25 September 2008

O FIM DO IMPÉRIO



Randy Newman - Harps & Angels

No princípio, era o tio Alfred: 45 nomeações para o Oscar de melhor banda sonora (segundo mais nomeado de sempre) e 9 troféus da Academia no currículo. Havia também o tio Lionel, director musical de todos os filmes de Marilyn Monroe para a Fox, 11 nomeações e um Oscar para Hello Dolly. Embora de menor fulgor, não esqueçamos o tio Emil, diligente trabalhador musical em mais de 200 filmes e programas de televisão e uma nomeação para Oscar. Descendo na árvore genealógica, refiram-se os primos Thomas Montgomery Newman (8 nomeações) e David Newman (uma nomeação) e o sobrinho Joey (música para cinema, televisão e videojogos). Não será ainda uma dinastia como a dos Bach mas a família Newman para lá caminha. Pelo que não é de admirar que, com tal linhagem, Randy Newman, para além de um indiscutível clássico da canção popular norte-americana (e, claro, da “film music”: 15 nomeações e um Oscar), seja, acima de tudo, um classicista. Parcimonioso na publicação da obra – 10 álbuns de originais em 40 anos de carreira –, decantador dos licores das mais nobres castas (do vaudeville ao jazz de New Orleans, da pop-Tin Pan Alley a Weill ou Cole Porter), desde Bad Love (1999) que não lhe púnhamos os ouvidos em cima (descontando The Randy Newman Songbook Vol. 1, de 2003, regravação de temas anteriormente editados).



Harps & Angels – pouco mais de 35 minutos e dez novas canções – é, porém, prova mais do que suficiente de que ainda há-de vir longe o tempo em que Randy Newman despirá aquela sua pele de “songwriter” que abriga no mesmo corpo o avô rabujento, o filósofo da escola de pensamento “yellow cab” e o requintado estilista musical. No caso, com as garras particularmente afiadas e o sarcasmo a ferver: “A Few Words In Defence Of Our Country” começa por declarar que “the leaders we have, while they’re the worst that we’ve had, are hardly the worst this poor world has seen” estabelecendo, então a cruel comparação com Calígula, Hitler, Estaline e a Santíssima Inquisição e concluindo com a profecia “the end of an empire is messy at best, and this empire is ending like all the rest, like the Spanish Armada adrift on the sea, we’re adrift in the land of the brave and the home of the free”; “Korean Parents” apela à importação de pais/educadores coreanos para meter os indisciplinados fedelhos americanos na ordem; “A Piece Of The Pie” fustiga o desgoverno social (“living in the richest country in the world, wouldn’t you think you’d have a better life?”) e dispara alfinetadas na direcção da "santidade" de Bono e Jackson Browne, e, com essas e as restantes (acompanhado por notabilidades como Mitchell Froom, Greg Cohen ou Pete Thomas), coloca-nos nas mãos mais outro precioso “songbook”.

(2008)

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