28 December 2008

FUTURO AQUI?



Enquanto o mundo, primeiro, invisivelmente, depois, de forma estrondosa, assegurava que, de uma vez por todas, atribuíssemos o verdadeiro sentido a “It’s The End Of The World As We Know It” (sem que, no entanto, fossemos capazes de, imperturbavelmente, lhe pronunciar o anexo “and I feel fine”...), uma canção dos R.E.M. com 21 anos, no admirável universo da música era apenas “business as usual”. Um “business” que, sem dúvida, “as we knew it”, caminha, inexoravelmente, para o seu declínio – a queda nas vendas de fonogramas físicos aprofunda-se, muito insuficientemente compensada pelas vendas legais “online” e em gigantesca devantagem face aos “downloads” ilegais – mas que nem assim se sentiu verdadeiramente estimulado para, perante a hecatombe, mudar radicalmente de processos. Enquanto indústria e enquanto manifestação estética, em 2008, a música pareceu continuar a viver estranhamente isolada no interior de uma bolha impermeável aos abalos externos, reciclando-se infinitamente, rapando o último fundo aos catálogos, persistindo em métodos de uma idade bem anterior à emergência da Internet, continuando a publicar-se belíssima música (e, naturalmente, também excremento sonoro em abundância) mas nada a partir de onde se pudesse enxergar sinais de futuro. Negro ou luminoso, mas, pelo menos, futuro.



Curiosamente, num cenário onde, entre legiões de melancólicos aspirantes a descendentes de um “one night stand” de Woody Guthrie com June Carter numa cabana das Apalaches e sucessivos e vertiginosos revivalismos, o único fenómeno genuinamente inesperado – a relativamente nova “cena de Brooklyn”, dos Vampire Weekend aos High Places, parece ter potencial renovador mas Nova Iorque sempre foi terreno reconhecidamente fértil –, deste ponto de vista onde nos situamos, foi o que eclodiu nos subúrbios de um diminuto lugar periférico, à beira de mais outra fatal depressão. A saber, Portugal, de Queluz a S. Domingos de Benfica, das caves de Igrejas Baptistas para um circuito alternativo ao alternativo, compondo, em português, “panque-roque” e tosco “folque” artesanal, com epicentro em editoras como a FlorCaveira e AmorFúria e protagonistas de nome Tiago Guillul, Pontos Negros, Samuel Úria, João Coração ou B Fachada. Pop “povera” e a que repugnam os “valores de produção”, vivendo de um excesso de convicção e, por aí mesmo, sinal dos tempos e matéria de proclamações, provocações e manifestos. Por uma vez, se surpresas houve, nasceram aqui e não sabemos como evoluirão. E isso é muito bom. Porque o destino de quase todo o resto não poderia ser mais previsível.

(2008)

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