07 September 2008

GEOMETRIA NO ESPAÇO



Brian Eno - The Drop

O último álbum de Brian Eno é um portento de laconismo: quem dele quiser conhecer algo mais do que a escuta da música que contém, dispõe apenas dos dezassete títulos dos temas referidos na contracapa, da indicação de que "music and cover" são da responsabilidade de Eno e que o assistente e o autor da "music assembly" (seja lá isso o que for) dão pelos nomes de Marlon Weyeneth e Ben Fenner. A capa, essa, é um mero cartão colorido com um enigmático boneco, título e assinatura. E a música? Bom, é típico Brian Eno da série "ambient", discretamente cruzado com algumas das experiências rítmicas e tímbricas menos ousadas de Nerve Net, conduzindo o jogo das sonoridades cada vez mais na direcção de um ponto infinitamente localizado no horizonte onde todos os contornos reconhecíveis se dissolvem em meros sinais acústicos abstractos e virtuais, pura geometria no espaço, evoluindo e transformando-se apenas ao sabor da sua inflexível lógica interior.



Umas vezes, é simples pontilhismo sonoro, outras, a pulsação rítmica decorre da mera necessidade funcional de uma articulação do tempo, outras ainda, dir-se-ia que tudo resulta apenas da imprescindibilidade de encarar o universo como fonte de produção de sons e de, assim, lhe proporcionar um recurso básico e vital. "Iced World", o último tema de 33 minutos, em particular, tem essa duração como poderia, eventualmente, perpetuar-se em "loop" infinito até à consumação dos tempos. Por outras palavras, esta música existe pela incontornável razão de que o mundo não pode existir sem música (vejam-na, se quiserem, como uma manifestação sensível da "música das esferas" pitagórica) e Brian Eno tomou sobre si a missão de oferecer esse "serviço público universal". Por muitas razões (incluindo as mais óbvias) eis a companhia sonora ideal para a leitura do diário de Eno, A Year With Swollen Appendices.

(1997)

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