22 February 2008

IVY LEAGUE POP



Vampire Weekend - Vampire Weekend

A Ivy League é constituída por oito universidades da Costa Leste dos EUA – Brown, Columbia, Cornell, Dartmouth, Harvard, Princeton, Pennsylvania e Yale – que, em consequência do seu elevado nível de exigência académica (todas se situam no top do ranking universitário do “U.S. News & World Report”), converteram a própria expressão “Ivy League” num sinónimo de elitismo, selectividade e excelência. O Upper West Side é um bairro de Manhattan que, tendencialmente, atrai a burguesia novaiorquina afluente (o rendimento médio familiar ultrapassa largamente a média da cidade), liberal e com inclinações artísticas. Cape Cod é uma península localizada na costa do Massachusetts, estância de férias de Verão preferida de “ricos e famosos”, caso, desde há quatro gerações, da dinastia-Kennedy. Fim da lição de geografia-socio-política norte-americana e passagem de testemunho instantânea para os Vampire Weekend: Ezra Koenig (cantor e guitarrista), Chris Tomson (baterista), Chris Baio (baixista) e Rostam Batmanglij (produtor e teclista), quatro recém-graduados da “Ivy Leaguer” Columbia University – no Upper West Side –, ainda durante o tempo da faculdade, formam uma banda que, segundo eles mesmos facilmente confessam, pratica um híbrido musical que designam alternativamente como “Upper West Side Soweto”, “Cape Cod Kwassa Kwassa” ou “Campus and Oxford Comma Riddim”. Tradução: se, com os Beirut, Zach Condon se imaginou, sucessivamente, zíngaro balcânico, boémio parisiense e as duas coisas ao mesmo tempo, por que motivo não poderiam quatro moços absurdamente betos mas eruditos e de impecável gosto musical, nas suas camisas Ralph Lauren, sapatinhos de vela e polos Lacoste, inventar aquela variedade de afropop ao som do qual, numa das “short stories” de Salinger, Franny e Zooey Glass mui alegremente dançariam?



Não avancemos, porém, tão rapidamente: se, desde que o “buzz” na Internet à volta dos Vampire Weekend arrancou, não há site nem blog que não se sinta na obrigação de referir Graceland, de Paul Simon, como trampolim primordial para a música da banda (o que até é rigorosamente verdade e uma faixa como, em particular, a propriamente dita “Cape Cod Kwassa Kwassa” não engana ninguém), é preciso reparar que a paleta de cores é consideravelmente mais ampla. Eles, tal como Zach Condon se referia à música dos filmes de Kusturica e do Taraf de Haïdouks, recordam-se que tudo terá começado com a escuta de um álbum oriundo de Madagascar e acrescentam-lhe Ladysmith Black Mambazo, Kanda Bongomen, Orchestra Baobab, Beethoven, a Band, Elvis Costello e os Squeeze. Mas nós que, por estarmos de fora, ouvimos, de certeza, muito melhor do que eles, apercebemo-nos perfeitamente de que, no tubo de ensaio estético onde esta aventura sonora se gerou, outros reagentes – Talking Heads, Feelies, Orange Juice, bastante ska, highlife e pós-punk, doses homeopáticas do que de melhor conseguiram extrair dos despojos dos Police e apenas o justo q.b. de “classicismo” tal como os Arcade Fire o supõem – se encontravam em presença.



Lancem-se, pois, com inteira justificação, os foguetes: nesta impuríssima obra-prima do género “fake” (que, recuperando o formato pop ideal, não chega aos quarenta minutos de duração), por entre linhas de baixo pneumáticas, motivos de guitarra aracnídeos, violinos barrocos e sobressaltos polirrítmicos de percussão, Louis Vuitton rima com Reggaeton e Benetton, polemiza-se civilizadamente sobre correcta pronúncia e pontuação (“Who gives a fuck about an Oxford comma? I climbed to Dharamsala too, I met the highest lama, his accent sounded fine to me”), personagens que nunca respondem por nomes próprios desagradavelmente comuns como Bill ou Jack mas, sim, Blake ou Walcott melancolizam irónica e suavemente sobre as agruras da vida sentimental no “campus”, arquitectura e turismo cultural e, cereja sobre o bolo, com a elegância que seria de esperar, no refrão de “Kwassa Kwassa”, não se esquecem de exercer o imprescindível auto-sarcasmo quando cantam “But this feels so unnatural, Peter Gabriel too”. Pode não se gostar muito destes tipos? (2008)

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