainda sobre a prova, se o exemplo vier do Brasil, não faltarão a "formação pedagógica" e coisas como a "concepção construtivista da aprendizagem e do ensino. Enfim, o horror: "http://www.vunesp.com.br/SEED1303/SEED1303_305_008257.pdf