OBRIGADO, DIVINDADE FELINA!
Alela Diane - To Be Still
Headless Heroes - The Silence Of Love
Eu já tinha obrigação de saber que a suposta sageza contida nos provérbios populares não possui, propriamente, valor científico. Mas, porque estas coisas se infiltram desde o biberão e continuam a actuar subliminarmente, desta vez, por pouco me ia deixando rasteirar por um dos clássicos do género, o universalmente repetido “diz-me com quem andas, dir-te-ei quem és”. Há que conceder a atenuante de que as circunstâncias eram favoráveis ao tropeção: jovem singer-songwriter, natural de Nevada City, como Joanna Newsom, e coberta de louvores por Joanna Newsom, caminha a passos largos para a santidade "freak-folk" à custa de um álbum criado numa cabana de montanha, em Portland, na companhia de um gato. Se acabei por escutar o disco e este texto foi escrito, só pode ter sido por causa do gato, já que, pelas restantes personagens e contornos da história, o evitei cuidadosamente durante dias.
Obrigado, divindade felina: To Be Still é uma belíssima colecção de canções e, ou muito me engano, ou Alela Diane Menig rapidamente deixará na merecidíssima sombra a seita "hippy/psych" do pé descalço. Espreitem-na, no Youtube, nos três clips da série “Concerts à Emporter” de La Blogotheque – cada vez mais um lugar de atribuição de credibilidade indie através do reconhecimento “intelectual” europeu –, vagueando, de guitarra na mão, entre as pedras de Notre-Dame e a Place St. Michel. Já que aí estão, procurem também “The Rifle” (cenário de assombração flannery o'connoriana genuinamente "old weird America") e “The Pirate’s Gospel” (“While some folks pray their path to Jesus, we're gonna sing the pirate's gospel” em atmosfera de mar e trevas noturnas), do álbum anterior.
Podem, agora, passar a To Be Still e descobrir uma legítima descendente de (peso cada palavra) Sandy Denny e – muito mais obliquamente – Nico, algures, numa bissectriz mais contemporânea, entre Nina Nastasia, Kristin Hersh e Neko Case, mas (levando a utilidade do "name-dropping" às últimas consequências) com aquele teor de anacrónica excentricidade que Jolie Holland e Jesca Hoop terão de passar a partilhar com ela. No DVD que acompanha o disco, em concerto de Novembro do ano passado no Olympia de Paris, entre banjos, guitarras e bandolins, podemos, por outro lado, descobrir a personalidade de quem, em cima de um palco, parece estar com o mesmo à vontade que no alpendre do tal refúgio de Portland.
Etapa seguinte: The Silence Of Love, álbum de versões produzido por Eddie Bezalel a que Alela empresta a voz e, na companhia de gente com currículo ao lado dos R.E.M., Beck ou Red Hot Chili Peppers, reinventa temas de Nick Cave, Jesus & Mary Chain, Linda Perhacs ou Jackson C. Frank. Nos melhores momentos (“True Love Will Find You In The End”, “Just Like Honey”, “Nobody’s Baby Now”), dir-se-ia Karen Dalton a bordo dos Mazzy Star; nos outros, poderá não se voar tão alto mas também nunca há danos irreversíveis a registar. E, caso os houvesse, Alela Diane seria sempre mui justamente absolvida.
(2009)
5 comments:
Li a(s) crítica(s), espreitei o disco na FNAC e comprei.
O disco é bom e a moçoila tem uma belíssima voz.
Mas qualquer comparação com a Sandy Denny parece-me um excesso. Pesa lá outra vez as palavras.
Isso é porque um Ricardo Thompson só pode ter uma relação muito próxima com a Sandra Dinis...
Indeed... Mas, confessa lá, tu também tens um fraquinho pela moçoila.
My leaps are sealed.
Para tirar dúvidas
23 de Maio em Torres Novas
39°28'46.38"N
8°32'7.62"W
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