12 November 2014

A DAY IN THE LIFE


16 de Setembro, Canada High Comission, em Londres. Leonard Cohen está prestes a apresentar Popular Problems e umas dezenas de comuns mortais reúnem-se para escutar a divindade e, por momentos, respirar o mesmo ar. Não poderá, em rigor, dizer-se que se trata de “common people” uma vez que fazem parte dos escolhidos. Mas, quase desejando ser ainda mais anónimo do que os outros, escondido atrás das lentes de grande míope, Jarvis Cocker, silencioso e venerador, só não passa completamente despercebido porque os seus centímetros são consideráveis. Em Pulp: A Film About Life, Death And Supermarkets, acontece praticamente o mesmo: sim, o pretexto é o concerto de despedida dos Pulp pós-derradeira reunião, a 8 de Dezembro de 2012, na Sheffield natal, mas, durante esse "day in the life", os verdadeiros protagonistas são a cidade e os seus habitantes, imprevisíveis fãs, literalmente dos 7 aos 77, da banda.


Não é um acaso que o documentário de Florian Habicht comece e acabe com Jarvis entregue à espinhosa tarefa de mudar um pneu. Será encenado mas a intenção coincide com o propósito pouco comum de um filme deste género: converter a suposta matéria-prima essencial – a música e as personalidades dos elementos da banda – em pano de fundo e banda sonora para a paisagem humana da velha Steel Town devastada por Thatcher e, agora, reconfigurando-se como centro de negócios (paradisíaco ou infernal, depende do ponto de vista) e terra prometida de "call centers". Se os Talking Heads assinavam “songs about buildings and food”, esta exploração da vida, da morte e dos supermercados mostra-nos o reportório dos Pulp interpretado por pensionistas e corais de damas azul-lantejoula, equipas de futebol feminino – de que o “mister” é o baterista Nick Banks – patrocinadas pelos Pulp, grupos adolescentes de dança às voltas com "Disco 2000", senhoras idosas interrogando-se se Jarvis será filho de Joe Cocker e vendedores de jornais dickensianos proclamando a sua devoção pelo grupo. E, nesta oferta do primeiro plano à “gente vulgar”, não existe sequer uma partícula de demagogia: só quem nunca escutou com atenção as canções dos Pulp é que não reparou como o seu amor pelas massas só é superado pelo asco com que as representa.

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