28 June 2007

ROSA, ROSAE



June Tabor - Rosa Mundi

Como diria Gertrude Stein, "uma rosa é uma rosa é uma rosa". Mas tanto pode ser a rosa símbolo da devoção ao princípio feminino primordial dos trovadores medievais, como a Rosa/Flor de Vénus em Roma, emblema das prostitutas do templo — sob a qual ("sub rosa") apenas aos iniciados eram revelados os mistérios da sexualidade sagrada —, a mística e hermética Rosa-Cruz, a "Rosa do Mundo" de Eugénio de Andrade, do Yeats da Golden Dawn ou essa outra, recente e portuguesa, fabulosa colecção-labirinto de dois mil e um poemas. Ou ainda, esta, de June Tabor, espécie de percurso por entre um dicionário de alusões ao infinito de sentidos que a rosa — como a "rosácea" das catedrais, mandala matricial do mundo — pode sugerir. E dificilmente algo o poderia sugerir de modo mais requintadamente perfeito do que este desfilar de encantamentos sonoros para a cada vez mais assombrosa voz de June Tabor, o piano de Huw Warren, o violino e a viola de arco de Mark Emerson e o violoncelo de Richard Bolton. 


Partindo das "Roses Of Picardy", sublime metáfora das saudades da amada pelos soldados da Primeira Grande Guerra, e encerrando com "Maybe Then I'll Be A Rose" do fidelíssimo Les Barker, a evocação toca o delicado jogo de sedução erótica/gnóstica dos "trouvères" em "Belle Rose", a poesia de Robert Burns com "O My Luve's Like A Red Rose", a "carol" germânica "Winterrose", o extraordinário fresco alegórico de "Paint Me, Redouté" (de Les Barker, Emerson e Tabor) em torno dos jardins de rosas, em Malmaison, da imperatriz Josefina, a "explicação" da Rosa-Cruz segundo Plechtcheev e Tchaikovsky oferecida na parábola cristã "The Crown Of Roses" e diversos outros desvios pelo universo das tradições populares e eruditas onde a rosa, Shakti, as Black Madonnas e Scarlet Women, "blood and Aphrodite's tears" são personagens essenciais. Tão essenciais, pelo menos, como esta Rosa Mundi. (2001)

4 comments:

Anonymous said...

Lembro-me de ter comprado o Aleyn em 99 ou 2000, e de ter enviado músicas do álbum via net...o cd chegou a andar por lisboa....o certo é que ninguém gostou (excepto uma amiga minha que gostou muito), "essa senhora não me diz nada", e a propósito da "Wonder What's Keeping My Love Tonight": «salmão na desova...»...Eu gosto muito da June Tabor e através dela descobri a Sandy Denny. Ainda comprei outro cd dela.

Anonymous said...

Lembro-me de a ver uma vez numa coisa chamada Folk Tejo (?). Logo à segunda ou terceira canção cantou uma versão assombrosa de When I Get To The Border (uma versão do Richard Thompson, que na altura ainda não conhecia). Foi um daqueles momentos mágicos, raros (cada vez mais raros). Não me contive e aplaudi de pé. Mas devo ter sido o único. Infelizmente que eu saiba ela nunca gravou esta versão. O que eu daria para voltar a ouvi-la...

Cheers,
João Nunes

Ana Cristina Leonardo said...

«And all shall be well and / All manner of thing shall be well / When the tongues of flame are in-folded / Into the crowned knot of fire / And the fire and the rose are one»
T.S. Eliot

João Lisboa said...

Lindíssimo, Leopardo.