08 April 2008

OS TIGRES E OS LEÕES NOS QUINTAIS



Vários - Tropicália ou Panis Et Circencis

Se Caetano Veloso gritava bem alto “nego-me a folclorizar o meu subdesenvolvimento para compensar as dificuldades técnicas”, o álbum-manifesto do Tropicalismo levava essa declaração às últimas consequências: publicado um ano depois de Sgt. Peppers (1967), não é abusivo vê-lo como o equivalente brasileiro do que, simbolicamente, o disco dos Beatles representou para a pop. O ar dos tempos que se respirava era o mesmo: se Dylan cantava “The hollow horn plays wasted words, proves to warn that he not busy being born is busy dying”, os Mutantes respondiam-lhe com “Eu quis cantar minha canção iluminada de sol, soltei os panos sobre os mastros no ar, soltei os tigres e leões nos quintais, mas as pessoas da sala de jantar são ocupadas em nascer e morrer”. Eléctrico, em cores de pop-neon e concebido como um filme, Tom Zé, Capinam, Torquato, Gal, Mutantes, Gil e Caetano respondiam “sim” ao desafio de Rogério Duprat: “Sabem vocês o risco que correm? Sabem que podem ganhar muito dinheiro com isso? Terão mesmo coragem de saber que só desenvencilhando-se das formas puras do passado, poderão encontrá-las em sua verdade mais profunda?”. (2008)

5 comments:

Anonymous said...

Na eventualidade de alguém se esquecer, deixo aqui o meu registo:
Um álbum genialíssimo, de implantação e inspiração planetária, transgresssão de todos os códigos vigentes na altura, devorando, canibalisticamente, todas as épocas percorridas desde então. Em língua portuguesa, ainda não se fez melhor (e igual só o melhor de Caetano Veloso e, talvez, Getz/Gilberto).

Anonymous said...

Rui, podes insultar-me, mas nada bate o avant-garde e experimentalismo em língua portuguesa do tema "A Titi Fez Um Tété" do álbum "És Muita Linda" dos Ena Pá 2000.

João Lisboa said...

O meu fetiche é outro. Uma linha de poesia de José Cid: "A Anita não é bonita mas acredita que a noite cai". Assombra-me os sonhos.

Anonymous said...

Pois. Esqueci-me do Cid. Esse já ultrapassa a música. É o nosso Shakespeare.

Anonymous said...

«Rui, podes insultar-me, mas nada bate o avant-garde e experimentalismo em língua portuguesa do tema "A Titi Fez Um Tété" do álbum "És Muita Linda" dos Ena Pá 2000.»

«O meu fetiche é outro. Uma linha de poesia de José Cid: "A Anita não é bonita mas acredita que a noite cai". Assombra-me os sonhos.»

Ao Manuel: Porque haveria de insultar quem tem um sentido de humor tão prodigioso?
Ao João Lisboa: Cheira-me que isto ainda vai parar a uma frase qualquer do José Luís Peixoto...