03 May 2010

TEORIA DA CONSPIRAÇÃO (XVI)
(join the dots)


Mão Morta - Pesadelo Em Peluche
 
Mão Morta - Mão Morta (1988-1992)

Segundo o dicionário “Collins”, “Ballardian” é um adjectivo aplicável às circunstâncias descritas nos livros de J. G. Ballard, em especial, a modernidade distópica e os efeitos psicológicos do desenvolvimento tecnológico. A ele, porém, muito mais do que um adjectivo, devemos uma obra literária situada entre a escrita experimental, a antecipação do cyberpunk e a autobiografia, num registo que Martin Amis descreveu como o “que se dirige a uma zona diferente – e pouco utilizada – do cérebro do leitor”. Atrocity Exhibition (1970) foi um momento de viragem: constituído por um conjunto de “condensed novels” (com prefácio de William Burroughs) ordenadas arbitrariamente, era como que um viveiro de muito do que viria a seguir, do esboço de Crash – livro e filme – aos espectros de Marilyn e dos Kennedy (à deriva pelo labirinto mental/espelho distorcido dos media do protagonista) ou ao quase ensaio clínico “Why I Want To Fuck Ronald Reagan” (que, em 1980, seria distribuído por activistas situacionistas na Convenção Republicana de Detroit). Ignorando questões de precedência cronológica (o que, no universo ballardiano também é moeda corrente), é difícil decidir se foi Ballard que nasceu para se cruzar com os Mão Morta ou o inverso. Escutada a caixa que reúne os quatro primeiros álbuns do grupo e o exercício de contenção e diversificação estilística pop em fundo de neurose que é o novo Pesadelo Em Peluche, de uma coisa não restam dúvidas: mesmo antes de o saberem, os Mão Morta eram já ballardianos. Trabalhar à transparência sobre Atrocity Exhibition só lhes apurou os reflexos.

(2010)

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