ADEUS GOA
P. V. Gomes
"Ah sim, são tão ridículos aí, vocês e o vosso futebol, a vossa política de anedota que mete pena a toda a gente, o vosso falhanço quotidiano, a vossa incapacidade de ser alguma coisa que não simpáticos, o desprezo condescendente com que olham para vós, tão pequeninos e tão tristes nesse ridículo rectângulo de economia falida, sociedade amarga, cultura de empréstimo, entregue a esse ridículo destino de pertencer a essa União de falhados. Eu, enquanto aqui [Goa] estive, senti-me distante desse pântano em que Portugal só existe para campeonatos de futebol. Eu, aqui, fui português. Não fui, como vós aí, a lembrança apagada de um passado que não merecem, de uma história que não reconhecem, de um presente que aceitam como carneiros. Eu, aqui, estive com gente que me recorda que podíamos ser outra coisa, que eu (e vocês) podíamos ser outra coisa, que Portugal podia ser alguma coisa em vez do último da União, essa porcaria em que vocês vivem e me envergonha. Sei que é assim porque de cada vez que um jovem português vem a Goa e aqui presta atenção diz-me que nós, os mais velhos, lhe roubámos a história e lhe legámos um país ridículo e não o país para que os de cá olham, o país que foi. (...)" (Paulo Varela Gomes no "Público" de hoje)
(2009)
6 comments:
"... o país que foi."
E quando foi isso? E durante quanto tempo? E em benefício de quem foi esse "foi"?
J.C.
"o país que foi."
E quando foi isso? E durante quanto tempo? E em benefício de quem foi esse "foi"?"
"Foi" durante um microssegundo no tempo. Não "foi", realmente, nunca, aliás (entendo bem, a dúvida do ilustre anónimo JC). Mas "foi", segundo a perspectiva do Portugal-(ficcional)-visto-da-Índia, que o PVG, na crónica, refere (era preciso lê-la toda mas não está disponível online).
E esse "nunca-foi" é, de facto, o mais humilhante de tudo. Sem patrioteirices, nem colonialices, nem (patéticas) imperialices pelo meio. "Nunca ter sido" seja o que for é mau que baste.
E também entendo muito bem o "eu, aqui, fui português". Logo eu que não faço a menor ideia do que "ser poruguês" queira dizer. "Fui português" na medida em que "isso" é visto pelos olhos de outros que supõem ter uma ideia do que isso possa ter sido.
Errata: "português" e umas vírgulas fora de sítio. I plead guilty.
Mais um que tem de ganhar a vida a escrever. Ai ai vida dura.
E, depois, fumam daquelas coisas que faz rir, ficam meio alucinados no estrangeiro, e vêem coisas nas paredes.
Nos sentimos portugueses quando estamos fora porque alguém inventou que temos que ter uma "pátria". Quando chegamos só sentimos um estranhamento.
O ser português foi inventado pelos bons poetas que temos. Corresponde a uma nostalgia do que nunca houve.
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