20 September 2021


(sequência daqui) Filmado a preto e branco, há um ano, durante dois dias, num estúdio expeditamente montado na proximidade da modesta casa deste nos Hamptons, em Long Island (1 milhão de dólares face, por exemplo, aos 10,5 milhões da de Paul Simon), assistimos a uma conversa sem quaisquer preocupações de abordagem cronológica na qual Rick Rubin não desempenha o papel de entrevistador mas sim o de gatilho para a análise quase forense do método criativo e de utilização do estúdio de gravação por McCartney, John Lennon, George Harrison e Ringo Starr. De forma desarmante, colocado perante a questão de como faziam os Beatles para, desde o início, possuirem um instinto infalível para criar melodias memoráveis, McCartney explica que, não possuindo naquela altura qualquer forma de gravar o que criavam nem conhecendo nenhum deles a notação musical, só sobreviviam aquelas melodias de que, no dia seguinte, ainda conseguiam recordar-se. Mais à frente, acrescenta o argumento com que se esgueiravam a mais insistentes interrogações acerca dessa matéria: “Éramos de Liverpool  onde existe uma grande influência irlandesa e celta – por vezes, diz-se até que Liverpool é a capital da Irlanda. Os Celtas nunca registavam nada por escrito. Era a tradição dos bardos. Essa era a nossa desculpa. Eu e o John costumávamos dizer, ‘É a tradição bárdica!’” John Lennon é, muito naturalmente, figura omnipresente nas rememorações de Paul (“Eu tratava-o por ‘four eyes’ e ele chamava-me “pigeon-chest’ “): à superfície vêm as diferentes circunstâncias familiares de ambos – a de Paul, equilibrada e com um pai pianista em bandas de ragtime e jazz que gostava de tocar “showtunes” para a família; problemática e conflituosa a de John –, o modo como, hoje, encara o que viveram juntos (“Naquela altura, eu trabalhava com um fulano chamado John. Agora, olho para trás e dou-me conta de que trabalhei com o John Lennon!”) e como esse distanciamento reconfigura todo o resto (“Acabei por transformar-me num fã dos Beatles. Naquela altura, eu era apenas um Beatle. Mas, agora que o volume de trabalho dos Beatles está concluído, volto a ouvir os discos e interrogo-me “De onde é que saiu aquela linha de baixo?...” (segue para aqui)

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